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sábado, 24 de julho de 2021

A Fabula do Velho Sábio

Era uma vez um guerreiro, famoso por sua invencibilidade na guerra. Era um homem extremamente cruel e, por isso, temido por todos. Quando ele se aproximava de uma aldeia, os moradores saiam correndo para as montanhas, onde se escondiam do malvado guerreiro. Subjugou muitas aldeias.

Certo dia, alguém viu ele se aproximar com seu exército de uma pequena aldeia, onde viviam alguns agricultores e entre eles um velhinho, muito sábio. Quando o pessoal escutou a terrível notícia da aproximação do guerreiro, tratou de juntar o que podia e fugir rapidamente para as montanhas. Só o velhinho ficou para trás. Ele já não podia fugir. O guerreiro entrou na aldeia e foi cruel, incendiando as casas e matando alguns animais soltos pelas ruas. Até que chegou na casa do velhinho. O velhinho, quando o viu se assustou. E sem piedade, foi dizendo ao velhinho que seus dias haviam chegado ao fim. Mas, que lhe concederia um último desejo, antes de passá-lo pelo fio de sua espada. O velhinho pensou um pouco e pediu que o guerreiro fosse com ele até o bosque e ali lhe cortasse um galho de uma árvore. O guerreiro achou aquilo uma besteira. -“Esse velho deve estar gagá. Que último desejo mais besta.” Mas, se esse era o último desejo do velhinho, havia que atendê-lo. E lá foi o guerreiro até o bosque e com um golpe de sua espada, cortou um galho de uma árvore.-” Muito bem” disse o velhinho. -“O senhor cortou o galho da árvore. Agora, por favor, coloque esse galho na árvore outra vez.” O guerreiro deu uma grande gargalhada, dizendo que esse velho deve estar louco, pois todo mundo sabe que isso já não é mais possível, colocar o galho cortado na árvore outra vez”. O velhinho então lhe respondeu:

– “Louco é você que pensa que tem poder só porque destrói as coisas e mata as pessoas que encontra pela frente. Quem só sabe destruir e matar, esse não tem poder. Poder tem aquela pessoa que sabe juntar, que sabe unir o que foi separado, que faz reviver o que parece morto. Essa pessoa tem verdadeiro poder”.

A fabula do Velho Sábio é uma bela metáfora que permite reflexões, a vida que cada um vive é recheada por escolhas, escolhas que são feitas a todo o momento, algumas mais, outras menos refletidas, as escolhas em suas consequências é o que irá construir a imagem de cada um, somos obreiros de nosso destino.

O valor de cada uma está nas ideias e na capacidade de execução, isto vale para as pessoas que estão conscientes de sua posição no mundo e na vida, temos pessoas com visão de futuro, pessoas capazes de colocar um ovo em pé, o conhecido ovo de Colombo, por construírem coisas a partir de ideias, outras, pessoas que também tem a capacidade de destruir construindo uma imagem de poder negativo, assim como esta explicito na mensagem da fabula.

Ovo de Colombo é uma expressão popular que significa que algo muito difícil de se realizar, parece muito fácil, depois de concretizado, para colocar o ovo em pé, aqui me refiro obviamente a metáfora de se fazer algo que era muito difícil de executar, se torna possível graças a criatividade e inspiração individual, são pessoas que são empoderadas pelo poder positivo da boa construção.

Os obreiros são pessoas que diariamente se defrontam com situações e escolhas difíceis, vivemos em tempos difíceis, tempos que exigem medidas duras para sobrevivência, tempos que lhe é exigido colocar um ovo em pé.

 

Os obreiros do bem são pessoas que independente dos desafios estão conscientes que uma construção sólida é preciso respeitar regras humanas, sabe que existem regras para serem entendidas, assimiladas e respeitadas, é o que dá consistência ao longo do tempo, as exceções jamais poderão ser maiores que as regras, isto exige muito esforço, esforço para lutar contra as tentativas de deturpações e o afastar do bom caminho do obreiro.

 

O obreiro sabe que após uma destruição, a destruição pela escolha errada, a reconstrução é mais difícil e custosa, muitas vezes é preciso derrubar os alicerces a moda cartesiana, para poder construir algo novo e sustentável, exigindo energias e um tempo ainda mais longo para a recuperação.

 

Os obreiros que veem na dificuldade a possibilidade de colocar o ovo em pé, são pessoas inspiradas em sua individualidade visando gerar ações para o coletivo, os obreiros sabem que destruir é fácil, construir é trabalho difícil, escolher os caminhos difíceis fará com que os obreiros sejam melhores.

