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quinta-feira, 15 de julho de 2021

O ensino remoto, a escola e a família em tempo de confinamento

O estar em casa neste período de pandemia estabeleceu um novo tipo de relacionamentos, desejos e procedimentos, o que queremos de nossos filhos é diferente do que queríamos, os desafios agora são maiores, o contexto alterou nossas coordenadas, se antes o rendimento não era aquele esperado, agora é que não podemos esperar que seja melhor, aquela importância infundada de exigir que nossos filhos superassem os desafios e terem êxito constante não tinha e principalmente agora não tem mais fundamento. Atualmente o mundo não comporta mais este tipo de comportamento e exigência, como pais e professores sabemos que tudo ficou ainda mais complexo, as habilidades e competências o grande mote do atual ensino, o foi e o é o grande mandamento cognitivo, certamente terá prejuízos, o resultado disto tudo se apresentará nas dificuldades em administrar o ensino e no quanto o aluno sairá preparado para enfrentar os desafios no mundo, o futuro já não é mais o mesmo.

Algumas perdas serão imediatamente observadas após este período de confinamento e distanciamento social, o processo educativo tem amplo alcance, dentro deste processo está incluída a formação de identidade, é através da educação escolar, que se iniciam os conflitos do indivíduo que passa para um ambiente sem a presença dos pais, neste período escolar inicia-se uma etapa de relacionamento social e estranhamento, é o início do desenvolvimento e criação de sua identidade, é também um período de perdas, na adolescência os conflitos são maiores pois os adolescentes procuram o rompimento com a dependência familiar, o contato com outros grupos sociais e novos caminhos, são fatores que o alertam para busca de sua própria identidade, seu papel social e autonomia, passados dois anos sem este convívio social, justamente numa fase de amadurecimento biológico as perdas poderão ser causadoras da ampliação dos conflitos dos indivíduos entre outros problemas que ainda serão dimensionados.

Em cada fase relativamente a sua idade e maturidade realizam-se mudanças nas relações interpessoais, vivenciadas dentro do seu grupo para dentro de outro grupo repletas de linguagens próprias com suas concepções e valores, levando em conta as modificações físicas e corporais e mentais conforme seus interesses, e os valores sociais, morais, éticos, políticos, econômicos e até religiosos importantes por serem valores construídos pela sociedade, vivenciados no tempo certo e adequado a cada faixa etária, é bem possível que estes dois anos de distanciamento em vários destes aspectos elencados anteriormente, tenhamos pela frente uma necessidade de avaliação mais acurada e para isto desde já devemos pensar em tipos de avaliações que sinalizem indicadores que possam nortear este ou aquele ponto a ser melhor trabalhado pedagogicamente.

O impacto na educação e a regressão na aprendizagem foram testados e mensurados através das testagens dos alunos atualmente, antes de enfrentarmos o isolamento social a educação já vinha sofrendo com os péssimos resultados e rendimentos, agora o confinamento complicou aumentando ainda mais este sofrimento, temos como ingredientes maximizadores a defasagem e a desigualdade de oportunidades educacionais, isto vale para o mundo todo.

Alguns testes realizados no ensino fundamental com alunos de matemática, apontaram que alunos do 5º ano estão chegando com características similares ao leitor iniciante, tendo desenvolvido procedimentos pertinentes ao do 3º ano fundamental, e isto deixa visível a defasagem de dois anos do percurso educacional, a alfabetização deficitária esta surtindo efeitos no ensino da matemática, estão chegando sem condições de realizar uma simples leitura, quiçá interpretação e simples calculo, esta claro que a interdisciplinaridade é assunto sério, a caminhada educacional é realizada pela composição de disciplinas que dependem uma da outra. 

Para conseguir recuperar este prejuízo educacional, isto é, quando houver uma retomada segura, sabemos de antemão que a retomada por si só já será um grande desafio, as diretrizes precisarão estar focadas na alfabetização, é lá na base, o ponto de nevrálgico que dará condições para todas as demais disciplinas.

A retomada dependerá inicialmente de avaliação do estágio e dificuldades que os alunos se encontram, e é claro que quando se trata de dificuldades cada criança é um sujeito único, sendo necessário analisar de forma muito fina e precisa de cada um, há muitas diferenças para serem levadas em consideração, as observações levarão tempo para apresentarem um diagnóstico apropriado e consequentemente as soluções mais adequadas, já falam até em aumentar em mais um ano de estudo como compensação do tempo perdido.

A diferença também em seus graus, graus como níveis que cada criança esteja posicionada nesta caminhada educacional, devendo levar em conta que cada criança tem e teve grande participação da família em sua alfabetização, a avaliação é fundamental, é através dela que se pode fazer um balanço e uma avaliação adequada de cada um e do todo, falar em estatísticas pode ser muito arriscado, no entanto é um ponto a ser olhado, olha-se o micro e o macro.

Cada professor de cada escola é, e agora mais do que nunca o profissional responsável mais exigido, talvez lhes faltem braços para abraçar tamanho desafio, aos professores ficará este enorme encargo de avaliação de cada criança, a testagem e observação de cada criança exigirá um olhar na singularidade, e obviamente um elenco de proposições e medidas de enfrentamento ao que não foi aprendido e assimilado.

