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quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Silêncio do Rio

O rio, em sua serenidade contínua, nos oferece uma metáfora rica e profunda para refletir sobre a vida e o cotidiano. Imagine um rio que flui calmamente, suas águas murmurando suavemente, carregando consigo folhas e pequenos galhos, quase imperceptíveis em sua jornada incessante. Esse silêncio do rio pode ser comparado aos momentos de introspecção que todos nós experimentamos.

No ritmo frenético do dia a dia, muitas vezes somos como pedras rolando rio abaixo, empurrados pela correnteza das obrigações e responsabilidades. O trabalho, os compromissos sociais, a família e os amigos exigem nossa atenção constante, e, sem perceber, nos tornamos parte de um turbilhão que raramente permite uma pausa para respirar. É nesse contexto que o silêncio do rio se torna uma metáfora poderosa para a necessidade de encontrar momentos de quietude e reflexão.

Considere a rotina de um trabalhador comum, que acorda cedo, enfrenta o trânsito caótico da cidade, passa o dia lidando com prazos e demandas, e retorna exausto para casa. Nesse cenário, onde está o espaço para ouvir o silêncio do rio? É preciso criar intencionalmente esses momentos de pausa, assim como o rio encontra suas curvas e remansos onde a água pode descansar por um instante antes de seguir seu curso.

O filósofo e pensador contemporâneo Byung-Chul Han, em seu livro "O Aroma do Tempo", discute como a sociedade moderna está constantemente acelerada, perdendo a capacidade de vivenciar o tempo de maneira plena. Ele sugere que precisamos resgatar a "arte da demora", permitindo-nos viver de forma mais autêntica e profunda. Nesse sentido, o silêncio do rio nos lembra da importância de desacelerar e apreciar o fluxo natural da vida, sem a pressão constante do relógio.

Além disso, o silêncio do rio pode ser visto como uma forma de resistência contra a sobrecarga sensorial do mundo moderno. Vivemos cercados por ruídos – notificações de celulares, buzinas de carros, conversas incessantes. O rio, em seu silêncio, oferece uma fuga para a mente sobrecarregada, um lugar onde podemos nos reconectar com nossos pensamentos mais íntimos e encontrar clareza.

Essa metáfora se aplica também às relações humanas. Muitas vezes, a comunicação efetiva não está nas palavras ditas, mas nos momentos compartilhados em silêncio. É no silêncio confortável entre amigos, no olhar compreensivo entre parceiros, que se revela a profundidade das conexões. O silêncio do rio nos ensina a valorizar esses momentos, a entender que nem sempre precisamos falar para nos comunicar, que às vezes, o mais importante é simplesmente estar presente.

Não podemos esquecer que por baixo dessa imagem serena do rio, há uma correnteza forte e, muitas vezes, traiçoeira. Assim como na vida, onde tudo parece calmo na superfície, pode haver uma turbulência invisível pronta para nos pegar desprevenidos. É como aquele colega de trabalho sempre sorridente, mas que está lidando com uma pressão enorme que ninguém vê, ou aquela fase tranquila da vida que, de repente, se transforma em uma tempestade de problemas. Por isso, todo cuidado é pouco. Precisamos estar atentos aos sinais sutis, tanto no rio quanto na vida, para não sermos arrastados por essa correnteza invisível, mas potente. Manter a cabeça acima da água requer não só equilíbrio, mas também uma boa dose de sensibilidade para perceber quando o terreno aparentemente calmo esconde perigos profundos.

Em suma, o silêncio do rio é uma metáfora rica para os tempos modernos. Ele nos convida a refletir sobre a importância da introspecção, a necessidade de desacelerar e a beleza das conexões silenciosas. Como disse o poeta Rumi, "o silêncio é a linguagem de Deus, todo o resto é má tradução". Que possamos, portanto, aprender com o rio e encontrar nosso próprio silêncio em meio ao caos da vida cotidiana.


segunda-feira, 6 de março de 2023

Eremitas dos tempos modernos, Hikikomoris no século XXI

Recém saímos do confinamento causado pela pandemia de covid-19, aos poucos estamos retomando nossas atividades cotidianas, socializando-nos, trabalhando, estudando, vivendo entre as pessoas além das quatro paredes de nosso lar, recuperando-nos dos males causados pelo isolamento social, um mal que mexeu com nossa mente, no entanto, atualmente há milhões de jovens, adultos e idosos cada vez mais vivendo em extremo isolamento doméstico, a pandemia só agravou ainda mais uma tendência que atinge grande parte de nosso mundão afora.