 

A ideia do ovo é a ideia de equilíbrio, equilíbrio entre a mente e o corpo, o equilíbrio que nos permite sentir que somos uma coisa só, sem separações, o obreiro é eficiente por sua capacidade de construção da vida material e a vida espiritual numa alquimia transformadora e transmutadora.

 

Recordo-me de algumas ideias da alquimia, ideias que me remetem ao ovo filosófico, o ovo que possui uma ideia de germe de uma vida espiritual, núcleo do universo, ele encerra na sua casca os elementos vitais, assim como o vaso hermeticamente fechado contém o composto da obra, tal ovo participa de todo simbolismo de transmutação, é uma ideia perfeita de equilíbrio, isto é no sentido de se sentir capaz de mudar uma coisa, acertar o passo, acertar e corrigir o erro, com atos conscientes o obreiro que o ser humano é, está consciente que pode corrigir o rumo e encetar no caminho certo.

 

Talvez, Nicolau Flamel um alquimista do século XIV, utiliza-se os círculos de transmutação numa sessão de alquimia, com seus desenhos característicos de certas coisas ou elementos como terra, água, ou outros, tivesse poder para transmutar alguma coisa, no entanto a transmutação a que me refiro é obra da atitude das pessoas, a mudança e o acertar do passo não necessitem de círculos alquímicos, necessitem de ideia, iluminação, criatividade e ação para colocar o seu ovo espiritual em pé.

 

Estamos chegando em tempos de retomada, tempos de se acertar o passo, imagino que neste final de ano de 2021, estejamos todos saindo desta tempestade que assolou nosso planeta, estejamos nos sentindo mais fortes, doloridos sim, mas mais fortes, estamos passando por um período de transmutação, estamos saindo de dois anos sabáticos, o cenário do futuro que já não é mais o mesmo, ainda nos pede perseverança no estilo japonês “gaman”, vamos precisar ainda ser atenciosos conosco e os outros.

 

Vivemos tempos onde estamos aprendendo a estar prontos para o acaso e ao inesperado, por mais esta razão, estamos experimentando coisas diferentes e construindo um outro conhecimento de maneira horizontal, onde a experiência que estamos vivenciando está contribuindo para um conhecimento coletivo e ao mesmo tempo individual, o acaso são os acontecimentos imprevistos onde cada um contribui a sua maneira e dribla os inconvenientes e as dificuldades, todos nós sairemos diferentes desta experiência mundial, a transmutação é um fato e consequência deste cenário de aprendizados, o tempo é o professor perseverante, é o grande velho sábio.

 

quarta-feira, 21 de julho de 2021

Resenha do livro A Peste de Albert Camus e sua relação com a crise na representatividade politica


“Se você quiser filosofar, escreva romances” Albert Camus
 
Esta afirmação de Camus é verdadeira, por que? porquê é uma forma inteligente de levar a filosofia até as pessoas que ainda não haviam tido interesse ou contato com o assunto, esta é uma forma de atrair o interesse das pessoas, a filosofia que é a mãe do conhecimento não deve passar desapercebida na vida do ser humano, é preciso dialogar com ela e com seus preciosos conhecimentos, filosofar é viver intensamente sua existência.

O livro é extremamente atual, embora tenha sido escrito em 1947, o título é bastante sugestivo, dá a pinta do que está se referindo, está na lista dos mais vendidos, e este é o momento ideal para se falar sobre ele, resolvi fazer esta resenha por dois motivos, primeiro por ser muito atual em relação a epidemia narrada no livro com a pandemia que o mundo vive e familiaridade dos eventos narrados, em segundo lugar pela crise de representatividade política que estamos vivendo desde muitos anos, faço relação as situações noticiadas pela mídia e outras muitas de corrupção envolvendo políticos e politicagens.

Albert Camus foi um escritor, filósofo, romancista, dramaturgo, jornalista e ensaísta franco-argelino. Ele também atuou como jornalista militante envolvido na Resistência Francesa, situando-se próximo das correntes libertárias durante as batalhas morais no período pós-guerra.

