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segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Reflexões sobre a obra “Senhor das Moscas” de William Golding

A obra “Senhor das Moscas” é voltada para o gênero infanto-juvenil, foi vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 1983, a trama enfoca um grupo de meninos britânicos que ficam presos em uma ilha desabitada. Em meio a evacuação em tempo de guerra o avião britânico cai na ilha desabitada e apenas um grupo de meninos sobrevive, ao longo da estória é narrada a tentativa desastrosa de se autogovernar, pois a luta pela liderança divide a frágil sociedade "democrática" e instaura um violento conflito entre os meninos.

A estória mostra jovens concentrados em detalhes domésticos da sobrevivência, tal como fazer comida, construir abrigos, indumentária, higiene e etc., os meninos parecem ser bons moços, representantes de crianças bem-comportadas e educadas nos padrões britânicos de colonizadores.

O título da obra parece ser um tanto estranho e à prima facie não parece se relacionar com a história, porém, o título “Senhor das Moscas” é a tradução literal da palavra hebraica Ba'alzebul, ou em português, Belzebu, que, conforme o Dicionário Aurélio, significa o nome de um dos demônios, o chefe dos espíritos malignos, o que mostra a visão pessimista do autor em relação à humanidade, e que atravessa toda sua obra. O título está ligado a ideia de Belzebu/Leviatã o demônio associado ao orgulho e à guerra, os dois assuntos centrais da trama. Além disso, o clássico é uma sátira à narrativa problemática de que os conhecimentos dos europeus eram superiores a quaisquer outros. Golding através da história aborda isso na obra transformando os garotos em nativos selvagens que destroem uns aos outros em busca de poder, funciona como uma metáfora ao relacionamento humano. A luta dos meninos é a luta pelo poder tal como acontece no mundo dos adultos, onde forças tentam estabelecer seu domínio custe o custar, marcados por oposição, conflito e disputa, nesta disputa pelo poder e as discordâncias referentes à sobrevivência dão lugar à violência e a selvageria.

 


A obra pode ser interpretada sob várias perspectivas, tal como uma analogia da luta entre a democracia, na qual todos podem expressar suas ideias, mas que, por outro lado, tantas vozes culminam em decisões arrastadas e controversas, e a ditadura, na qual um tirano se estabelece sem o consentimento dos governados formado a partir de um sistema hierárquico baseado na punição e no medo. Percebe-se que a obra vai além do gênero infanto-juvenil, agradando aos demais gêneros proporcionando uma produtiva reflexão sobre a liderança democrática e autoritária, motivando reflexões em algumas áreas das ciências humanas, especialmente filosofia, direito e psicanálise, voltadas à discussão sobre a maldade e desumanidade.

Não foi por acaso que Golding desenvolveu a trama, a história de vida de William Golding e o que o levou a escrever esse clássico, foram os responsáveis pela construção da obra na forma de protesto. Golding dava aulas de filosofia em uma escola particular para garotos, em seguida serviu a bordo de um destróier britânico durante a guerra e se tornou um tenente da Marinha Real. Quando ele voltou da guerra, encontrou duas maiores potências do mundo ameaçando uma a outra com bombas nucleares. Isso fez com que o professor começasse a questionar as origens da natureza humana. Essas constantes reflexões sobre a violência (talvez) inevitável do ser humano o levaram e escrever o tão famoso “Senhor das Moscas”.

