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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

A dialética de Sócrates e Musashi neste mundo ambíguo

 

Vivemos num mundo ambíguo, onde ficamos deslumbrados com a evolução científica e ao mesmo tempo contemplamos as inúmeras tragédias que povoam o planeta, as inúmeras ameaças que estão surgindo pelo caminhar das potências mundiais num enfrentamento que poderia ser evitado, isto se a cultura armamentista e poder econômicos fossem usados em prol de uma ética global, no entanto o que construímos foi uma cultura mais destruidora e dominadora, a cultura é responsável por isto que vivenciamos hoje, nossa liberdade no hoje é limitada por valores construídos ao longo dos anos aos quais estamos subordinados, estes valores nos trouxeram a este presente, este presente de atrocidades mundiais, atrocidades regionais e locais, o ser humano está doente e precisa urgentemente da tutela externa, não é possível prosseguirmos sem que num futuro muito próximo o planeta venha a colapsar e toda a vida presente se extingue.

A filosofia ocidental e oriental nos ajuda a interpretar este mundo ambíguo que vivemos, através de sua sabedoria, passamos a nos questionar como deixamos as coisas chegarem a este ponto, onde estaria toda a filosofia construída, afinal quem somos neste mundo louco e absurdo, o que aprendemos e o que ainda não aprendemos, mesmo diante de tantas lições vividas ao longo dos séculos sob tantas lutas, tragédias, misérias, guerras, vidas ceifadas, ainda estamos vivendo num mundo onde a maior dificuldade e o maior inimigo ainda é vencer a nós mesmos e nossa brutalidade, vivemos no contraditório, apresentamos a guerra como solução para a paz, onde está nosso sentimento de indignação que poderia transformar o mundo, o autoconhecimento que a milênios estamos buscando, como fazer florescer o Lótus Branco em meio a este mundo de absurdos.


Conta-se que Lótus Branco é uma flor que surge no fundo de um lago e precisa vencer diversas intempéries para chegar a superfície e florescer. Ela não pode se identificar com o lodo e nem com a agua, pois sabe que para conhecer o sol terá que subir até a superfície, o mesmo ocorre com o ser humano que quer conhecer a si mesmo, neste processo lento, que pode levar uma vida inteira, passo a passo, subindo cada degrau, um por vez, vivendo o presente e no presente poderemos enxergar cada degrau e o próximo passo a dar é que poderá alcançar o autoconhecimento.


Milênios se passaram desde o surgimento de Sócrates, para ele o autoconhecimento são como passo a passo dados focando um degrau de cada vez, o primeiro degrau foi pisado por Sócrates quando percebeu que o primeiro passo para o conhecimento é a admissão da própria ignorância. E com isso estabeleceu a missão de despertar nas pessoas a consciência de interrogarem-se a si mesmos, buscando desta forma sair do estado de ignorância em que se encontravam.

O autoconhecimento tratado por Sócrates está totalmente voltado para uma sociedade melhor e mais justa, pois quando os homens se olham internamente ele também está provocando a partir do seu autoconhecimento o entendimento e o conhecimento do outro, e conhecendo o outro posso buscar o que é de melhor para todos, aqui se tratando não só da sociedade grega, mas também da sociedade mundial.

Sócrates fez esta análise há aproximadamente 2500 anos, ou seja, o mais sábio dos sábios fundamentou a importância do autoconhecimento antes mesmo do nascimento de Cristo, e com uma visão avassaladora de progresso social, onde se queremos uma sociedade melhor, uma vida melhor, mais felicidade, mais paz e progresso, precisamos primeiro sair da ignorância, precisamos olhar para dentro, precisamos nos conhecer, precisamos conhecer o ser humano que habita em cada um de nós, domar e dominar nossa brutalidade e controlar nossa vidas e nossos desejos.

Ao longo da história humana houveram muitos que por seus exemplos marcaram a humanidade, escolhi inicialmente Sócrates e Musashi, um na filosofia ocidental e outro na filosofia oriental, poderia ter escolhidos muitos outros, no entanto, procurei apenas dois, de culturas diferentes.

 Arte de Bruno Cabral

Em 04/08/2020 escrevi uma resenha sobre o “O Livro dos Cinco Elementos” (O livro dos cinco anéis) – Gorin no Sho de Musashi Miyamoto, também conhecido como Shinmen Takezō, ou Miyamoto Bennosuke, ou pelo nome budista Niten Dōraku, foi um japonês do clã Tokugawa, espadachim, ronin, ex-samurai, criador da técnica de espadas Niten Ichi Ryu e escritor do tratado sobre artes-marciais chamado de o livro dos Cinco Anéis. Nascimento: 1584, Província de Harima e falecimento em 13 de junho de 1645 na Província de Higo. Escolhi o tema e o autor devido a mensagem budista de autoconhecimento e a luta deste guerreiro para alcançar seu objetivo que permeou sua vida.

Conta-se que Musashi, quando jovem, era um guerreiro valente e audacioso, mas não sabia controlar sua força e seu temperamento. Estava sempre criando problemas e um dia foi preso. Seria julgado e talvez executado. No caminho, passou pelo templo de sua infância, e o monge Takuan o reconheceu. Insistiu com os soldados que deixassem Musashi amarrado de ponta-cabeça na arvore e sob seus cuidados. Ele dobraria a fera. Monge Takuan era confiável, amigo do senhor feudal. Assim foi feito.

Furioso, o jovem Musashi gritava para que o monge o soltasse, mas esse apenas ria debaixo da arvore. Musashi cuspia, falava de forma grosseira, mas o monge apenas ria, até que disse:

- Essa sua raiva pessoal não serve para nada. Se sua indignação fosse maior do que você, poderia sair dessa arvore.

Foi assim que o monge Takuan soltou Musashi e o treinou na arte zen do autoconhecimento para que se tornasse um dos maiores samurais do Japão.

Nesta passagem da vida de Musashi podemos compreender que ele conseguiu vencer sua raiva individual, aprendeu a vencer a si mesmo, a partir de seu sentimento de indignação maior que ele mesmo, usou sua força para alavancar sua transformação, passou a dizer para ele mesmo que “Meu adversário sou sempre eu mesmo”.

Seu último embate foi vencido não pela força, mas pela estratégia. Usou uma espada de madeira contra a espada longa de seu jovem e poderoso adversário, talvez seu adversário fosse até mais hábil, mas Musashi havia vencido a si mesmo, Controlado e preciso. Centrado, colocou-se contra o sol nascente, venceu sem matar, sem cortar e depois foi ser poeta e pintor, ou seja, fez a escolha de seu próprio caminho.

E assim fica a pergunta, como podemos querer melhorar algo, a sociedade, as pessoas sem conhecer a si próprio primeiro? Uma coisa sabemos, o mundo nunca está totalmente em paz, são muitos os caminhos escolhidos, muitas nações lutam por seus interesses, ainda somos selvagens suficientes para subjugar o outro através da força e das armas, em algum canto tem alguém guerreando, matando, submetendo pessoas ao terror, estamos vivendo num mesmo planeta onde de um lado temos paz e fartura e de outro guerra e fome, como indivíduos queremos a paz, porem na matilha escolhemos a guerra, a impressão que fica é a falta de autoconhecimento coletivo, somos egoístas demais para pensar no outro como indivíduos, pensamos no outro como “outros”, "alguéns" sem cara nem rosto, não temos o autoconhecimento dos “outros”, não conseguimos enxergar a essência do mundo, então não há como mudar o restante, mesmo sabendo que a mudança começa em cada um de nós, começa por dentro e vai até o outro, até os “outros”.

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