O livro A Peste, é a forma alegórica que o romance fez da peste uma metáfora para todas as formas de opressão, horrores voluntários ou não causados pela mão humana e claro de resistência em todos os sentidos da palavra, a estória se refere ao nazismo, no pós-Guerra, mas também a outros flagelos oriundos do absurdo, a peste surge quando ratos aos poucos vão aparecendo mortos até tornarem-se um número imenso, junto com a morte dos ratos as pessoas também começam a ficar doentes e a morrer aos poucos e depois aos montes, na estória do livro os ratos que aparecem aos poucos seriam uma representação dos soldados nazistas e a peste seria a guerra com seus horrores, em nosso caso a relação que faço é do momento atual, estamos todos ligados ao primeiro motivo que é a pandemia que acertou o mundo em cheio e principalmente nós brasileiros estamos ligados ao segundo motivo, envergonhados mundialmente, faço uma relação entre os ratos que seriam os políticos corruptos, alguns velhos conhecidos, que chegaram para dizimar não só uma cidade, mas o país, os ratos políticos estão contaminados não pela peste bubônica, mas pela peste da corrupção e seus horrores mostrando do que o ser humano é capaz.

Os políticos surgem como ratos para dizimar os recursos da sociedade, que consequentemente acabam dizimando os direitos a saúde, a educação, a segurança, e a esperança em se acreditar que possa haver alguém honesto e integro.

Os recursos são desviados pelos “ratos” para atender seus próprios interesses e bolsos, o horror é tão grande que mesmo em tempo de pandemia ouvimos relatos de superfaturamento em vacinas e insumos, super verba para Fundo Eleitoral de 6 bilhões, sem falar no dinheiro na cueca, em malas e etc, fatos de corrupção não faltam para ilustrar.

Os ratos políticos alegam não haver verba para atender as necessidades da população, mas aprovam verba para fundo Eleitoral de 2 bilhões como a que aprovaram em 2020, como viram que é fácil, já aumentaram sua intenção para 2021 tal verba para 6 bilhões, este absurdo é tão grande, que só podemos pensar se tratar da corrupção do bom senso e total despreparo desta classe que deveria estar zelando pela aplicação correta de recursos públicos, a grandiosidade do problema merece tratamento de igual monta, não aguentamos mais, me parece haver um único caminho, é o de exterminar com os ratos antes que eles nos exterminem, a justiça tem de ser dura e exemplar, não é possível esperar que a peste desapareça por si só como foi o que aconteceu na estória do livro, só a pretensão de deixar seguir em frente tal absurdo, como já disse a magnitude da intenção se revelou o alcance e o tamanho da corrupção nesta classe que deveria ser a mais correta por tratar de dinheiro público.

Voltemos ao livro, o livro contém muitas reflexões que são recorrentes em outras obras do autor, como a absurdidade da existência, o amor, a revolta e a solidariedade humana. Como analogia, a narrativa e a doença alertam o leitor para uma constante ameaça política sobre sua vida e direitos, como por exemplo ao que anteriormente foi narrado.

A familiaridade e os pontos de contato da estória do livro com a realidade são imensos, tanto os flagelos totalitários quanto as pandemias reais que, de tempos em tempos, surgem “para desgraça e ensinamento dos homens”, sabemos que o tempo também enfraquece a memória e o ensinamento acaba sendo esquecido, mesmo diante do horror causados pela miséria e doenças há quem esteja tirando algum proveito de forma desonesta nesta crise sanitária e econômica.

O romance A Peste foi publicado em 1947, pouco tempo após o fim da Segunda Guerra Mundial, e conta a história da chegada de uma epidemia à cidade argelina de Oran, ele  narra a história de trabalhadores que descobrem a solidariedade em meio à uma peste que assola a cidade, e pode ser interpretado como metáfora dos horrores da Segunda Guerra Mundial, assim como a pandemia atualmente revelou o espirito de solidariedade das pessoas em ajudar as pessoas que estão necessitadas do mínimo para sobreviverem.

O autor como sabemos conviveu com a tuberculose, ele conviveu com a proximidade da morte, falando bastante sobre a morte, mas fala também sobre a vida, amor e resistência de todos os tipos e sentidos da palavra.

A peste de nossa estória é a peste bubônica ou peste negra, ou ainda simplesmente peste, é uma doença grave e muitas vezes fatal causada pela bactéria Yersinia pestis, que é transmitida através das pulgas de animais roedores aos seres humanos, ou ferimentos e arranhões de animais domésticos infectados, não tem vacina para esta doença, o que existe são medicamentos para combater a doença, combater a doença é combater e exterminar os ratos, com o aquecimento global já há estudos que apontam para uma infestação global destes animais.

