Os sete estudos de caso:
· "O caso de pintor daltônico" discute as realizações de um pintor que sofre um acidente de carro e é acometido por uma Acromatopsia cerebral, a incapacidade de perceber cores devido a algum acidente. No dia seguinte ao acidente, ao ir trabalhar em seu ateliê, antes repleto de pinturas coloridas e luminosas, depara-se com um mundo feito de cinza, branco e preto. As coisas passam a ter uma aparência desagradável, "suja". As pessoas viraram "estátuas cinzentas animadas" e o pintor passa a não suportar sua própria aparência no espelho. Até os alimentos que ele ingeria "pareciam-lhe repulsivos devido a seu aspecto cinzento, morto, e ele tinha que fechar os olhos para comer". Para o pintor, o mundo passou a ser algo parecido com um filme em preto-e-branco, tridimensional, com a diferença que os filmes são representações do mundo, enquanto a vida dele era real. O pintor voltou a pintar inspirado pela visão de um nascer do sol (em preto e branco). "O sol nasceu como uma bomba, como uma enorme explosão nuclear", ele contou à Sacks. Suas pinturas continuaram existindo, mas todas passaram a ser em preto-e-branco. "Senti que se não pudesse continuar pintando, também não ia querer continuar vivendo", ele desabafou com seu médico. Pg. 18
· "O último hippie" descreve o caso de um homem que sofre de um grande tumor cerebral, e por causa desta, amnésia anterógrada, que impossibilita o paciente de se lembrar de qualquer fato acontecido após a década de 60. Este estudo de caso foi inspiração para o filme “A música nunca parou”
Trecho pg.63: “Não obstante, se Greg, agora incapaz de transformar suas percepções ou memórias imediatas em permanentes, permanecia paralisado nos anos 60, quando sua capacidade de aprender novas informações entrou em colapso, ele se ajustou de alguma forma e absorveu parte do que estava a sua volta, ainda que muito devagar e de maneira incompleta”
· "Uma vida de cirurgião" conta a interação de Sacks com o cirurgião e piloto amador Dr. Carl Bennett, que possui Síndrome de Tourette. Os tiques podem se manifestar em qualquer parte ou conjunto de partes do corpo (barriga, nádegas, pernas, braços etc.), mas, tipicamente, ocorrem no rosto e na cabeça -- no rosto, como caretas repetidas, e na cabeça como um todo, como movimentos bruscos, repetidos, de lado a lado, e se conhece pelos estranhos grunhidos, crispações, caretas, gestos, e xingamentos involuntários emitidos pelas pessoas que dela sofrem. Dr. Bennett, é morador da cidade estadunidense de Branford, ele é muito querido por seus clientes e respeitado pelos seus colegas de profissão, no pronto-socorro e no hospital local. Bennett, além de operar com perfeição, sem nunca ter cometido um equívoco, dirige carro e pilota um pequeno avião particular. Sua "esquisitisse" lhe conferiu uma identidade e personalidade muito particulares, capazes de se manifestarem absolutamente convencionais durante as atividades profissionais. Os gestos bruscos, os tiques convulsivos, a mímica involuntária, as expressões compulsivas de xingamentos são inteiramente controladas na sala de cirurgia, por exemplo, manifestando-se livremente nos momentos de descontração.
Trecho pg.90: “Bennett às vezes chama a síndrome de Tourette de “uma doença de desinibição”. Diz que há pensamentos, nada excepcionais em si mesmos, que todo mundo pode ter incidentalmente, mas que são normalmente inibidos. No caso dele, esses pensamentos persistem obsessivamente no fundo de sua cabeça e eclodem de repente, sem seu consentimento ou intenção. Assim, por exemplo, ele pode querer sair, ficar ao sol e se bronzear, quando o tempo está bom. Esse pensamento fica no fundo de sua cabeça enquanto atende seus pacientes no hospital, e acaba emergindo numa declaração súbita e involuntária”.
· "Ver e não ver" é a história de Shirl Jennings, um homem cego desde a infância, graças à luta de sua noiva para conseguir que lhe fizessem uma cirurgia a moça conseguiu o impossível, conseguiu que aos 50 anos de idade lhe proporcionasse o dom da visão, ele foi capaz de recuperar a visão após uma cirurgia.