Enredo

No meio de uma evacuação em tempo de guerra, um avião britânico bate em uma ilha isolada ou próxima a ela em uma região remota do Oceano Pacífico. Os únicos sobreviventes são meninos na pré-adolescência. Dois meninos - o loiro Ralph e um garoto com excesso de peso e óculos, apelidado de "Piggy" - encontram uma concha, que Ralph usa como apito para reunir todos os sobreviventes em uma área. Ralph parece responsável por reunir todos os sobreviventes, então imediatamente comanda alguma autoridade sobre os outros garotos e é rapidamente eleito seu "chefe". Ele não recebe os votos dos membros de um grupo de meninos, liderado pelo ruivo Jack Merridew, mas permite que eles formem uma turma separada de caçadores. Ralph estabelece três políticas principais: divertir-se, sobreviver e manter constantemente um sinal de fumaça que poderia alertar os navios que passavam sobre sua presença na ilha e, assim, resgatá-los. Os meninos estabelecem uma forma de democracia, declarando que quem quer que tiver segurar a concha também poderá falar nas reuniões formais e receber o silêncio atento do grupo. Jack organiza uma equipe de caça responsável por descobrir uma fonte de alimento. Ralph, Jack e um garoto quieto e sonhador chamado Simon logo formam um triunvirato de líderes, com Ralph como a autoridade suprema. Após a inspeção da ilha, os três determinam que ela possui frutas e porcos selvagens como alimento.

A aparência de ordem deteriora-se rapidamente à medida que a maioria dos meninos fica ociosa; eles ajudam pouco na construção de abrigos, passam o tempo se divertindo e começam a desenvolver paranoias sobre a ilha, sendo a principal delas a que se refere a um suposto monstro que eles chamam de "besta", que todos lentamente começam a acreditar que existe na ilha. Ralph insiste que não existe tal fera, mas Jack, que iniciou uma luta pelo poder com Ralph, ganha um nível de controle sobre o grupo ao prometer ousadamente matar a criatura. A certa altura, Jack convoca todos os seus caçadores para caçar um porco selvagem, afastando os designados de manter o sinal de fogo. Um navio passa perto da ilha, mas sem o sinal de fumaça dos meninos para alertar sua tripulação, ele continua sua viagem. Ralph, com raiva, confronta Jack sobre sua falha em manter o sinal aceso.

Uma noite, uma batalha aérea ocorre perto da ilha enquanto os meninos dormem, durante os quais um piloto de caça ejeta de seu avião e morre na descida. Seu corpo desce para a ilha em seu paraquedas; ambos se enroscam em uma árvore perto do topo da montanha. Mais tarde, enquanto Jack continua planejando contra Ralph, os gêmeos Sam e Eric, agora encarregados da manutenção do sinal de fogo, veem o cadáver do piloto de caça e seu paraquedas no escuro. Confundindo o cadáver com a besta, eles correm para o aglomerado de abrigos que Ralph e Simon ergueram, para avisar os outros. Esse encontro inesperado novamente levanta tensões entre Jack e Ralph. Pouco tempo depois, Jack decide liderar uma festa para o outro lado da ilha, onde uma montanha de pedras, mais tarde chamada Castle Rock, forma um lugar onde ele afirma que o animal reside. Apenas Ralph e um garoto silencioso e suspeito, Roger, o mais próximo defensor de Jack, concordam em ir; Ralph se vira um pouco antes dos outros dois garotos, mas eventualmente os três veem o corpo do piloto, cuja cabeça se eleva pelo vento. Eles então fogem, agora acreditando que o monstro é real. Quando eles chegam aos abrigos, Jack convoca uma assembleia e tenta virar os outros contra Ralph, pedindo que removam Ralph de sua posição de poder. Não recebendo apoio, Jack sai sozinho para formar sua própria tribo. Roger imediatamente foge para se juntar a Jack, e lentamente um número crescente de meninos mais velhos abandonam Ralph para se juntar à tribo de Jack. A tribo de Jack continua a atrair recrutas do grupo principal, prometendo festas de porco cozido. Os membros começam a pintar o rosto e encenar rituais bizarros, incluindo sacrifícios à besta. Uma noite, Ralph e Piggy decidem ir a uma das festas de Jack.

