Neste vai e vem diário, seja durante a viagem ou na caminhada em direção ao trabalho, do trabalho para universidade ou para casa, no horário do almoço quando estico as pernas e a caminhada ajuda na digestão, são nestes momentos quando observo as coisas, movimentos e as pessoas... Se você nestas idas e vindas, sem estar com algum fone de ouvidos distraído com musicas ou conectado ao outros aparatos alienantes, conseguirá perceber as coisas, as pessoas, a movimentação ao seu redor, estará com seus “outros olhos” funcionando, tal como uma parabólica captando os sinais.
Já perceberam como tem moradores de rua sob as marquises? Como tem doente mental circulando? Como tem seres humanos semelhantes a nós, maltrapilhos, sujos, murmurando sons que pareciam palavras ditas por humanos, que caminham como humanos? Como tem seres humanos que parecem muito com “nós” seres humanos, caminhando nas mesmas ruas, calçadas, respirando o mesmo ar, sob o mesmo céu, parecem até seres humanos...
Num destes dias, uma imagem me chocou mais, ao ver um menino comendo com as mãozinhas sujas, utilizando a mão em forma de colher, levava a boca a mãozinha cheia de arroz e macarrão, saboreando aquilo como o manjar dos deuses, imediatamente tal imagem me remeteu a cenas do filme “iIlha da Flores”, depois que assisti tal filme, confesso nunca mais esqueci.
Busquei uma das frases do filme Ilha das Flores que compartilho:
“Os seres humanos são animais mamíferos, bípedes, que se distinguem dos outros mamíferos, como a baleia, ou bípedes, como a galinha principalmente por duas características: o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor. O telencéfalo altamente desenvolvido permite aos seres humanos armazenar informações, relacioná-las, processá-las e entendê-las. O polegar opositor permite aos seres humanos o movimento de pinça dos dedos o que, por sua vez, permite a manipulação de precisão.”
(Trecho extraído do filme: Ilha das Flores)
Confesso, a cena para mim é sempre chocante, o que para muitos, diria até para a maioria, a cena e tão comum e banalizada que vêem sem ver, olham para aquele ser como um animal de outra espécie.
Me pergunto: O que é um ser humano? fui até a Wikipédia buscar alguma definição, gosto bastante da Wikipédia, pois é lá onde atualmente as pessoas procuram o sentido das coisas, e assim quase utilizam a mesma linguagem, digo quase pois comunicação não é o que entendemos, mas o que o outro entende.
Definição:
Ser Humano: Um humano, ser humano, pessoa, gente ou homem é um animal membro da espécie de primata bípede Homo sapiens ("homem sábio", em latim), pertencente ao género Homo, família Hominidae.[1][2] Os membros dessa espécie têm um cérebro altamente desenvolvido, com inúmeras capacidades como o raciocínio abstrato, a linguagem, a introspecção e a resolução de problemas. Esta capacidade mental, associada a um corpo ereto possibilitaram o uso dos braços para manipular objetos, fator que permitiu aos humanos a criação e a utilização de ferramentas para alterar o ambiente a sua volta mais do que qualquer outra espécie de ser vivo.
Pois então, diante desta definição, ficamos deslumbrados com a capacidade dos seres humanos, que aparentemente, somos todos iguais.
Digo aparentemente porque ao vermos outro ser humano buscando alimento dentro de uma lata de lixo, logo pensamos: como ele pode perder os mínimos critérios e atributos que nos diferencia dos demais animais?. A resposta, a questão é que aquele ser que busca alimento na lata de lixo, ele esta buscando sobrevivência. Dada a fragilidade do ser humano, é o alimento a exigência primária para lhe manter vivo.
Na busca constante pelo alimento, percebe-se o aniquilamento dos demais atributos. Socialmente se relaciona com os demais na mesma condição, numa disputa diária, vê-se excluído de condições sociais dignas, sua fragilidade é estampada no alheamento social, inclusive ambiental, criando um ambiente dentro de outro ambiente, este ultimo vivendo daquilo que sobra do outro.
Na Wikipédia busco mais uma vez significação para manter a mesma linguagem e assim conseguir me comunicar. A maioria dos primatas superiores, os seres humanos são sociais por natureza, sendo particularmente hábeis em utilizar sistemas de comunicação, principalmente verbal, gestual e escrita para se expressar, trocar ideias e se organizar. Os humanos criaram complexas estruturas sociais compostas de muitos grupos cooperantes e concorrentes, de famílias até nações. As interações sociais entre os humanos criaram uma variedade extremamente grande de tradições, rituais, normas sociais e éticas, leis e valores, que em conjunto formam a base da sociedade humana. A cultura humana é marcada pelo apreço pela beleza e estética o que, combinado com o desejo de expressão, levou a inovações como a arte, a escrita, a literatura e a música.
