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segunda-feira, 29 de março de 2021

Março de 2021 um mês de muitas despedidas, tudo está por um fio

 


Este mês de março está sendo muito difícil para todos nós, este está sendo o mês mais mortal desde o início da pandemia, ao longo deste último ano tomamos conhecimento do desencarne de muitos amigos, pessoas amadas, conhecidos e desconhecidos, e muitas outras pessoas que ainda estão neste mundo vivendo por um fio, num quarto de hospital, na fila de espera por uma vaga na UTI, a angustia é gigantesca, tanto para as vítimas pelo contagio quanto para seus familiares vivendo a sensação de dor, desamparo e impotência.

A sensação de estarmos por um fio é a sensação vivida diante do risco e receio de adoecer e morrer sem sequer obter assistência médica, hospitalar e também podermos ao final de nossa caminhada nos despedirmos daqueles que vão e que ficam.

Estamos vivendo momentos em que não há mais como manter a morte longe das fronteiras de nossa curta existência e não há como escaparmos deste fato inexorável que é parte de todos os seres vivos. Lembro de uma frase de Manuel Bandeira, poeta pernambucano do século XIX que costumava se referir a morte perguntando que é essa “indesejável das gentes? ”, é como o poeta se referia a morte, ele desde cedo havia experimentado a presença próxima da morte em sua vida, doente, tuberculoso, teve de deixar o pais para se tratar na Suíça.

Poema de Manuel Bandeira

 O HOMEM E A MORTE

O homem já estava deitado

Dentro da noite sem cor.

Ia adormecendo, e nisto

À porta um golpe soou.

Não era pancada forte.

Contudo, ele se assustou,

Pois nela uma qualquer coisa

De pressago adivinhou.

Levantou-se e junto à porta

– Quem bate? Ele perguntou.

– Sou eu, alguém lhe responde.

– Eu quem? Torna. – A Morte sou.

Um vulto que bem sabia

Pela mente lhe passou:

Esqueleto armado de foice

Que a mãe lhe um dia levou.

Guardou-se de abrir a porta,

Antes ao leito voltou,

E nele os membros gelados

Cobriu, hirto de pavor.

Mas a porta, manso, manso,

Se foi abrindo e deixou

Ver – uma mulher ou anjo?

Figura toda banhada

De suave luz interior.

A luz de quem nesta vida

Tudo viu, tudo perdoou.

Olhar inefável como

De quem ao peito o criou.

Sorriso igual ao da amada

Que amara com mais amor.

– Tu és a Morte? Pergunta.

E o Anjo torna: – A Morte sou!

Venho trazer-te descanso

Do viver que te humilhou.

-Imaginava-te feia,

Pensava em ti com terror…

És mesmo a Morte? Ele insiste.

– Sim, torna o Anjo, a Morte sou,

Mestra que jamais engana,

A tua amiga melhor.

E o Anjo foi-se aproximando,

A fronte do homem tocou,

Com infinita doçura

As magras mãos lhe cerrou…

Era o carinho inefável

De quem ao peito o criou.

Era a doçura da amada 

Que amara com mais amor.

Um dos poemas mais famosos de Manuel Bandeira é “Vou-me embora pra Pasárgada”, o tema principal do poema é a vontade do personagem escapar para uma outra realidade, a fuga é no sentido da aventura, da independência, rumo à diversão sem limites e sem consequências. Neste momento que vivemos, quem não deseja ir embora pra Pasárgada? Quem não deseja fugir desta morte miúda, da morte em dose homeopática que não se deixa ver, que nos consome aos poucos minando nossa mente e até nossos espíritos, isto tudo é muito difícil de lidar, somos pessoas do mundo, somos andarilhos e mochileiros, portanto não admitimos este tipo de morte que antecede a morte física.

No entanto, como andarilhos e mochileiros precisamos aprender a lidar com nossas limitações e também levar em consideração a limitação dos outros, afinal somos criaturas companheiras que vieram cumprir uma trajetória evolutiva, ora juntas no mesmo séquito consanguíneo ou não, que trouxeram uma bagagem evolutiva e seus karmas para serem expiados. 

São angustiantes e alarmantes as notícias do numero crescente de pessoas com Covid, vivemos com o coração apertado, cada dia vivido com a doença é uma experiência pessoal, o sofrimento é conforme a intensidade do aperto do nó em suas gargantas e pulmões, é uma luta de vida e morte, tudo está por um fio.

