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quarta-feira, 7 de julho de 2021

Resenha do livro “O Cortiço” de Aluísio de Azevedo

O romance "O Cortiço" é um romance naturalista publicado em 1890 por Aluísio de Azevedo (1857-1913), a história do romance gira em torno da vida de um cortiço carioca, o cortiço é o personagem principal. Esclarecendo: um cortiço são casas que servem de habitação coletiva de baixa qualidade para população pobre, ou também chamada de casa de cômodos, vulgarmente denominada cabeça de porco.

O autor Aluísio Azevedo nasceu em São Luís, Maranhão em 14 de abril de 1857. Estudou na Academia Imperial de Belas Artes, foi caricaturista, escritor, romancista, contista e até peças de teatro também escreveu. Foi ele que inaugurou o naturalismo no Brasil. Suas principais obras são: O Cortiço, Casa de pensão e O mulato.

O cortiço da obra de fato existiu e foi objeto de inspiração do autor, o cortiço foi construído no século XIX, estava localizado próximo a entrada do atual morro da providência no Rio de Janeiro, nesta época o Rio de janeiro era a sede do império e se encaminhava para a modernidade. O romance acompanha o crescimento urbano da época, percebe-se a ascensão social de alguns trabalhadores e a pobreza causada por injustiças e exploração do capitalismo, é uma severa crítica social, denunciando os preconceitos raciais e a exploração do homem pelo homem.

O Cortiço é como um organismo vivo, ele é humanizado, ele ao abrir as portas é como o abrir dos olhos, mostrando haver uma organicidade, pois vemos o coletivo sendo mais valorizado que o individual, é um local de vida e passagem de pessoas pobres oriundas de lugares muito distintos que se misturam e tentam viver seus dramas e suas alegrias, são pessoas de uma classe social pobre enfrentando as necessidades de sobrevivência, são pessoas retratadas de forma miserável vivendo num ambiente miserável, é uma obra de luta, resiliência e injustiça.

O autor escreveu o romance exacerbando os defeitos de cada personagem, a intenção era de trazer à tona os problemas sociais da época, ele brilhantemente utilizou o naturalismo exacerbado generalizando casos excepcionais psicofisiológicamente ou de miséria irremediável, a linguagem em alguns momentos choca pelo realismo ainda tão atual.

O cortiço faz parte do movimento naturalista, naturalismo é um movimento que veio da Europa, no Brasil este é o grande livro do naturalismo brasileiro, penso que realmente haja uma exacerbação, porem a exacerbação foi necessária para fazer uma grande crítica social e ao capitalismo, quem leu este livro como obrigação para fins de vestibular ou Enem, provavelmente leu apenas os resumos orientados para este fim, então não leu a obra, só viu do que se tratava, agora quando se lê mais velho ou se lê atentamente, pega gosto e quer ler sem parar, e é quando se tem o verdadeiro entendimento da mensagem, vemos o Brasil do século XIX muito parecido com o Brasil do século XXI, o que mudou foi só a tecnologia, as mazelas são as mesmas, ou pior!

Conforme a concepção naturalista (uma tendência do realismo), o ser humano se torna o que o meio determina, o ser humano mais forte é o que sobrevive, a ciência é o meio mais importante e seguro para a obtenção de conhecimento, os valores burgueses são criticados e o comunismo é defendido, enfim, a obra também é uma representação de idéias.

Os personagens que viviam em habitações de baixa qualidade são animalizados, obviamente ligados a características animais, nesta obra há uma inversão, enquanto o cortiço recebe características humanas, os personagens são zoomorfizados, ou seja, retratados simplesmente como animais, comparando moradores a vermes em dejetos, realmente é chocante como o autor retira o véu da prepotência e da suposta superioridade.