A estória narra como a peste bubônica se manifesta nos seres humanos, seu nome vem justamente de um dos sintomas que causa: um inchaço doloroso do linfonodo, que atinge os tecidos da axila ou da virilha, formando uma espécie de bolha, conhecida como "bubão", as cenas narradas são extremamente realistas, as pessoas vão morrendo aos poucos, fisicamente e psicologicamente em razão das medidas sanitárias, como o estado de sitio e o isolamento dos contaminado.

A cidade de oran onde se passa nossa estória é uma cidade comum e pacata, é uma cidade francesa na costa argelina, os detalhes da descrição da cidade nos dão conta que é uma cidade feia, sem pombos, sem arvores, sem jardins, as pessoas são pacatas demais, numa mesmice e monotonia imensa, sem altos e baixos em suas vidas, são como autômatos, é uma visão imaginária sombria, a monotonia só é quebrada pela chegada da peste com seus horrores.

Os ratos começam a aparecer mortos, aos poucos e depois aos montes, em seguida as pessoas também começam a aparecer mortos, até se darem conta de se tratar de uma doença, a descrição da morte é uma coisa horrorosa, em detalhes de como a doença destrói o corpo e a mente.

A metáfora é representada pelos ratos que vão surgindo aos poucos está relacionado com a chegadas dos soldados durante a segunda guerra, por aí já podemos entender a relação que Camus está fazendo com a guerra.

O autor tem ares de visionário, o medo da população em torno da peste, a insegurança, a dúvida de ficar em casa, é uma doença desconhecida por ser relativamente nova, o médico toma medidas sanitárias e a cidade é colocada em estado de sitio, as pessoas são separadas, vidas são separadas por conta da peste, há mortes de pessoas jovens e crianças, é uma estória na qual nos identificamos muito, há a saudade das pessoas isoladas, a saudade da rua, saudade de sair para o mundo, a sensação no mal invisível, a desconfiança de que tudo pode estar contaminado, surgem teorias bizarras como apocalipse como praga bíblica, ao ler percebemos haver um paralelismo com nossa situação atual.

Como sabemos a morte traz uma carga emocional muito dura, o livro traz histórias muito tristes e tenho certeza que os corações mais duros se sensibilizarão, talvez sensibilizem alguns mais quem lê a história do livro do que com uma história da vida real, é estranho, mas isto existe.

A medida que o livro avança, os horrores vão acontecendo e a esperança das pessoas vai esmorecendo até que num dia a peste simplesmente some, o sol nasce belo e maravilhoso, no entanto a peste continua lá, está escondida em algum lugar, em algum canto, á espreita,  para um dia talvez abocanhar novamente aquela cidade, poderia através de um lenço, dentro de um baú, em algum lugarzinho inocente.

A ideia do livro também carrega a ideia do mal no mundo, numa perspectiva diferente da religião, ele não quer que a religião mascare a situação, ele chega a duvidar da bondade, a fé é questionada ainda mais quando a doença começa a atingir as crianças e este seria o pior sofrimento que é o sofrimento da criança, a dúvida se Deus existe, por ver Deus deixar as crianças morrerem.

O autor pensa que é o homem o responsável moralmente por tudo que ocorre, sem a figura de Deus, os personagens do livro incorporam as ideias de Camus, nesta ideia da luta contra o mal, pode ser a violência, a corrupção, suas atitudes não são pacifistas, é uma ideia de luta, ele na vida real deu seu o exemplo, ele trabalhou como jornalista junto a resistência contra os nazistas, ele não é um cara pessimista, ele é realista, o mundo é absurdo pelas mortes desnecessárias e inúteis, mas não é atroz, mas é um mundo que vale a pena lutar, ele tem uma visão mediterrânea pagã, ele tinha uma ideia contra a pena de morte, ele é a favor da ideia que o ser humano sempre deve ter uma chance de mudar.

Com a Peste (1947), Albert Camus tenta a demonstração de um novo cogito cartesiano: “Eu me revolto, portanto nós somos.” Pois a revolta (individual) contra o absurdo é também revolta (coletiva) a favor dos valores que a própria revolta revela. Vamos direcionar nossa revolta contra estes absurdos políticos que estão devorando nosso pais com a gente dentro dele.

Fonte: Camus, Albert. A Peste/Albert Camus: tradução de Valerie Rumjanek Chaves – 31ª ed- Rio de Janeiro: Record 2020.