Simon, que desmaia com frequência e provavelmente é epilético, tem um esconderijo secreto onde fica sozinho. Um dia, enquanto ele está lá, Jack e seus seguidores erguem uma oferenda para a besta: uma cabeça de porco, montada em uma vara afiada e rodeada de moscas. Simon conduz um diálogo imaginário com a cabeça, que ele chama de "Senhor das Moscas". A cabeça zomba da noção de Simon de que ela é uma entidade real, "algo que você poderia caçar e matar", e revela a verdade: eles, os meninos, são a besta; está dentro de todos eles. O Senhor das Moscas também adverte Simon que ele está em perigo, porque representa a alma do homem e prevê que os outros o matarão. Simon sobe a montanha sozinho e descobre que a "besta" é o paraquedista morto. Ele corre para contar aos outros garotos, que estão envolvidos em uma dança ritual. Os meninos frenéticos confundem Simon com a besta, o atacam e o espancam até a morte. Tanto Ralph quanto Piggy participam da confusão e ficam profundamente perturbados por suas ações depois de voltarem de Castle Rock.

Jack e sua tribo rebelde decidem que o verdadeiro símbolo do poder na ilha não é a concha, mas os óculos de Piggy - o único meio que os meninos têm para criar fogo. Eles invadem o acampamento de Ralph, confiscam os óculos e retornam à Castle Rock. Ralph, agora abandonado pela maioria de seus apoiadores, viaja para Castle Rock para enfrentar Jack e proteger os óculos. Tomando a concha e acompanhado apenas por Piggy, Sam e Eric, Ralph encontra a tribo e exige que eles devolvam o objeto valioso. Confirmando sua total rejeição à autoridade de Ralph, a tribo captura e prende os gêmeos sob o comando de Jack. Ralph e Jack se envolvem em uma luta. Qualquer senso de ordem ou segurança é permanentemente corroído quando Roger, agora sádico, deliberadamente deixa joga uma pedra que mata Piggy e quebra a concha. Ralph consegue escapar, mas Sam e Eric são torturados por Roger até que concordem em se juntar à tribo de Jack.

Ralph secretamente confronta Sam e Eric, que avisam que Jack e Roger o odeiam e que Roger afiou um graveto nos dois extremos, o que implica que a tribo pretende caçá-lo como um porco e decapitá-lo. Na manhã seguinte, Jack ordena que sua tribo comece uma caçada por Ralph. Os selvagens de Jack ateiam fogo na floresta, enquanto Ralph avalia desesperadamente suas opções de sobrevivência. Após uma longa perseguição, a maior parte da ilha é consumida pelas chamas. Com os caçadores logo atrás dele, Ralph tropeça e cai. Ele olha para um adulto uniformizado - um oficial da Marinha Real Britânica cujo grupo desembarcou de um cruzador que veio investigar o incêndio. Ralph começa a chorar pela morte de Piggy e pelo "fim da inocência". Jack e os outros meninos, imundos e desleixados, também voltam à sua verdadeira idade e começam a chorar. O oficial expressa sua decepção ao ver meninos britânicos exibindo um comportamento feroz e bélico antes de se virar para encarar desajeitadamente seu próprio navio de guerra.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Senhor_das_Moscas

Li este livro fazem três anos, lembrei dele ao ver repetidamente nos noticiários da selvageria, corrupção e maldade, apreensões de quantidades gigantescas de drogas e o envolvimento cada vez mais cedo de jovens no mundo do tráfico e consumo de drogas, é chocante como a juventude vem concebendo o momento ímpar de sua existência, muitos estão mergulhando profundamente no mundo obscuro e sombrio do mal que assola a humanidade, a entrada neste submundo acaba roubando-lhes o brilho da juventude e a chance de futuro.