 

"Hikikomori” é um termo de origem japonesa que designa este comportamento de extremo isolamento doméstico, em princípio tenha sido circunscrito à síndrome característica da população japonesa, porem estudos já mostram inúmeros casos semelhantes em vários países no mundo, inclusive no Brasil.

 

Não deveria ser algo comum entre os seres humanos, pois somos seres sociais por natureza, nossa personalidade é formada através do convívio social, sentimos muita falta das pessoas, portanto quando encontramos alguém que vá ao extremo do isolamento social doméstico é porque o problema atingiu um ponto dramático e sair deste casulo é coisa que levará muito tempo de analises e terapias.

 

Quando tomamos conhecimento da existência deste comportamento começamos a perceber quanta gente vive desta forma, seja jovem, adulto ou idoso, lembro de um caso que me marcou muito, um jovem de 22 anos, filho de um amigo, em nossas conversas este amigo me confidenciou, quase um desabafo, que estava enfrentando o problema com seu filho, que já tinha gasto muito verbo tentando convencer o filho a sair para o mundo, o filho sempre se negava a sair, não queria estudar, nem trabalhar, queria mesmo era ficar somente no quarto. O jovem tem diabetes tipo 1, toma regularmente insulina, as vezes exagera na dose, as vezes come o que não deve ou até fica muito tempo sem comer, tem momento em que quase entra em coma e todas as vezes a SAMU é chamada para prestar socorro. Seu pai observou que seu filho é ansioso, reservado, inseguro, insatisfeito com seu porte físico, em várias vezes que trabalhou acabou desistindo do trabalho e em seguida dos estudos, o contato social se dava somente através da internet, quando muito jogava on-line com os amigos virtuais, as namoradas também virtuais vão e vem sem interesse num contato pessoal, talvez por não ter nada há oferecer, sem trabalho e sem formação educacional, vive num círculo vicioso sem fim. Um dos motivos para o confinamento voluntário foi que seu filho acabou se sentindo frustrado por ter que seguir uma dieta rigorosa e por ter que praticar exercícios todos os dias. Ele começou a perder a motivação para se cuidar e a sentir-se triste por ter que seguir uma rotina tão rigorosa. Outro fator que veio para acrescentar maior preocupação foi a Covid-19, no entanto, o pai também confinado pode dar maior atenção para o filho, pois passava mais tempo em casa e conseguiu aos poucos penetrar no universo do filho. Atualmente ambos encontram-se lutando a cada dia para sair do confinamento e aos poucos procurando melhorar a autoestima, motivação para enfrentar os rigores do problema que agora é compartilhado com o pai que se esmera e se dedica ao máximo para ver o filho superando os desafios que são rigorosos. Esta história de vida é mais uma dentre as milhões que existem neste mundão, cheio de dores, tristezas, lutas e alegrias nos menores detalhes. O pai com muita insistência conseguiu levar o filho para consultar com psicólogo e atualmente vem se tratando com psiquiatra. Quando se tratam dos filhos o sofrimento dos pais é algo que só mesmo os pais para saberem que sentimento é este.

