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sábado, 5 de novembro de 2011

Liberdade e Adolescência

Semana passada, propositadamente falei a respeito da questão da liberdade, abordando o paradoxo que se apresenta na responsabilidade e exercício, estamos sempre de frente a encruzilhadas que nos obrigam a fazer escolhas, e mesmo que nos abstenhamos em não fazer escolha entre um caminho ou outro, já por este ato de nada escolher já estamos fazendo uma escolha, ou seja, é inevitável.
Liberdade é sempre um tema atual, é questão que por mais falemos, não se esgota, no caminhar da sociedade o controle tende a aumentar, somos o tempo inteiro monitorados por câmeras, leis e mais leis que determinam os limites e as sanções inerentes a quebra destas leis, mas não é para este lado negro da questão que quero voltar meu olhar.
 Nestes 31 anos desde que fui pai pela primeira vez, tenho meu olhar voltado para a liberdade dos adolescentes.
Como afirma Lucia Helena Freitas Ceitilin, a adolescência (do latim adolescere = crescer), por sua vez refere-se a um período do desenvolvimento humano com duração variável, entre a infância e a idade adulta. Compreende complexos eventos psíquicos que direcionam a criança para a transformação em um adulto jovem. O inicio da adolescência é fortemente influenciado pelas manifestações da puberdade. Assim o impacto das mudanças físicas e a expansão das habilidades cognitivas desencadeiam as alterações psicológicas e sociais que são por sua vez influenciadas pelo contexto social, histórico, cultural e familiar no qual o adolescente esta inserido.
A adolescência, embora seja um processo universal, assume peculiaridades de acordo com a cultura vigente.
O texto a seguir, de autoria de Aristóteles (século IV a.C.), ilustra o caráter universal da adolescência:


Os jovens tem fortes paixões e costumam satisfazê-las de maneira indiscriminada. Dos desejos corporais, o sexual é o que mais os arrebata e no que evidenciam a falta de autocontrole. São mutáveis e volúveis em seus desejos que, enquanto duram, são violentos, mas que passam rapidamente. (...) Em seu mau-humor, com freqüência, expõem o melhor do que possuem, pois seu apreço pela honra faz com que não suportem ser menosprezados e que se indignem, se imaginam que se os trata injustamente. Mas, se bem amam a honra, amam mais ainda a vitória; pois os jovens anseiam ser superiores aos demais, e a vitória é uma das formas de superioridade. Sua vida não transcorre na recordação, mas sim na expectativa; já que a expectativa aponta ao futuro e a recordação ao passado, e os jovens tem um grande futuro a sua frente e um breve passado por trás. (...) Seu arrebatamento e sua predisposição á esperança os tornam mais corajosos que os homens de mais idade; o arrebatamento coloca os temores de lado e a esperança cria a confiança; não podemos sentir temor se ao mesmo tempo sentimos cólera, e toda expectativa de que algo bom vira nos torna confiantes. (...) Tem idéias exaltadas pois a vida ainda não os humilhou, nem lhes ensinou suas necessárias limitações; ademais, sua predisposição á esperança os faz sentirem-se equiparados as coisas magnas, e isto implica ter idéias exaltadas. Preferirão sempre participar em ações nobres a ações uteis, já que sua vida esta governada mais pelo sentido moral do que pela razão. E enquanto a razão nos leva a escolher o útil, a bondade moral nos leva a escolher o nobre. Amam a seus amigos, conhecidos e companheiros, mais que os adultos, porque gostam de passar seu dia em companhia dos outros. Todos seus erros apontam na mesma direção: cometem excessos e atuam com veemência. Amam demasiado e odeiam demasiado, e assim são com tudo. Crêem que sabem tudo e sentem-se muito seguros com isto; este é, em verdade, o motivo de que tudo façam em excesso. Se causam danos aos outros, é porque querem rebaixá-los e não causar-lhes dano real. (...) Adoram a diversão e, por conseguintes, o gracioso engenho que é a insolência bem educada. (Aristóteles, Retórica, séc. IV a.C. apud Blos, 1979)