Cada pessoa que vive ou viveu neste planeta veio para aprender suas próprias lições, cada um aprende com suas próprias experiências e no momento propicio, as perdas fazem parte deste duro aprendizado, em verdade parte deste aprendizado vem pela morte física que não nos tira a vida, mas simplesmente faz com que passemos a transitar por novos caminhos.

Estamos cientes que a morte é um fenômeno natural e inevitável, o fato é que independente de nossas crenças, todos nós um dia retornaremos ao Mundo Espiritual onde é nossa verdadeira morada. Mas se a morte é inexorável, a dor também.  Sempre sofremos com a perda de pessoas que amamos, uns mais, outros menos, mas a verdade é que o sofrimento pela perda – o chamado luto – muitas vezes faz-nos perder o chão. O conforto está na crença de que a vida espiritual é a vida verdadeira, e como somos espíritos reencarnados nessa extraordinária escola chamada Terra, estamos aqui com objetivo de corrigir nossos erros e acelerar nosso aprendizado e progresso, à medida que evoluímos vamos habitando outros mundos conforme nosso grau de evolução, afinal Deus, nosso Grande relojoeiro criou várias moradas.

Sempre considerei a reencarnação como o conceito fundamental para um entendimento racional dos mecanismos que regem a vida, tanto em seu viés biológico, psíquico e moral, as provas de sua razoabilidade podem ser vistas através de métodos científicos como por exemplo a hipnose investigativa, tendências e domínio de habilidades estranhas ao corpo familiar, ao déjà-vú ou sensação de que uma cena ou experiência que se está vivendo nesse momento já aconteceu, incorporação de espíritos dos desencarnados trazendo informes da outra dimensão.

Sempre voltaremos para o Mundo Espiritual por meio da morte que ceifa nossa vida orgânica, mas nunca destrói nossa individualidade, nosso Espírito, pelo fato de que somos imortais e a vida espiritual é apenas a continuidade daquilo que fazemos ou deixamos de fazer em nossa vida aqui na Terra, como São Tomé estamos sempre a exigir provas, as provas da existência de outros mundos e outras dimensões estão à disposição daqueles que suportaram a dores deste mundo e conseguiram levantar o véu da ignorância, nossos guias espirituais estão ao nosso lado nos inspirando bons pensamentos, através deles podemos nos contatar com frequências mais elevadas, são como fios condutores que nos ligam a outras dimensões utilizando nossa energia vital.

Muitos são os nossos aprendizados, um deles, talvez o mais difícil e ao mesmo tempo o mais fácil, diz respeito a ilusão, em princípio seria o desconhecimento da verdade, digo que em princípio, pois há aqueles que embora saibam qual seja a verdade fecham os olhos para os sinais que a vida lhes dá. A humanidade em sua existência vive perseguindo o prazer e fugindo da dor, a tal pensamento se invertido damos o nome de ilusão, um sentimento de “cupidez de existir para sempre”.

Freud em seus estudos apontou o que decide o propósito da vida é simplesmente o programa do princípio do prazer, embora já saibamos que a dor e prazer não estejam na matéria, nos iludimos imaginando que ambas estejam está na matéria e a esse equívoco se diz ilusão, aqui me refiro a dor e o prazer gerados pelas emoções que afetam o corpo através das energias oriundas na mente, não aquela dor causada por um acidente onde nosso corpo tenha sofrido alguma avaria.

As emoções apresentam a presença de eventos importantes em nossas vidas, sobretudo tem valor de sobrevivência para o indivíduo e a espécie, envolvendo inevitáveis respostas fisiológicas periféricas, um sentimento afetivo e ainda uma consciência e inteligência emocional que nos permite identifica-las. O ser humano através de sua inteligência procura criar condições que levem ao autoconhecimento emocional, parte deste autoconhecimento é bagagem que trazemos de outras vivências passadas, se foram aprendidas darão suporte para a vida terrena atual e quiçá alguma reminiscência como um “Déjà Vu”, cientes disto podemos nos imaginar como viajantes mochileiros.

O ser humano reencarnado veio para exercitar sua independência, pois somos um viajante temporário entre pessoas, sexo, profissão, países, continentes e mundos, numa gigantesca diversidade, cientes disto é necessário compreender que o apego exagerado pode gerar desajustes e doenças psicológicas severas, desde a mais leve insegurança – se deve ou não sair de casa para um passeio a sós, ou que roupa deve usar – até o pânico incontrolável de tudo e de todos, que pode levar o indivíduo ao desequilíbrio em seu desenvolvimento e maturidade, é quando emoções como tristeza profunda e depressão nos levam ao fundo do poço. Sair do poço é muito mais difícil do que entrar, desencarnar no fundo poço nos roubará tempo de evolução, lutar para superar faz parte da grande capacidade do ser humano.