O homem é um Animal Racional e Social por natureza, mas aquela espécie que cata alimento na lixeira não parece ser racional e nem social.
Como um ser humano que divide o mesmo meio ambiente, con-vive, e se relaciona diariamente, suportam viver e con-viver com seu semelhante sob tais condições? A questão é também se, quem olha com olhar banalizado é racional?, ou menos racional do que aquele que sobrevive com os restos do outro ser socialmente superior?
Em uma entrevista as pessoas que vivem nas ruas, foi-lhes perguntado por que viviam assim? Se tinham família? E se tinham porque não voltavam para sua casa? Algumas respostas foram impressionantes: “...não volto, porque lá em casa minha família briga muito e termino ficando louco...”. “...não volto porque meu pai bate muito em mim e na minha mãe, então sai de casa, aqui na rua tenho meus amigos, e estou livre...”. “...minha família não me quer lá, porque uso drogas e estava roubando tudo de casa para vender e comprar drogas...”
Somos do tipo de ser ou criatura que faz perguntas aos outros e a si mesmo. Penso que utilizar a palavra “ser” é forte demais para aquelas criaturas que se alimentam do lixo. Ser quer dizer existir e ser reconhecido pelo outro como igual, e o catador de alimento não é reconhecido como o igual, pois é criatura e não é “ser”.
Fico pensando se a banalização das atitudes contemporâneas seriam atos semelhantes ao utilizado no nazismo. Estava lendo o livro Bioética Fundamental, do Dr. Azevedo M. A. O, e de lá resgatei dois trechos:
“...,em julho de 1933, foi proclamada na Alemanha a lei para prevenção da progenia de defeitos hereditários, lei que permitia a esterilização compulsória em casos de defeitos mentais congênitos, esquizofrenia, psicose maníaco-depressiva, epilepsia hereditária e alcoolismo severo. Na primavera de 1937, uma decisão foi tomada para que todas as crianças de cor fossem esterilizadas. Em 1938, a eutanásia por inanição já era praticada nos hospitais psiquiátricos. Note-se que esses fatos ocorreram antes do inicio, em 1939, da Segunda Guerra Mundial com a invasão da Polônia por Hitler....”.
Não foi somente na Alemanha, ainda no mesmo livro do Dr. Azevedo: “...Nos Estados Unidos, por exemplo, juízes já haviam aceitado a esterilização de deficientes mentais, fato denunciado inclusive como argumento de defesa dos juízes nazistas durante os julgamentos ocorridos em Nuremberg. Ou seja, não era somente na Alemanha que havia tratamento desumano de doentes mentais, deficientes físicos e indivíduos de outras raças e credos”.
A banalização dos olhares e atitudes não seria o mesmo que ver nas criaturas catadoras de alimentos, uma criatura diferente, apropriada para experimentos daquela natureza?.
O “Homo sapiens, como espécie, tem como característica o desejo de entender e influenciar o ambiente à sua volta, procurando explicar e manipular os fenômenos naturais através da filosofia, artes, ciências, mitologia e da religião. Esta curiosidade natural levou ao desenvolvimento de ferramentas e habilidades avançadas. O ser humano é a única espécie conhecida capaz de criar o fogo, cozinhar seus alimentos, vestir-se, além de utilizar várias outras tecnologias. Os humanos passam suas habilidades e conhecimentos para as próximas gerações e, portanto, são considerados dependentes da cultura.”
Se o Homo sapiens é tudo isto, como entender o distanciamento entre os seres humanos, e aceitar que pessoas sobrevivam desta maneira sem se incomodar? Afinal é um ser humano ou humanóide?
Utilizamos aparatos como ferramentas de distanciamento deste mundo, buscamos um mundo, outro que não seja este, onde não precisamos estar presentes na sua integralidade, sem troca de olhares, apenas lendo palavras escritas em alguma tela de LCD, ou no Maximo no embalar de musicas de celulares. Dêem uma olhada em seu entorno contem quantas pessoas estão com celular na mão, brincando com joguinhos ou ouvindo alguma musica com seu suspeito gosto eclético.
Na verdade estamos nos transformando em aparatos que estão ligados a celulares, aumentando distanciamento do significado da palavra “ser humano”. Faço minhas as palavras de Nietzsche, entendendo por decadência tudo aquilo que escraviza o pensamento, e a tecnologia com seus aparatos esta nos envolvendo de tal maneira, que não vivemos sem eles e tornando-nos escravos e suas extensões biônicas.