Como se vê, existem algumas invariantes, mantidos ao longo dos séculos, que repousam na necessidade da nova geração, visando á aquisição de uma identidade própria e discriminada da geração que a antecede, a contestar o mundo adulto e suas regras. Essa atitude baseia-se em um sentimento imprescindível de auto-suficiência e grandiosidade. Se, por um lado, essa contestação gera uma situação de conflito, de outro, tem como subproduto uma renovação cultural indispensável.
O arrebatamento e a coragem na adolescência, vai aos extremos, a liberdade que é uma sensação ou estado que se encontra uma pessoa por não estar presa a vontade dos outros, na adolescência possui maior intensidade e é uma sensação de auto-suficiência.
Sabemos nós adultos que toda liberdade tem seu preço, basta que cada um saiba seu limite de maneira a não interferir na liberdade do outro, põrem para o adolescente excesso de liberdade pode complicar sua vida no futuro, pode ser um grande complicador, influenciando na sua maturidade tardia, levando a caminhos que em geral não são satisfatórios. A diferença, entre a liberdade for boa ou ruim, estará na condição do adolescente possuir consciência dos seus atos e usar a liberdade que lhe confiaram para um propósito positivo que o fará crescer e não se destruir. Sabemos que a sabedoria vem com a idade, mas até lá é necessário passar por fases na vida, que são indispensáveis para atingir a maturidade, sendo a liberdade o fim e o começo, porem com intensidades diferentes, menor no começo e maior no final da caminhada.
A medica Mônica Mulatinho faz um alerta que foi exibido no Jornal Hoje, programa da Rede Globo de Televisão, a liberdade em excesso faz tanto mal quanto ao controle excessivo, as coisas devem ser dosadas para que não se torne sufocante. Os adolescentes precisam ter certa liberdade para poder fazer as suas descobertas e abrir as portas para o mundo, mas de maneira que os pais estejam sempre por dentro de todas as suas atitudes para evitar que a liberdade possa se transformar em uma armadilha, pois é nessa idade em que a sua inteligência emocional esta sofrendo transformações. A psicoterapeuta Lídia Arantangy afirma que todos nós temos que ter limites ao longo da nossa vida, sendo que na adolescência essa  questão é muito critica pois é nessa faze que o poder que os pais tem sobre os filhos diminui  de maneira que eles passam a desrespeitar os pais, principalmente as suas ordens, parece que o poder da educação não existe. É preciso que os pais tenham muita paciência para poder lidar com essa situação sem perder o controle.