É importante entender que nascimento e morte são etapas de um processo natural da vida, é necessário nos desapegarmos da ideia de que somos separados da Natureza, a morte como fim de tudo, como uma visão isolada, desumana e insuportável de conceber. Todavia, ao provar um sentimento de perda, passamos por uma das maiores experiências como seres humanos: é quando somos impulsionados a uma intensa reflexão, conseguindo, a partir daí, observar as verdades transcendentais da vida, nossa grandeza e ao mesmo pequenez.

Vivemos tempos de gratidão e perdão. Gratidão pela oportunidade de reencarnarmos, gratidão é a base de toda felicidade, sentir gratidão mesmo diante de muitas demandas nesta vida terrena. Estamos diante da oportunidade de perdoarmos e nos perdoarmos, e fazemos isto quando conseguimos passar a usar de modo construtivo os poderes de nosso pensamento e inteligência emocionais, evitando os “deveria ter falado ou agido” eliminando de nossa produção imaginativa acontecimentos infelizes e destrutivos que ocorreram conosco.

Nosso desenlace deste mundo precisa passar por uma atitude de autoperdão, perdoar-nos é não nos importar com o que fomos, pois, a renovação está no instante presente: o que importa é como somos hoje e qual nossa determinação de buscar nosso progresso espiritual, convivendo com a mais nítida realidade, não nos distraindo com ilusões que os outros e nós mesmos “deveríamos ser” algo que imaginamos ou fantasiamos.

A sensação de estar vivendo por um fio também é a sensação que muitos vivem desde muito tempo, muitas são as pessoas vivem na corda bamba lutando pela sobrevivência, pessoas que vivem na pobreza e na miséria, fruto de uma conjuntura histórica, econômica e cultural, realidade histórica que se repete e cristalizou-se no tempo.

O desafio de sobreviver nestes tempos de pandemia se tornou algo insuportável e quase impossível, nos levou a uma imensa vulnerabilidade, principalmente para aqueles que viviam na informalidade, desempregados, e não podem sair à rua para trabalhar e buscar o sustento, gente que trabalhava de dia para comer a noite. Serão necessários muitos esforços de auxilio social e compreensão por parte daqueles que tem e podem dividir com quem não tem nada, está aí uma oportunidade que a humanidade tem para demonstrar compaixão, pois muito se pedirá aquele que muito recebeu.

Pensar a respeito destas “coisas” faz parte de nossa natureza, refletir é uma forma de aprendizado, no entanto quando a dor surge em nosso caminho, parece que tudo que aprendemos não ajuda muito, parte é por falta de experiência, muito por pensamos ter aprendido foi apenas decorado, como a simples leitura, a memória deve ser emotiva, é dela que saem as ferramentas de defesa frente as dores, a razão é que não aprendemos de verdade, apenas memorizamos regras e princípios, o aprendizado humano é emocional e experimentado, a memória tem de ser afetiva e vivida, leva muito tempo e evolução, obter a maturidade, pode levar muitas reencarnações, não devemos pensar que ao deixar cair lágrimas falhamos. Lágrimas derramadas pela perda são emoções materializadas que romperam as barreiras do corpo físico, são excessos de energia que precisamos extravasar e nelas estão contidas as esperanças de reencontrar-nos logo mais, na vida eterna, que as lágrimas nos levem a paz interior, hoje e sempre!

Nascemos presos em gaiolas de costumes culturais, somos socialmente ensinados a pensar de certa forma apenas seguimos imitando as gerações passadas sem perguntar a respeito, caberá a nós o despertar e meditar a respeito daquilo que até agora nos foi transmitido como liquido e certo. A repetição sem raciocínio é uma forma de consolidar a alienação. Aprendi a não admitir que as coisas são feitas e continuarão a ser feitas "porque sempre foram feitas assim", por contra disto procuro manter minha mente aberta, questionando o que nos rodeia, aceitando o desconhecido como possibilidade, ousando para vencer dogmas onde o medo é o maior inimigo. 

Ao longo dos anos realizei muitos estudos e meditei a respeito de muitas religiões, o que aprendi foi principalmente o respeito por cada uma, tenho várias religiões em meu coração e mente, como se diz: “tenho um pé em cada canoa”, procuro manter o equilíbrio afastando quaisquer tipos de fanatismos e fundamentalismos.

