
Como andam suas metáforas? Como você anda?
Quem
usa metáfora? A maioria das pessoas usam metáforas várias vezes ao dia e é
quase impossível nos comunicarmos sem elas!
Metáfora
é a figura de linguagem que usamos e encontramos em toda parte, geralmente a
utilizamos várias vezes ao dia, elas fazem parte de nosso cotidiano na escrita
e na fala, é uma forma que o ser humano inventou para se comunicar com maior
eloquência, tanto para aqueles que leem e nos ouvem, sua utilização é tão
presente que é praticamente impossível de nos comunicarmos sem o uso delas.
Aprendemos
no cotidiano a usar metáforas, elas carregam uma mensagem como símbolos
pessoais, nos ajudam a ler e entender nossa própria simbologia. As nossas
metáforas permitem que nos conheçamos e entendamos nossa vida de uma maneira
diferente, principalmente quando usamos esta ou aquela metáfora mais constantemente,
inclusive elas podem indicar o momento que se está vivendo.
Perceba
a riqueza das palavras na seguinte declaração:
"A
minha raiva é como dançar com um tigre. Eu posso enxergá-la toda agora, a sala,
o lustre, ouvir a música, sentir meu coração batendo enquanto nós rodopiamos
entre os outros casais no salão de baile... Eu estou no limiar entre a vida e a
morte."
A
metáfora é indispensável, ela consegue resumir muitos sentimentos e emoções em
tempo real, num piscar de olhos é como uma fotografia. Não podemos nos
comunicar sem metáfora, até nossos pensamentos são carregados com elas, elas
são parte da evolução da consciência humana, estão presente praticamente
em tudo, até mesmo nas imagens e na arte como representação abstrata do mundo
visto com os “olhos do coração”.
A
metáfora é tão fundamental para a nossa maneira de pensar e de falar que
somente as mais óbvias é que são registradas pela nossa consciência:
Eu te vejo com os olhos do meu coração.
Eu estou sempre dando murro em ponta de
faca.
Eu carrego o mundo nos meus ombros.
Eu vejo uma luz no fim do túnel.
Essas
expressões são obviamente metafóricas, simbólicas e representacionais. Nós
sabemos que na realidade o coração não tem olhos, não existe nenhuma faca, que
o locutor não se transformou num Atlas, e que ele de fato não está num túnel.
Pelo contrário. Nós temos um mecanismo inato que registra a natureza figurativa
dessas expressões em nossa mente e as aceita simbolizando uma experiência mais do que a
experiência em si, revelam por sua vez a forma com que vemos as situações e
como expressamos nosso entendimento, sendo ela boa por sua capacidade de
iluminar o emprego da linguagem, a claridade que reporta pode ser um fim em si
mesmo.
Nós
sabemos a priori e intuitivamente que no dia a dia, as coisas e os comportamentos
(o coração, a faca, o murro, os ombros, o mundo, uma luz e o túnel) estão sendo
usados para representar outras experiências: o carinho, a falta de progresso, a
excessiva responsabilidade, e achar que ainda tem esperança.
As
metáforas evocam abundantes imagens e a percepção do sentido do que está sendo
descrito de forma pessoal ou coletiva. Elas podem expressar, com muita nitidez,
uma única ideia ou uma experiência de vida. Apesar de que muitos linguistas
costumam rejeitá-las como "meramente figurativas", neste caso
embora entendamos suas particularidades, elas hoje são aceitas como uma
descrição altamente correta de percepção.
Atualmente percebemos o deslocamento da
metáfora, de uma posição exclusiva da linguagem para o pensamento seguido da
ação, ela faz parte da construção sócio-cognitiva daquilo que entendemos por realidade
do cotidiano.
a metáfora está infiltrada na vida cotidiana, não somente na
linguagem, mas também no pensamento e na ação. Nosso sistema conceptual comum, em
termos do qual não só pensamos, mas também agimos, é metafórico por natureza.
(LAKOFF; JOHNSON (1980 [2002], p. 45)
Quando
falamos sobre nós, nossos problemas, nossas emoções, nossos desejos, nossos
relacionamentos – aquelas coisas mais importantes para nós – é ainda mais
provável que façamos uso da metáfora para nos ajudar a descrever com eloquência
a profundidade e a complexidade da nossa experiência pessoal.
Jung
compreendeu e assim conceituou que ao utilizarmos as narrativas míticas e metáforas
a realidade do indivíduo é ampliada, de modo, que o indivíduo se identifica com
o aspecto coletivo, de tal forma, que o corpo/psique é integrado na dinâmica, esse
processo consiste em pensar que todas as narrativas simbólicas que nos tocam são metáforas
de nossos processos profundos que ocorrem em nosso psiquismo.
As meditações criam um vendaval em nós...
Minha mente em seu alvoroço me fez cavalgar
o vento...
Se você não sabe como remar,
mudar de barco não vai ajudar.
Confúcio,
dizia: “Você não pode mudar o vento, mas pode ajustar as velas do barco
para chegar onde quer”.