Sua história permite uma profunda reflexão sobre a diferença entre "enxergar" e o "ver". Quando Virgil abriu os olhos, depois de ter sido cego por tantos anos, não havia memória visual em que apoiar sua percepção e nem mundo algum de experiência e sentido esperando-o. Ele viu, mas o que viu não tinha coerência, seu cérebro não conseguia lhe dar sentido. "Nós que nascemos com a visão", diz o autor, "jamais poderemos imaginar tal confusão". Sacks caminha por toda a trajetória de sofrimento de Virgil na experiência de ver e não ver e nas frustrações de sua mulher Amy e conclui: "viu-se entre dois mundos, exilado em ambos — um tormento ao qual não parecia ser possível escapar. Mas aí veio a libertação, na forma de uma segunda e derradeira cegueira — uma cegueira que ele recebeu como dádiva. Assim como outras pessoas acometidas por essa raridade, Sacks descreve a experiência do paciente como sendo "profundamente perturbadora".
Trecho pg. 119: “Quando abrimos nossos olhos todas as manhãs, damos de cara com um mundo que passamos a vida aprendendo a ver. O mundo não nos é dado: construímos nosso mundo através da experiência, classificação, memória e reconhecimento incessantes”
· "A paisagem dos seus sonhos" discute a interação entre Sacks e Franco Magnani, um homem obcecado pela sua vila natal Pontito na Tuscania, onde ele morou até os doze anos. Apesar de não ter visto a comunidade por muito tempo, Franco era capaz de relatar detalhes mínimos e precisos de Pontito (Pontito é administrativamente uma frazione da comuna de Pescia, na província de Pistoia, Toscana). Franco é denominado o "Artista da Memória", Franco tem uma capacidade obsessiva, fotográfica e infinita de retratar sua cidade (apenas ela), sob todos os ângulos, de forma recordatória e imaginativa. Conforme dito por Sacks, este artista eidético, é ao mesmo tempo vítima e possuidor de um repertório de imagens, cujo poder é difícil conceber. Ele não está livre para ter equívocos de memória e nem para deixar de lembrar. Trata-se de uma memória patológica, com um poder de fixação, de fossilização ou de petrificação em plena atividade, marcada, porém por uma responsabilidade cultural de recordar o passado e preservar seu sentido.
Trecho pg.163: “O estado de espírito que se anunciara em sonhos durante a noite se aprofundou e intensificou na mente de Franco. Começou a ter “visões” de Pontito durante o dia – visões emocionalmente avassaladoras, mas com uma qualidade minuciosa e tridimensional que ele compara a holografia”
· "Prodígios" descreve a relação de Sacks com Stephen Wiltshire, um autista savântico, nascido em Londres, descrito como "a melhor criança artista do Reino Unido". É um garoto com prodigiosa capacidade de desenhar paisagens, ruas, edifícios, igrejas, castelos etc. Falando dos idiots savants o autor menciona que não se trata apenas de um sábio, mas de um prodígio. Depois de diagnosticado seu autismo, teve a felicidade de encontrar a compreensão de um professor e vários incentivadores que souberam valorizar mais seu talento que suas deficiências. E assim conseguiu se projetar, ter suas obras premiadas, suas capacidades estimuladas e ser hoje reconhecido como gênio. Desenvolveu também profundas habilidades musicais. Depois de acompanhar os passos, as reações, as vivências do talento no paradoxo das deficiências de Stephen, Oliver concluiu: "suas limitações, paradoxalmente podem servir como forças também. Sua visão é valiosa, ao que me parece, precisamente por transmitir um ponto de vista maravilhosamente direto e não conceitualizado do mundo. Stephen pode ser limitado, esquisito, idiossincrático, autista; mas lhe foi permitido alcançar o que poucos de nós conseguimos, uma significante representação e investigação do mundo" (pg.245). Precisamos pensar que a inclusão social não é apenas colocar alguém especial junto aos demais alunos ditos “normais”, há uma necessidade do professor ter conhecimento e treinamento adequados para fazer a diferença na vida deste ser humano, e principalmente ter a sensibilidade de encontrar a abertura de como ingressar neste universos tão peculiar!
Trecho Pg.243: “Ele constrói o universo de uma maneira diferente – e seu modo de cognição, sua identidade e seus dons artísticos se combinam.