A adolescência é o período da vida em que ocorrem as transformações mais aparentes no corpo, em razão das alterações hormonais.
Inicia-se por volta dos dez ou onze anos de idade, tendo as meninas o acontecimento da primeira menstruação ou menarca, o aumento dos pelos vaginais e o crescimento dos seios.
Nos meninos acontece a alteração da tonalidade da voz, o aumento dos pelos pubianos e o crescimento do pênis, que passa a ter ereção e ejaculação.
Segundo D’Andrea, a adolescência é dividida em três fases:
- a pré-puberdade, quando o desenvolvimento físico se acelera e busca maior proximidade com os adultos. O lado emocional é muito confuso, com oscilações de sentimentos como ódio e amor, na busca de identificar-se;
- a puberdade, que se inicia por volta dos treze anos, é marcada pela maturidade dos órgãos reprodutores;
- e a pós-puberdade, entre os quinze e vinte anos, fase em que deve demonstrar responsabilidade diante das cobranças do meio social, como a escolha profissional, estruturar as relações com o sexo oposto e a formação da identidade, necessitando cada vez menos da ajuda intelectual dos adultos.
Como afirma Jussara Barros, normalmente os adolescentes buscam grupos de amigos que tenham os mesmos interesses, os mesmos gostos e desejos, a fim de uma identificação menos conflitante e mais amigável.
Nessa etapa da vida é comum tentar se afastar da família, pois essa já não lhes satisfaz em relação aos interesses sociais.
Os pais, não aceitando a busca da liberdade, muitas vezes tomam atitudes autoritárias, que os afastam ainda mais do grupo familiar. Outra atitude errada, normalmente tomada pelas mães, é o fato de não aceitar o crescimento do filho, achando que ainda é criança e tratando-o como tal. Essa atitude também o leva a afastar-se, pois nessa idade já não quer mais ser considerado criança.
Numa fase de tantas transformações, é importante que haja amizade e muito diálogo no convívio familiar e que os pais tentem amenizar os conflitos vividos, sendo mais flexíveis e compreensivos.
Para orientar um adolescente existem dois caminhos: o da educação e o da proibição. O da proibição sempre é mais tentador por parecer mais simples, porém o da educação é sempre mais correto e eficaz. Apesar da grande maioria dos pais optarem pela forma mais simples, a educação é a forma mais adequada de orientação e criação. Já está mais que comprovado que os adolescentes têm a tendência a fazer tudo o que é proibido baseando-se na já famosa frase “tudo que é proibido é mais gostoso.”
Estabelecer limites para a ação do jovem é algo assim como dizer: “você é livre e deve administrar a sua liberdade”. A grande conquista dos jovens deste século é saber administrar a própria liberdade, conhecendo os seus limites”. Este ponto de vista pressupõe uma correção de rota em relação ao grito que se ouvia em 68: “é proibido proibir”. Os jovens que na época repetiam o slogan são hoje os pais que dizem aos seus filhos: “é preciso que vocês saibam que há limites”.
A educação, para Aristóteles, não está em fixar limites, mas em ensinar e viver de acordo com a virtude. Essa perspectiva aplica-se a todos, porém especialmente aos jovens, como manifesta este filósofo no último capítulo de uma de suas obras sobre Ética: “é difícil, quando se é jovem, encontrar a direção reta para a virtude a não ser pela educação, porque a vida moderada e dura não é agradável ao vulgo, e principalmente aos jovens”.
De todas as reflexões e estudos sobre infância e adolescência, se alguma coisa pode ser mais ou menos consensual é que, crescentemente, as crianças estão mais sozinhas ou mais na convivência com seus pares da rua do que no seio de suas famílias. O pai, a mãe, ou qualquer outra figura de ligação familiar está se tornando rarefeita. 
Embora dentro de sua casa, mas distante do convívio doméstico e familiar, o adolescente ou a criança está solitariamente assistindo à tevê, na internet ou está fora de casa, em bandos perambulando pelas ruas, nos shoppings, nos lugares de lazer.
Por outro lado, parece razoável atenuar o peso atribuído à hegemonia da televisão, tendo em mente a redução das oportunidades de convivência e brincadeiras ao ar livre. Isso porque os espaços livres das ruas, antes utilizados pelas crianças e adolescentes para brincadeiras, já não estão mais disponíveis, estão intensamente habitados por carros, prédios, marginais, ladrões. A rua perdeu seu lugar de expressão coletiva dos jogos e das brincadeiras.
Há muitas tentativas de se definir adolescência, embora nem todas as sociedades possuam este conceito. Cada cultura possui um conceito de adolescência, baseando-se sempre nas diferentes idades para definir este período. No Brasil o Estatuto da Criança e do Adolescente define esta fase como característica dos 13 aos 18 anos de idade.
Crianças e adolescentes já não são mais os mesmos. Eles participam avidamente do mundo dos adultos e se transformam nos novos convidados da realidade orgástica do consumo e dos prazeres. 



As crianças, tendo nascido no seio de uma família e considerados como "pertencendo" a esta família, encontram-se, paradoxalmente, cada vez mais solitários e à mercê de seus pares da rua, da escola e do apelo cultural para que se tornem, rapidamente, adultos esbeltos, ricos, formosos, na moda e plenamente sexualizados.
A liberdade é no século XXI, reflexo desta intensa evolução, a cultura do individualismo, a redução do convívio doméstico, a educação que era natural obtida no convívio, com ensinamentos dos limites e respeito ao semelhante estão se deteriorando, sendo em sua maioria delegados aos professores e as escolas responsabilizadas pela educação comportamental, sem a respectiva outorga de poderes para este fim.



Bibliografia:
BASSOLS, A. M. S.; KAPCZINSKI, F.; EIZIRIK, C. L. O ciclo da vida humana: uma perspectiva psicodinâmica. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.

CARVALHO, A. M. A.; KOLLER, S. H.; LORDELO, E. R. (Org.). Infância brasileira e contextos de desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002.

KURY, M.G. Dicionário de mitologia grega e romana. 3.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. p. 130.