Vejamos
outros exemplos:
Uma âncora nunca deve ser lançada quando tivermos
nossas velas içadas, embolsadas pelo vento, este é um dilema, nosso eterno
conflito de agir, o medo e a coragem. A dúvida e a certeza, que constantemente
nos acompanham.
Aquele
rapaz é um “gato”. – A metáfora ocorre
porque implicitamente o rapaz é comparado a um gato. Quer dizer que é
encantador, fofinho, bonito, etc.
Ela
me encarou e seu olhar era “pedra”. – A dureza e rigidez da
pedra está sendo atribuída ao olhar. Podemos observar que a palavra pedra está
sendo usada de forma figurativa e não no sentido literal da palavra.
Aquela
menina é uma “flor”. – Subtende-se que
a menina é meiga, bonita, cheirosa, delicada. Ou seja, possui características
de flor. Mas, sabemos que aqui o vocábulo “flor” não se refere ao órgão de
reprodução de uma planta.
Esta questão é apenas a” ponta do iceberg”. (Quer
dizer que a questão é pequena diante de outras.)
Ela é uma “formiga” para doces.
(Quer dizer que ela adora doces como se fosse formiga)
Onde há fumaça, há fogo. (Indica que, quando a pessoa desconfia de algo ou alguém por ter sinais, realmente há motivo para tal desconfiança.)
Na metáfora Remédio Infalível, percebemos
a inocência, ignorância, espertezas e desejo de justiça com uso das
próprias mãos, tudo isso está presente na conduta humana:
Remédio
Infalível
Um vendedor ambulante percorria os povoados
oferecendo remédio contra coice de burro. Instalou-se numa pracinha, junto à
capela, e começou a gritar com aquela habilidade própria dos charlatões:
- Alô, pessoal! Ouvi contar que aqui há muito burro
xucro. É só agente passar perto e já vem o coice. Mas tenho aqui um remédio
infalível. Querem experimentar?
Os curiosos se juntavam. Então ele mostrava um
pacotinho bem fechado, dizendo:
- Cada pacotinho desses contém o remédio. Cura quem
levou o coice e previne contra coices futuros. O pacotinho custa apenas ... E
dava o preço de um, de dois, de três pacotes, sempre com o desconto de praxe.
Mas, cuidado, perde o efeito.
Muitos roceiros compraram o tal remédio. Chegando
às suas casas, abriram curiosamente o embrulho e encontraram dentro três metros
de barbante e o conselho por escrito:
"Para evitar coice de burro, basta ficar longe
do animal numa distância correspondente ao comprimento deste barbante."
Desapontados e ludibriados, foram atrás do vendedor para lhe aplicar uma boa
surra. Mas o espertalhão já havia sumido da praça.
A metáfora presente na poesia e na
música
Wittgenstein
(filósofo austríaco naturalizado britânico – 1889/1951), em seu Tractatus
Logico-Philosophicus (TLP), tinha o objetivo imediato de explicar como a
linguagem consegue representar o mundo, mais especificamente, pretendeu mostrar
como uma proposição é capaz de representar um estado de coisas real ou
possível. Em sua filosofia não procurou criar uma
nova linguagem; antes, lutou com a linguagem a fim de superar os erros decorrentes
do seu mau uso. No máximo, o que Wittgenstein fez foi criar novos símiles,
imaginar novas formas de vida, utilizar conceitos fictícios, assim como a
poesia faz e utiliza, com o objetivo de tornar a filosofia uma atividade
terapêutica libertadora. Para ele as metáforas e, mais amplamente, as ligações
analógicas terão um papel importante na reflexão de Wittgenstein após o Tractatus”
e em sua filosofia.
Na
poesia, segundo as considerações de Wittgenstein, cada expressão precisa ser
colocada cuidadosamente e artisticamente no local adequado, é isso o que
garante a beleza e a integridade do poema. Da mesma forma, considera que em
filosofia uma boa metáfora ou uma expressão correta pode ser mais importante do
que a formulação de uma hipótese ou de uma teoria. Uma boa analogia gera como consequência
a satisfação, enquanto que uma teoria ou hipótese precisa passar pela
verificação: “E se a metáfora se revela boa por sua capacidade de iluminar o
emprego da linguagem, a claridade que reporta pode ser um fim em si mesmo”.
Além do mais, uma teoria nunca é definitiva, já uma metáfora subsiste no tempo,
gerando um efeito libertador.
Tomemos como
exemplo alguns versos do poema de Vinícius de Morais (1913 – 1980) - “Rosa de
Hiroshima”, o poema também virou música na voz de Ney Matogrosso (https://www.youtube.com/watch?v=Tt_goIGovGs)
Rosa de Hiroshima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada
No
poema A rosa de Hiroshima, de Vinicius de Moraes, a “rosa” a que o eu lírico
se refere é uma metáfora para a famigerada bomba atômica, ou seja, ela é
comparada a uma flor maravilhosa, a rosa símbolo da paixão. No entanto, em
nenhum momento, a bomba é explicitamente mencionada no poema.
