O
livro “A Profissão de Sociológo: Preliminares epistemológicas” da 3ª edição do
livro de Bourdieu, Chamboredon e Passeron, não é um livro para leitura na forma
simples e corrida, mas sim para uma leitura reflexiva, na forma de um passo de
cada vez, num indo e vindo, dialogando com o texto, como em toda discussão
conceitual e interpretativa, inclusive nos dando ao direito de explorar invadindo
um novo espaço levando conosco toda uma carga de conhecimentos conquistados,
assimilada ao longo de minhas experiências e estudos das outras ciências, porém
é importante saber de antemão que se entrando numa nova casa denominada por
sociologia.
A
leitura leva-nos a refletir acerca das práticas de vigilância focadas nas
operações conceituais e metodológicas voltados a tentar sanar os entraves
epistemológicos que acabam criando dificuldades na construção científica.
Dentre
paradigmas da sociologia como em geral, há contrariedades e diferenças entre as
correntes na pluralidade e singularidades e, ainda mais se tratando da
Sociologia uma nova ciência (já não tão novinha assim, pois surgiu no século XIX
como disciplina científica) abrindo espaço dentro do mundo científico, enfrentando
desafios pertinentes a sociologia contemporânea e como jovem ciência encarando
os desafios inerentes do que é novo em princípio é rejeitado, principalmente
quando há questionamento dos velhos paradigmas, paradigmas que procuram
explicar a realidade a seu tempo com o conhecimento valido na sua época.
A
realidade estudada e explicada pela visão da sociologia, com seus respectivos
instrumentos reconfiguram o conhecimento sociológico a partir de instrumentos
que darão validade capazes de conferir credibilidade a jovem ciência, com
objetividade reduzindo e superando os obstáculos epistemológicos, isto é
construído a partir de reflexão e vigilância sobre as verdades universais e os
relativismos.
A
conquista do espaço no mundo das ciências e, seu relevo junto a sociedade
contemporânea ocorre e ocorreu gradualmente, a conquista deste espaço vai além
dela própria, pois é a conquista da própria consciência que se da sua
importância e, assim o reconhecimento se torna necessária, resultando num maior
reconhecimento capazes de transformar a vida social das populações.
Um ponto muito importante levantado a partir da reflexão é que as
pessoas falam palavras muitas vezes sem o nexo devido, sua fala carregada de
intenção e imagens, porem com outro sentido epistemológico, a lógica da fala
interpretada antes de falada tenta extrair de expressões típicas e muitas vezes
até banais, os paradigmas construídos na linguagem comum, e a verdade não é
coisa isolada, única e individual, a comunicação se valida através daquilo que
é entendido pelo outro a partir daquilo que é dito.
Na linguagem comum e em geral em suas ações as pessoas desconhecem que são
motivadas inconscientemente, quando a consciência surge os argumentos
aparentemente racionais tentam justificar de maneira lógica decisões
tomadas por impulso sem maneira lógica, como por exemplo um empresário pode
contratar funcionários levando em conta aspectos irracionais ou até numa
relação pessoal podemos ter afinidade ou antipatia gratuita por alguém, sem
aparentemente ter qualquer motivo, é o inconsciente funcionando.
Somos alvo constante da mídia, os comerciais de TV manipulam a vontade a
partir de objetos de desejo universal ou dirigida a persuasão de um grupo
especifico, no entanto, o verdadeiro objeto são aqueles desejantes ou não, que
inconscientemente despertarão interesse ou alimentará mais ainda a intenção de
adquirir, e do poder ter.
Sabemos que somos seres desejantes e sabemos que somos manipulados, mesmo
assim a sociedade age inconscientemente, temos as pesquisas que são ferramentas
de trabalho da sociologia, tais pesquisas analisam resultados como por exemplo:
“Num comercial de TV, a venda é realizada ou não nos três ou quatros
segundos iniciais, assim como num anuncio impresso, 75% das decisões acontecem
na leitura do cabeçalho. Numa demonstração promocional, a venda é feita ou não
nos três minutos iniciais”. Estes dados são resultados de estudos feito
por John Caples, “Tested advertising methods, Englewood Cliffs, NJ,
Prentice-HALL.Inc.,1974 “, citados no livro “O Mito do Empreendedor”,
(Editora Saraiva, 1986), de Michael E. Gerber. Estes são exemplos de decisões
que tomamos diariamente sem termos consciência disto.
