Como seres humanos
percebemos que uma das maiores falhas e causas da infelicidade que sentimos
provem de considerarmos difícil perceber o que sempre está ao nosso redor,
negamos o que está à vista. Sofremos porque não enxergamos, vemos, mas não
enxergamos o valor do que está diante de nós e suspiramos, muitas vezes
injustamente, pelas atrações imaginarias de outro lugar, culminando numa
sensação insatisfação, vivemos na contradição.
Num desses momentos
de reflexão me perguntei, porque não buscar sentido através de um esforço na
construção de modelo diferente de pensar?, que enriqueça a compreensão da
realidade, e vejam que não é um pensamento tão novo assim, afinal Hegel já havia
se aventurado e obtido imenso sucesso nesse modo dialético de pensar, tendo
como princípio básico de compreensão do real e do conhecimento que dele temos,
que é a sua contradição de radical historicidade.
A felicidade, assim
como a infelicidade são na verdade parte de uma dialética de um processo
histórico resultante, a cada momento, de múltiplas determinações e esse
movimento de constituição, decorre de forças contraditórias que atuam no
interior dessa própria realidade.
Num exercício de raciocínio
é fácil estabelecer uma grande ligação entre o pensamento de Heráclito e Hegel,
pois tudo está em continua transformação, num total processo de mudança
incessante.
Dito por Heráclito, nosso
pensamento é como um rio: a imagem do rio nos mostra a ideia, nunca podemos nos
banhar duas vezes no mesmo rio, pois quando mergulhamos na segunda vez já não é
o mesmo rio. Para Heráclito o verdadeiro princípio da realidade é o movimento.
Lembro que os Gregos
não apreciavam muito o movimento, a mudança, a história e o tempo, e Heráclito
foi marginalizado na filosofia ocidental, por cerca de dois mil anos. E é
exatamente Hegel que vai resgata-lo nos começos do século XIX.
Georg Wilhelm
Friedrich Hegel
Hegel, vai questionar
o princípio da identidade pela lógica da dialética que admite a possibilidade
de um objeto ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, igual e diferente de si
mesmo. Surge então um novo princípio logico: o princípio da contradição.
Pensando nesta
possibilidade Hegel concebeu sua filosofia e com a ajuda de seu pensamento
entendemos que ele valoriza a história, a evolução, a transformação. Para ele o
real no seu conjunto e todas as coisas em particular e, o que é mais
importante, trata-se de uma evolução por contradição: esse é o processo
dialético. As coisas vão evoluindo, porque no seu interior elas contém sua própria
negação, cada coisa sendo, portanto, ao mesmo tempo, igual a si mesma e ao seu
contrário! Por isso, todas elas atravessadas por um conflito interno, a luta
dos contrários (felicidade x infelicidade), que os obriga a mudar passando
sempre por um momento de afirmação, por um momento de negação e por um momento,
de superação, cada um deles se posicionando em relação ao seu interior. É a
famosa concepção da tríade dialética: a tese, a antítese e a síntese.
Conforme Severino, para
Hegel, a contradição é o próprio motor do processo de evolução do real: toda
afirmação aparece no momento provisório que deve ser necessariamente negado
para ser ultrapassado. Cada estágio fenomenal, cada estado individual ou
coletivo, cada figura do real não vai permanecer idêntico a si mesmo o tempo
todo: necessariamente, pela força do conflito interno, é impelido para se
transformar no seu contrário. Mas também não fica ai muito tempo, pois é de
novo lançado rumo a sua própria negação que envolve a recuperação dos aspectos positivos
do primeiro momento e a criação de uma nova configuração.
Ainda conforme
Severino, podemos tomar como exemplo, a título de uma ilustração bem
simplificada, o caso da formação do ser humano individual. Essa formação começa
no estágio da infância: é o momento da vida infantil. A criança é um organismo
vivo que mal se desprega do mundo natural, como que prolongando sua vida
uterina, confundindo-se com o mundo que o envolve, não se distinguindo dos
objetos. Faz corpo com seu ambiente, não tem consciência da própria autonomia.
Este é o momento da tese.
Mas, na vida do ser
humano, esse estágio é logo negado pelo estagio da adolescência. É o estágio em
que o indivíduo se nega como criança, recusa a condição infantil e se
representa absolutamente autônomo quer viver como se não dependesse de ninguém.
Daí os famosos conflitos. Nega tudo que representa questionamento dessa sua autonomia,
rebela-s3e contra toda autoridade. Nega para se firmar num outro patamar. Este
é o momento da antítese.
Mas eis que chega a
idade adulta: o que é de fato amadurecer, ser adulto? É dar-se se conta de que
não se é mais nem tão dependente do outro (como vivenciava a criança) nem tão
independente em relação ao outro (como extrapolava o adolescente): o adulto é
um ser autônomo dentro de limites objetivos que condicionam todo indivíduo
humano. Este é o momento da antítese.
Esse movimento de
evolução e transformação por contradição é o processo dialético que permite assim
vencer as próprias contradições. E para Hegel este era um movimento presente
tanto no real como no pensamento. É que, como filosofo e metafísico idealista,
Hegel fundia ser e pensar numa unidade. Com efeito, entendia que a substancia
da realidade era o próprio espírito, a Razão, a ideia. Tudo o que existe é uma manifestação
da ideia que está evoluindo rumo ao espírito. Por isso, a natureza física assim
como a sociedade humana são apenas figuras de espírito. É que a totalidade do
real, num primeiro momento, é a ideia (tese); num segundo momento, é a natureza
(antítese), negação da ideia; num terceiro momento, é o espírito (síntese),
negação/retomada/superação da Ideia da Natureza.
Portanto, Hegel
inverte as posições: é o ideal que explica o real e não o contrário. Para
Hegel, não há mais distinção entre o real e o racional, entre ser e pensamento,
entre sujeitos e objeto. Ele pratica, quanto ao conteúdo de seu pensamento, uma metafísica absoluta.
BIBLIOGRAFIA:
Severino, Antônio
Joaquim; Filosofia, Série Formação Geral; Editora Cortez – 2. Ed. – São Paulo: Cortez,
2007.
Hegel, Georg Wilhelm
Friedrich, Fenomenologia do Espírito; 4. Ed. – Petrópolis, RJ:> Vozes 2007.
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