Sabemos através das pesquisas que o motivo citado pelos jovens para justificar a entrada no tráfico e de todo o mal contido neste submundo é principalmente a questão financeira, a dificuldade em conseguir empregos, e aqueles que conseguem emprego encontram condições precárias de trabalho, tornando no entendimento destes jovens a opção pela atividade ilícita mais atraente. Muitos também vão em busca por adrenalina e aceitação deles como “alguém” num grupo, muitas vezes através da ligação com amigos, no entanto, sentindo-se fora do contexto em que foram criados, os seus modos e educação vão se esvaindo e os jovens vão revelando seus impulsos mais viscerais, acabam refugiando-se num mundo à parte, tal como uma ilha onde eles têm suas leis e suas regras, são convidados a ocupar os espaços vazios deixados ou abandonados pela sociedade, na desordem do estado os donos da Nova Ordem orquestram os acontecimentos e a desordem é ordenada, os jovens são os soldados que lutam nestes espaços.

Perguntamo-nos se o problema do tráfico de drogas seria especificamente culpa e falha das instituições e da legislação deficiente, ou se a relação família, escola e o mundo do trabalho não estariam integrados suficientemente para conduzir os jovens ao rumo certo. Penso que todos estes fatores formam um processo, nestas falhas estaríamos deixando margem para grupos de traficantes aproveitarem-se dos jovens que tornam-se presa fácil dos comandos de traficantes experientes, ordenam aos seus “head Hunters” mirarem nos jovens como possibilidade de exploração protegidos pela legislação.

As leis, os regramentos e o consenso não estão sendo suficientes para conter o âmago da natureza humana, os representantes da lei trabalham arduamente no combate ao tráfico, mas a luta é desigual, pois lutam contra as consequências, a origem não é combatida, eles prendem, a justiça liberta graças a legislação incompetente de nossos legisladores, o ciclo vicioso se repete diariamente, alimentado pela ideia de que o crime compensa.

Ao final perguntamo-nos o que é o “senhor das moscas”?, aqueles que lerem o livro poderão entender que a resposta está na metáfora, a metáfora vai além de uma contraposição dogmática entre civilização democrática e a barbárie, porque nos dá a possibilidade de conhecer os dilemas da fragilidade humana. O subterrâneo bárbaro eternamente presente na civilização também está em cada um de nós, pronto para nos destruir e consumir, ele não vem de fora, não é tão estranho quanto desejam os apologistas ingênuos da civilização. A narrativa de ficção de Golding nos apresenta, de modo simbólico, uma verdade atual: os dilemas de nossa revolta, nosso duelo contemporâneo entre dois titãs: um deus mortal, o Leviatã, e outro deus imortal, o coletivo Behemot (Figura da escatologia judaica de origem babilônica, na qual designava dois monstros terríveis. Behemoth reina sobre a terra e Leviatã, sobre os mares). O Senhor das Moscas - que a tudo vê é a lei da Nova Ordem. Mesmo extinguindo-se em sua forma física, sua presença permanece sendo sentida – assim como os seus efeitos. O Senhor das Moscas é a Lei da Nova Ordem! Lutar contra este mal deve ir além da fé de mãos levantadas, vamos abrir os olhos, e atuarmos ficando atentos ao rumo dos jovens, toda atenção a eles para os apoiarmos a dizer não para o que parece ser fácil e glamoroso do portar uma arma e um boné de grife!

 

Filme: Além do livro a trama também se tornou conhecida indo em duas oportunidades para as telas do cinema: em 1963, sob a direção de Peter Brook, e em 1990, de Harry Hook.

Filme disponível no link:

https://www.youtube.com/watch?v=9Br9RAXvioU

 

Fontes:

Golding, William. Senhor das Moscas – tradução Sergio Flaksman. 1ª.ed. – Rio de Janeiro: Objetiva, 2014.224p.

http://www.salacriminal.com/home/o-senhor-das-moscas-a-lei

https://tmjuntos.com.br/comunicacao/reflexoes-sobre-a-natureza-humana-em-o-senhor-das-moscas/

https://amenteemaravilhosa.com.br/senhor-das-moscas/

 

 

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