Lidar com a diabetes por si só é uma aventura, a cada minuto tudo pode mudar, principalmente quem tem diabetes do tipo 1 que é a mais severa, são tantos os cuidados a tomar que o stress é inevitável, é uma bolha dentro de outra bolha. Em se tratando de um jovem realmente pode ser uma grande aventura! É importante que o jovem se conscientize de suas responsabilidades, mantenha-se comprometido com sua saúde e divirta-se ao longo do caminho. É preciso ter estilo para ser diabético, é preciso manter um estilo de vida saudável, praticar exercícios regularmente, comer alimentos saudáveise monitorar os níveis de glicose no sangue são fundamentais para manter a saúde geral, em se tratando de jovens a rebeldia da idade dos hormônios a flor da pele os torna resistentes a tanta disciplina e cuidados, a juventude tem suas próprias peleias de egos, desejos e vontades, o stress nesta idade infla e esvazia rapidamente, tudo é muito dinâmico e veloz. Aprender a lidar com o stress é o que fará a diferença no rumo da própria vida, por isto é importante procurar aprender técnicas de relaxamento para lidar com o estresse da vida com diabetes, uma forma de se conectar com o mundo é encontrar um mentor, outra pessoa com diabetes para obter apoio e compartilhar suas experiências, alguém fora de casa as vezes é melhor ouvido e escutado do que os próprios pais, os eremitas desta bolha sofrem muito até se encontrarem, para se encontrar não pode ser resistente ao que faz bem, e o bem esta na ajuda que quem esta fora pode oferecer.

A pandemia de Covid-19, obrigou muita gente a se reinventar, muitos jovens não puderam sair de casa para conhecer novas pessoas, explorar novos lugares ou viver sua vida como adultos. Enquanto se sentiam confinados em sua casa, descobriram que existem muitas maneiras de se divertir enquanto se está isolado, como por exemplo aprender algo novo todos os dias, como a tocar um instrumento musical, ler um livro, assistir a filmes e séries, aprender a cozinhar e muito em voga fazer filminhos da vida pessoal como autoajuda, isto tudo acontece com a pessoas que estão bem psicologicamente.

 

Quando não se está bem psicologicamente as coisas tendem a ficar mais complicadas e o mundo complexo demais, até o convívio social tão necessário torna-se uma tarefa árdua e dolorida, estamos inseridos numa sociedade que cobra muito e espera dos jovens altos graus de perfeição, nem todos estão preparados para enfrentar esta selva de exigências e bullyngs na escola e no trabalho, segundo a Wikipédia, “esse tipo de comportamento é atualmente tido como problema de saúde pública no Japão, onde milhares de jovens se encontram nesta situação devido ao alto grau de perfeição exigido das pessoas em tarefas diárias e à pressão acarretada por tal exigência, o que acaba levando muitas pessoas a problemas psicológicos de baixa autoestima e em alguns casos extremos tendências psiquiátricas graves”.

 

A pandemia por um lado nos proporcionou um teste de sanidade ao ficarmos tanto tempo isolados, foi de fato um período muito difícil, a liberdade do ir e vir, confraternizar, visitar, esta proibido, a liberdade que é um de nossos bens mais preciosos estava proibido sob pena de ficarmos gravemente doentes ou levarmos alguém a ficar doente ou até vir a óbito, ficamos psicologicamente abalados, no entanto, para os nossos eremitas hikikomoris, não os abalou muito, o que mudou na vida deles foi a presença constante dos pais em confinamento perturbando sua rotina do quarto para a cozinha e o banheiro.

 

Muitos pais reagiram expulsando os filhos, colocando-os porta a fora, alguns tentaram retomar o passo de suas vidas, outros se tornaram moradores de rua, outros desapareceram, a solução deste problema social é muito sério abrangendo toda a sociedade, muito sofrimento poderia ser poupado se tivéssemos mais empatia.

 

O termo hikikomoris não surgiu a toa no Japão, as estatísticas apontam que sejam entre 500.000 a impressionantes 10 milhões de pessoas no Japão. Os números oficiais são muito baixos, porque esses indivíduos se escondem da sociedade, e fica complicado registrar sua real existência. Em geral são do sexo masculino, são reclusos que a partir de um determinado momento (ou um incidente) simplesmente deixam de sair de casa, obtendo tudo que precisam para viver pela internet ou telefone. Em muitos casos, os hikikomori passam vários anos sem se atrever a sair de casa.

 

Estudos apontam que como característica, também, que a maioria teve uma infância com pais super protetores que criaram adultos e crianças isolados por conta da pressão exercida por eles ao longo da vida, já existem jovens com 15 anos, homens com mais de 40 anos e até idosos que se negam a sair de casa, muitas vezes idosos morrem solitariamente vindo a ser descoberto seu falecimento por algum vizinho reclamando do mal cheiro devido ao corpo do falecido estar em decomposição. Realmente é algo horrível.