Aqui me permitam um aparte; aprendi que as religiões foram inventadas pelo ser humano como forma de se ligar ao Criador, penso que cada uma tem um rico arcabouço filosófico, sou grato a todas elas pelo que me ensinaram de precioso sobre mim e os outros. Encontrei em meus estudos uma certeza que me vacinou contra especulações metafísicas exageradas, levo em conta principalmente o que cada uma das religiões incita a melhorar o autoconhecimento, e todas as religiões são importantes, todas são caminhos que levam o ser humano ao Criador.

Tudo veio de mais longe e muito mais tempo do que nós, a humanidade construiu um imenso patrimônio em nome da fé, este patrimônio institucionalizou-se em todas as partes do planeta, com e sem contato entre elas, cada religião construiu e convencionou um sistema de crenças, valores, dogmas, ritos, virtudes, atitudes e metas para doutrina e dos seus fiéis, o condicionamento é inevitável, porem quando estranhamos haver incompatibilidade entre alguns, rituais, exigências, dogmas e a realidade, somos provocados a refletir, e me perguntei porque razão a religião que fui doutrinado a aceitar era a única dentre centenas de religiões, ela seria a dona da verdade e o único caminho para a tal salvação?

Obviamente diante do panorama estava claro para mim não existir exclusividade, e por isto nenhuma religião poderia reivindicar o direito de ter o “elixir da vida eterna” e garantir uma vida sem sofrimentos neste mundo, pois o que a religião trata é da parte do ser humano que está além do corpo físico, ela trata do ser humano como um ser “metafísico”, não se fixa na ciência e nem nas “coisas” do ter, mas ao mesmo tempo a religião deve abrir caminho para o respeito mútuo,  a autonomia, auxiliando a interpretar o mundo à luz das diferenças, um caminho que vai além da tolerância, ensinando-nos a olhar os outros com empatia.

A religião não pode cegar o ser humano ao ponto de servir como ferramenta de dominação, gosto muito de Marx porque ele consegue fazer uma leitura crucial neste tocante.

Marx foi um filósofo que se referiu a religião como um processo de dominação ideológica e não se conformava com o poder da religião sobre as pessoas, ele em sua abordagem da célebre expressão “a religião é ópio do povo”, ilustra o poder do sagrado de anestesiar os sofrimentos dos explorados, entretanto, é preciso ressaltar que há na religião aspectos positivos, quando articula-se como um instrumento de emancipação e autonomia do ser humano.

O próprio pensamento de Marx é coerente quando ele admite: que “a religião é o suspiro do ser oprimido, o íntimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma”. A alienação se materializa quando deixamos o outro nos dominar fazendo uso de ideologias, nosso raciocínio nos permite pensar que também podemos aprender através dos pontos positivos presentes na religião ela pode ser fonte de emancipação, pois a fé que transforma a pessoa também a leva a querer transformar o mundo que está a sua volta.

A superação da alienação se consolida sob diversas vias e a religião constitui-se uma delas, o fanatismo e fundamentalismo religioso são males alienantes perigosíssimos na sobrevivência humana. Fora destes dois males a religião pode ser um instrumento para a superação das contradições da vida e promoção de uma existência sadia. O ser humano recupera-se do extravio social e compreende que precisa atuar de forma ativa para construir o mundo e participar das transformações no meio onde está inserido, leia-se aqui atitudes positivas em prol da proteção do ser humano como parte da natureza.

A dor que enfrentamos hoje é um aviso a possibilidade de os homens eliminarem uns aos outros. As pesquisas e investigações apontam para o vírus como tendo sido originado do consumo de animais silvestres e exóticos, outro aviso é o aquecimento global que está associado à constante ação do homem desrespeitando a natureza, fazendo uso predatório e abusivo dos recursos naturais do planeta, o problema atual é apenas a ponta de um gigantesco iceberg, a natureza ao longo do tempo vem nos dando alertas, cabe a nós sairmos da ilusão da onipotência e estarmos preparados para enfrentar os desafios que estão logo a nossa frente.

Lamento a morte das pessoas que desencarnaram, externo com muito respeito a dor da perda de um companheiro neste nosso mundo passageiro, vamos em frente, não é hora de esmorecermos, somos instantes passageiros que vivem passageiros instantes! A todo instante Deus está comandando entidades de luz em nossa orientação e proteção!

 

Fonte:

Bandeira, Manuel. Antologia Poética. 9.ed.Rio de Janeiro, J. Olympio, 1977

Renovando Atitudes / pelo espírito Hammed; psicografado por Francisco do Espírito Santos Neto Catanduva, SP: Boa Nova Editora, 1997.