Outro exemplo é nos anos 70, a Pepsi lançou um ataque competitivo contra
a Coca-Cola, na famosa campanha dos testes cegos. Foram veiculados pela TV,
comerciais em que várias pessoas eram testadas, com vendas nos olhos, para
escolherem o melhor refrigerante entre os dois. Apesar de a Coca-Cola ser a
preferida do público, nos testes com venda nos olhos as pessoas preferiram,
numa proporção de 3 a 2, a Pepsi. Isto é o que se pode chamar de uma decisão
inconsciente.
Outro exemplo muito presente no dia a dia são as entrevistas de empregos que
muitas vezes o recrutador comete erros por se deixar influenciar excessivamente
pela aparência das pessoas e deixar de lado aspectos relevantes de sua
competência profissional, isto não nos causa tanta estranheza, visto que
vivemos numa sociedade dos retoques e filtros fotográficos na busca pela imagem
perfeita. Ele defende que as entrevistas de empregos deveriam acontecer
inicialmente por telefone ou na leitura de currículos e só na reta final,
quando houver apenas dois ou três concorrentes aptos a assumir o cargo, é que
deveria haver a entrevista pessoal, é mais ou menos a utilização da habilidade
do deficiente visual, guiaríamos pelo histórico da experiência, isto é se a experiência
fosse uma das exigências para função e também nos guiaríamos pelas mensagens
contidas na voz do candidato, mas será que com tudo isto não idealizaríamos inconscientemente
a imagem de alguém e na hora do cara a cara a ilusão mental não estaria a
atrapalhar? Como vimos são muitas as teorias, muitas as condicionantes que compõem
o quadro num mundo em constantes mudanças, é crucial tentar escapar a modelos
prontos.
O sociólogo entende que se estamos inclinados a cometer erros
irracionalmente, a maneira de agirmos desta forma não é apenas o resultado da
determinação do acumulado das teorias passadas, sabendo disto o sociólogo rompe
com os paradigmas do discurso epistemológico, que oferecem a todo tempo o risco
de incorrer em modelos prontos. Essa atitude é a forma científica de agir e
implica na submissão dos procedimentos metodológicos à uma razão epistemológica
cética, questionadora e vigilante.
É
questionando a pratica que rompemos com o saber imediato, aquele saber
inconsciente e banal, rompendo com as relações aparentes e independente das
opiniões e intenções do sujeito que o objeto da investigação, cujos
pressupostos foram assimilados inconscientemente.
A tarefa da sociologia é desvendar incansavelmente as
diversas modalidades de atuação das diferentes formas de dominação veladas e dissimuladas
nos diversos mundos sociais, trazendo à tona fatos que estão escondidos sob o
manto da ilusão e das aparências. É necessário, ainda, voltar-se contra a
teoria tradicional e repetitiva, posto que estas, pretensamente universais, porem
superficiais, porque tiram da lógica do senso-comum seu projeto fundamental, e
não mais do estudo cientifico atualizado. Bourdieu
propõe uma teoria do conhecimento sociológico capaz de superar as armadilhas do
objetivismo, determinismo sociológico, do subjetivismo e voluntarismo
individualista.
A sociologia é uma ciência que acaba
incomodando, pois rompe com a tradição, tira o véu do senso comum, criticando
muitas vezes de forma feroz, colocando problemas e trazendo à baila recalques
que são ocultados e escondidos propositadamente, as vezes o sociólogo é acusado
de querer destruir o sistema onde ele mesmo está inserido com suas peculiaridades
e interesses.
O livro é uma ótima introdução aos
conceitos da sociologia, suas reflexões aproximam o leitor ao mundo critico,
elevando a capacidade de melhor enxergar o mundo e os fatos que estão
escondidos nas mais simples ações cotidianas, extraindo o sujeito da posição
que ocupa como apenas um mero reprodutor de informações, o conteúdo é denso,
porém tem uma linguagem que permite um bom entendimento, penso que esta leitura
seja importantíssima se quisermos entender o que seja a profissão do sociólogo.
Fontes:
Bourdieu, Pierre, 1930- A profissão de sociólogo: preliminares
epistemológicas 1 Pierre Bourdieu, Jean Ciaude Chamboredon, Jean-Ciaude
Passeron ; tradução de Guilherme João de Freitas Teixeira. - Petrópolis, RJ: vozes, 1999.
https://administradores.com.br/artigos/decisoes-inconscientes