· O último conto do livro é “Um antropólogo em Marte”, é sobre uma autista, Ph.D. em ciência animal, professora da Colorado State University. Apesar das adversidades, ela tornou-se uma importante autoridade mundial em sua área de atuação profissional. Curiosamente, a linguagem técnica era muito mais acessível a essa pesquisadora do que a linguagem social, o que permitiu que ela se adaptasse à vida fazendo ciência. A ciência a medicou, ao mesmo tempo em que se tornou seu refúgio. Durante toda sua vida, ela dizia-se se sentir como um "antropólogo em Marte". Provavelmente, essa deve ser uma sensação compartilhada por muitas outras pessoas com distúrbios neurológicos.
Trecho Pg.260: “Tinha dificuldade em manter sua própria vida simples, ela disse, e de deixar tudo bastante claro e explicito. Construíra uma extensa biblioteca de experiências ao longo dos anos, ela prosseguia. Era como uma biblioteca de fitas de vídeo, que ela podia passar em sua cabeça e consultar a qualquer hora – “vídeos” de como as pessoas se comportavam em diferentes circunstâncias”
Este livro foi fonte de inspiração para um filme de muita sensibilidade, quem ler o livro e assistir ao filme com certeza ao final não será mais o mesmo, em tempo de confinamento podemos aproveitar nosso tempo para sairmos do noticiário que em geral só nos trazem cenas de violência, morte e corrupção, vamos partir para algo que nos faça reanimar e iluminar nosso espírito, vamos criar no presente uma linha de pensamento que irá guiar nosso melhor comportamento, é através da reflexão e do questionamento sobre o modo como entendemos as coisas e o valor que damos a isto que farão a diferença no hoje e no amanhã.
"Um Antropólogo em Marte" é aclamado por muitos leitores e críticos por sua capacidade de proporcionar insights profundos sobre a natureza da mente humana e a diversidade de experiências neurológicas. Ele aborda questões fundamentais sobre a identidade, a empatia e a percepção da realidade.
Como se trata de uma obra literária, a recepção do livro pode variar de pessoa para pessoa. Alguns podem encontrar as histórias cativantes e comoventes, enquanto outros podem não se envolver tanto com o estilo de escrita ou o conteúdo. A melhor maneira de formar uma opinião sobre o livro é lê-lo e avaliar como ele ressoa com você pessoalmente.
Filme:
O longa “A música nunca parou” de Jim Kohlberg foi baseado no estudo de caso de Sacks “O último Hippie”, estrelado por Julia Ormond, J.K. Simmons e Lou Taylor Pucci. Em cena, um pai, Henry Sawyer (J.K. Simmons), que luta para se conectar com o filho Gabriel (Lou Taylor Pucci), que descobre um tumor no cérebro que o impede de produzir novas memórias. Os dois tentam superar uma distância emocional e acabam encontrando uma forma de se relacionarem por meio da música.
Não por acaso a trilha sonora do longa é recheada de pérolas: Bing Crosby, Peggy Lee, Johann Sebastian Bach, Beatles, The Grateful Dead, Bob Dylan, Cyndi Lauper, The Rolling Stones e Buffalo Springfield.
Engenheiro (durão) de classe média,
Henry não se dava bem com o filho Gabriel, um jovem hippie como qualquer outro
do fim dos anos 1960. Os dois vivem discutindo até que o rapaz sai de casa. Nos
anos 1980, a família volta a se reunir enquanto o jovem (já adulto) se recupera
da cirurgia para retirada de um tumor no cérebro.
O problema é que Gabriel não se lembra de nada do que ocorreu depois de
Woodstock. Imbuído do desejo de finalmente se aproximar do filho, o pai troca
seus discos pelos da banda predileta de filho, Grateful Dead. O resultado é
surpreendente. A música pode tanto ajudar o rapaz como reaproximar a família.
Assista ao trailer do filme: https://www.youtube.com/watch?v=18PVNfNnKzI
Fontes:
Sacks, Oliver. Um antropólogo em Marte: sete histórias paradoxais: tradução Bernanrdo Carvalho. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
https://www.comciencia.br/dossies-1-72/resenhas/epilepsia/sacks.htm
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81231996000100157
https://pt.wikipedia.org/wiki/Um_Antrop%C3%B3logo_em_Marte
https://www.eurooscar.com/artig/cerebro5.htm
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