A criança que está em casa está reconstruindo sua experiência do “estar em casa”, esta reconstruindo no sentido de também estar e sentir como na escola, é a reconstrução de um novo contexto onde as crianças estão em casa, mas não estão em férias, sabemos que este é um fator que atrapalha o cognitivo, seu sentimento até agora era de estar em casa era sinônimo de brincadeiras, férias e divertimento, com poucas responsabilidades.

O desafio sempre foi fisgar o interesse e a curiosidade dos alunos, fisgar sua atenção para estabelecer foco, agora precisamos mais do que nunca fisgar o aluno em seu interesse e sua curiosidade dentro de um olhar muito diferente, um olhar de filho estudante.

As aulas remotas e as aulas presenciais estão envolvidas numa rotina diferente muito mais exigente, o público tem e não tem estrutura, estrutura aqui corresponde mais ou menos aos que tem computador, notebook, celular, internet, e quem não tem? Por exemplo quem tem três filhos e um celular, um filho estuda de manhã e dois filhos a tarde em anos diferentes, um assiste à explicação da aula e o outro não, explicação dia sim e dia não, tal situação é motivo de aflição e o engrossar das estatísticas apontando o baixo índice de aproveitamento dos alunos.

Para aqueles alunos que não possuem estrutura tecnológica fica o professor incumbido em preparar o material físico, o material físico elaborado pelo professor é impresso e entregue em mãos para a família, mas e a explicação? Ora, a explicação dependerá de o professor ficar à disposição 24 horas por dia, realmente é quase a escravidão, os pais também entram neste processo, porem nem todos conseguem acompanhar o ritmo, talvez a maioria nem esteja preparada, sem falar que o conteúdo previsto na programação de ensino anual deve ser apresentado e ensinado, é uma verdadeira maratona onde não há vencedor, mas é vida que segue em frente, conteúdo é necessário? Sim, é necessário, sem conteúdo estaremos falando do vazio e do vácuo, por si só já explicita nada haver no vazio.

Outro fator muito importante tanto quanto a educação é a alimentação destas crianças que muitas vezes tinham na merenda a única fonte de alimentação do dia, atualmente algumas prefeituras estão tentando resolver o problema oferecendo kits de alimentação para estas crianças, sabemos que é um paliativo, não conseguem resolver a contento, mas já é alguma coisa.

A responsabilidade de ensino agora é muito maior por parte dos pais, os pais participam deste fisgar do olhar do filho estudante, são os pais que deverão ter o controle entre o brinquedo e o caderno, estabelecer as regras e a disciplina serão as bases para estas crianças que estão em casa, atualmente ouvimos em voz alta a dificuldades da mãe, do pai, da avó, do avô, em conduzir em casa o aprendizado, o cenário de estresse está montado.

Ninguém estava preparado para este tipo de demanda, nem escola, nem família, ao mesmo tempo os protagonistas são estudantes e filhos, filhos estudantes, a educação infantil em ensino remoto, o ensino fundamental, são de fato as etapas de cognição diferentes, e momentos de maturidade cerebral diferentes, eles ainda não dominam o comportamento como um adolescente ou um adulto, é preciso ser pais criança e ao mesmo tempo pais adultos.

O cenário não é o cenário da sala de aula, o cenário é o de casa, a ideia é estou em casa, então estou em férias, até ai é natural, pelo menos era, a experiência é que norteia nossos comportamentos, a maturidade de comportamento da criança nesta na etapa é o de ser de criança, este é um ponto importante para levar em conta para quem está remoto em “sala de aula”, os protagonistas tem ao mesmo tempo o professor e os pais como orientadores.

Agora o caminho é diferente e a caminhada também, agora é tudo diferente, agora talvez os pais também percebam a luta diária do professor em fisgar a atenção e curiosidade dos filhos crianças estudantes.

O cenário agora é e não é o mesmo, é o de casa e sala de aula, o ambiente sim este não mudou, o convívio ficou reduzido aos pais e professores, outras coisas estão ficando para trás como a socialização que a escola proporcionava, agora a criança já não tem, este é outro ponto de estresse que alcança a família e a escola.

A criança também precisa mudar de ambiente como todo ser humano, naturalmente precisamos mudar de foco, precisamos sair da caixa para respirar ares mais frescos, o confinamento nos influencia emocionalmente, este já é um problema sério que poderá trazer sequelas imprevisíveis, a volta as aulas é necessária e urgente, porém ainda dependemos de processo de imunização mais efetivo, a segurança estabeleceu nossos novos níveis de liberdade, os limites da liberdade estão sob vigilâncias, a saúde da escola e família estão ainda mais interligadas de maneira que ambas exercem os rumos uma da outra, ambas se amparam e se completam, numa organicidade estrutural da sociedade.

Precisamos mudar além da mudança do quadro negro para o quadro branco, a mudança já é tardia, são mais de 300 anos de evolução, adeus verticalização, bem vinda a horizontalização, desde o advento da internet a mudança se tornou horizontal, e é através deste olhar que fará sentido o professor contemporâneo para o aluno contemporâneo!

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