Na poesia, Vinícius
usa muitas metáforas. Uma que chama muito a atenção é a palavra “rosa” usada no
lugar de “bomba”. O texto nos induz a comparar a bomba jogada sobre Hiroshima
com uma rosa, neste caso uma representação de fortíssimo apelo emocional. A palavra "rosa" ainda foi objeto de discussão na idade média na querela dos universais, a questão é
colocada de modo quase poético no problema do nome da rosa. o nome da rosa,
mesmo que não houvessem mais rosas, significaria alguma coisa em nossas mentes,
ou a própria proposição "não existem rosas" deixaria de fazer
sentido.

A
rosa que é uma flor linda e maravilhosa, que se abre em muitas pétalas, com suas folhas ovaladas ou planas e exala
perfume inebriante. A bomba também se abriu ao explodir, e a imagem lembrou a
de uma rosa a desabrochar. Porém exalou radioatividade, tirou vidas no presente
e no futuro, pois seu alcance espalhou o mal contaminando as gerações
vindouras, representou a crueldade estadunidense e a maneira com que veem os
não “americanos”.
Outra
comparação é se refletirmos sobre a difusão e a expansão que os dois termos
podem denotar. O cheiro da rosa é capaz de difundir-se exalando perfume e
podendo ser projetado por determinadas distâncias. A bomba de Hiroshima,
difundiu um mal que se projetou por longas distâncias e até mesmo através do
tempo, a história registrou o ato genocida da crueldade humana.
Também
observamos que o poeta chama a bomba de “rosa hereditária”. A
expressão é metafórica e talvez se refira às consequências causadas. O
acontecido acarretou um mal que se perpetuou, que passou de geração para
geração, de pai para filho. É uma maneira de não nos deixar esquecer do
câncer disseminado pelo alto poder da radiação e principalmente nosso olhar
desconfiado aos interesses da nação cruel que quis e quer amedrontar o mundo, são volúveis, pois conforme o partido que assume a
presidência ora tem uma visão em defesa da natureza, e ora tem interesses
puramente capitalistas, basta comparar as contradições nos discursos e nos atos
dos últimos governos.
Uma rosa é cor de rosa, vermelha, branca e amarela; é rosa dos ventos que representa as direções que sopram os
diferentes ventos; é Rosa de Saron uma expressão bíblica que se encontra no Antigo Testamento em Cântico dos Cântico; Rosa do deserto uma flor do deserto, enfim uma rosa esta presente na vida da terra sob muitas formas e sentidos, na metáfora ela adquiriu a beleza sombria da morte ceifadora do presente e futuro, um símbolo do segredo.
Saber
ler e entender uma metáfora é a capacidade que praticamente todas as pessoas
possuem, no entanto, entender o que vai nas entrelinhas é para poucos, alguns
até confundem com a catacrese, que também é uma figura de linguagem,
mas é utilizada para denominar um elemento quando não há um termo específico
que o conceitue. Ela é diferente da metáfora, que tem característica
subjetiva e momentânea. Um apelido por exemplo, pode distinguir um ou um grupo
de pessoas e nele estar carregado de informações, basta ter a capacidade de
analisar.
Como
vimos a Metáfora é uma palavra que está sendo empregada fora de
seu sentido concreto, real, literal. Trata-se de uma comparação implícita,
subentendida no texto. Se caracteriza por comparar sem que sejam
empregados termos comparativos. As nossas metáforas e símbolos pessoais nos
ajudam a compreender o mundo, inclusive em seus conflitos políticos.
Elas
dão forma àqueles aspectos da nossa vida que são os mais místicos – nossos
problemas e suas soluções, nossos medos e desejos, nossas doenças e saúde,
nossa pobreza e riqueza, e a nossa capacidade
de amar e ser amado.
Quando
são dadas formas representacionais a essas experiências, e elas são vistas pelo
lado simbólico, deixam de ser efêmeras, aí então se tornam acessíveis para a
exploração e a transformação pessoal, nelas são cultivadas nossas emoções com raízes
mais profundas.
Fontes:
https://metaforas.com.br/artigo/a-magia-da-metafora.htm
https://metaforas.com.br/1998-12-31/remedio-infalivel.htm
https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/intuitio/article/view/18613/13537
Jung, Carl, O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeiro. 2ª. Ed. Nova
Fronteira, 2008.
Lakoff, George & Johnson, Mark, Metáforas da Vida Cotidiana .
James Lawley e Penny Tompkins são psicoterapeutas
registrados na Grã Bretanha pela United Kingdom Council for Psychotherapy
(UKCP). Eles moram em Londres e ensinam no mundo inteiro. São os autores de Metaphors
in Mind: Transformation through Symbolic Modelling. Podem ser contatados
na The Developing Company pelo e-mail info@cleanlanguage.co.uk.
O artigo original "The Magic of Metaphor" está no site www.cleanlanguage.co.uk