 

O isolamento algumas vezes é temporário e outras vezes torna-se definitivo, como se fossem escolhas de vida, outras são circunstancias que as obrigam a ficar em casa pela dificuldade de arrumar emprego fixo, outras veem a possibilidade de escolher fazer o que gostam, quase um tempo sabático, com pouco contato social, mas com a tranquilidade de viver bem e protegido.

 


 

O Jornal Tribuna apresentou um artigo interessante, informam dentre outras coisas que as pesquisas sobre o fenômeno são muito controversas, mas um tema parece recorrente: a influência das tecnologias modernas sobre o desejo de isolamento. As comunicações digitais estariam substituindo os contatos humanos reais, e o isolamento permitiria uma “bolha de segurança” para pessoas introvertidas e tímidas, que se sentem intimidadas pelas expectativas e cobranças das escolas e locais de trabalho.

 

A situação é vista com preocupação pelas famílias e autoridades japonesas. Em algumas cidades, foram criados centros de ajuda dedicados aos hikikomori, para estimular o contato dessas pessoas com o mundo externo e interessa-las em atividades do cotidiano, como fazer compras em lojas, frequentar escolas e trabalhar fora de casa.

 

A tecnologia também pode ajudar os eremitas a mudar sua condição. A crescente interconexão dos mundos online e off-line oferece algumas saídas: no Japão, o jogo para smartphone Pokemon Go estimulou alguns hikikomori a sair de casa para caçar os bichinhos virtuais do jogo.

 

Mesmo assim, é uma situação muito complexa, que não dá sinais de melhora. Segundo o especialista Saito Tamaki, a real população de hikikomori no Japão pode superar 10 milhões de pessoas. Saito também alerta que a condição não afeta apenas adolescentes e jovens adultos: seus estudos indicam que há muitos hikikomori com mais de 50 anos.

 

Saito diz que é difícil realizar uma contagem precisa dos reclusos, porque muitos deles vivem com seus pais e não precisam se preocupar questões de abrigo e alimentação. Por conta disso, os reclusos permanecem trancados em casa, até chegar à meia-idade ou mesmo a velhice. Saito diz que existe o “problema 80/50” relacionado aos hikikomori: pessoas na casa dos 50 anos que vivem com seus pais na casa dos 80 anos.

 

Saito observa que a sociedade japonesa dá muito valor ao envolvimento das pessoas em grupos, mas não valoriza os indivíduos. Pessoas que não se sentem à vontade para se envolver com atividades sociais se sentem inúteis, desprezadas pela sociedade.

 

Saito disse que em países com forte senso de individualismo como os EUA ou a Inglaterra, onde é incomum que os filhos adultos vivam com seus pais, o problema parece menor. Mas há muitos jovens sem-teto nesses países, que também vivem um tipo de isolamento social.

 

Saito aponta que a solução para esse problema deve partir das famílias dos reclusos. Uma atitude que estimule o hikikomori a buscar mais independência pode dar resultado, mesmo que isso signifique negar o conforto do lar para uma pessoa assustada com o mundo. Os grupos de ajuda também estão se multiplicando no Japão e outros países da região. Segundo Saito, se os pais forem firmes e decididos a ajudar, o hikikomori pode romper gradualmente seu isolamento e recuperar o contato com a sociedade exterior.

 

Como disse anteriormente, quando nossa atenção volta-se para alguém próximo damos maior importância para o fato, por pensar que o problema esteja longe nos dá a falsa impressão de que aqui não chegara, no entanto quando alguém que queremos bem sofre passamos a admitir a existência deste problema social, passamos a observar com mais atenção em nosso entorno, começamos a lembrar de passagens doloridas de nossos amigos, geralmente o que podemos fazer é não dar pitaco furado na dor do outro, a não ser orientar a buscar ajuda profissional de quem realmente entende e que o faça quanto antes, os quadros de isolamento levam a depressão e aos limites humanos que são trágicos, todo tempo perdido é um minuto a mais de dor e tristeza.

 

Precisamos ter mais empatia, menos números estatísticos e mais afeto.

 

Fontes:

Wikipédia

https://jornaltribuna.com.br/2022/09/os-eremitas-do-seculo-21/