Há uma retratação do brasileiro como um ser que é inferior aos portugueses, os brasileiros são retratados como preguiçosos, vagabundos, inferiores, cheios de vícios, os moradores do cortiço são mulheres da vida, mendigos, bandidos aproveitadores e para amenizar isto tudo são alegres, tudo retratado como um microcosmos. A obra também e principalmente esta permeada pelo determinismo, são pessoas vivendo num ambiente miserável que terão um fim miserável. Inclusive aquele meio contamina até as pessoas que eram de bem, tal qual o Jeronimo que mudou de um bom chefe de família e trabalhador, passando para ser um assassino, abandonando a família, pois segundo a teoria do determinismo o meio, a raça e a história determinam o caráter das pessoas. Percebe-se que muitos personagens da obra são determinados pelo meio e se entregam aos vícios, ao adultério e à ganância.

Nesta obra, os portugueses são retratados como superiores, sérios, ambiciosos, esforçados, querem acumular dinheiro, mas também são tristes. Já os brasileiros retratados como sensuais, preguiçosos e alegres. O Brasil é descrito com exuberância na paisagem natural, mas também apresenta paisagens que propiciam a decadência do ser humano, como o cortiço e seus habitantes que formam a comunidade, por exemplo. O termo abrasileirar é um termo usado de maneira negativa, pejorativa, pois os portugueses que foram abrasileirados significaram terem decaidos moralmente, mesmo as pessoas de boa intenção, como por exemplo o personagem chamado Jerônimo que se apaixonou por Rita Baiana, ele era um português correto, mas por ter vindo morar no Brasil e especificamente no cortiço, tornou-se vagabundo, preguiçoso, cachaceiro e até assassino.

O romance retrata um ambiente de promiscuidade, capaz de contaminar quem se aproximar dele. Sob esse cenário, o leitor acompanha a ascensão econômica e social do inescrupuloso João Romão, que é um português, malandro e desonesto, ficou assim vendo que trabalhando honestamente não conseguia prosperar, resolveu atalhar por caminhos desonestos, desleais e desumanos.

Os personagens principais do “O Cortiço” são:

João Romão: Malandro desonesto. Trata-se de um português que veio para o Brasil e conseguiu certa prosperidade explorando, e se aproveitando deles, e até matando.

Bertoleza: Escrava quitandeira que morava com João Romão e que foi enganada por ele, representa o ápice da exploração e abuso que um ser humano é submetido.

Miranda: Principal opositor a João Romão, também português. Possuía mais status e era invejado, tornou-se Barão o que João Romão desejava.

Rita Baiana: Representando a típica mulher brasileira na concepção do autor, é a que promovia os sambas no Cortiço e se sensualizava, foi o amor e amante de Jerônimo.

Jerônimo: Trabalhador português que conseguiu emprego na pedreira de João Romão, em princípio era um exemplo de seriedade e honestidade.

Firmo: Mulato inicialmente era amante por Rita Baiana, capoeirista.

Piedade: Mulher de Jerônimo, típica representação europeia.

João Romão, é um português que chega ao Brasil procurando uma vida melhor e acaba se tornando funcionário na venda de outro português. Seu salário quase sempre chegava atrasado e ele vivia na miséria, contudo, o português que era o dono da venda onde Romão trabalhava, resolve voltar definitivamente para Portugal, deixando para ele como forma de pagamento, a própria venda. Ele vê nisso uma oportunidade de crescimento, então como ele era desonesto, e queria ganhar dinheiro a qualquer custo, tomou iniciativas nada recomendáveis, ele conheceu uma escrava chamada Bertoleza e resolveu se aproveitar dela fingindo ajudá-la.

Bertoleza cuidava das vendas de uma quitanda e resolveu confiar cegamente em Romão. Juntos eles trabalharam duramente juntaram dinheiro que fica na guarda dele, e ele com a desculpa de que compraria a alforria dela, fica com tudo o que ela já havia juntado anteriormente, no entanto ele usa o dinheiro dela para outro fim, não comprou a alforria dela, mas comprou um grande terreno onde foram construídas casas (cortiço) para serem alugadas para os pobres.

Então o projeto de João Romão é colocado em pratica é quando surge o cortiço, João Romão com visão de negócios, ambicioso que era, até mesmo comprou uma pedreira próxima ao seu terreno para de lá retirar o material de construção a ser usado nessas casas.

No cortiço viviam mulheres da vida, mendigos, aproveitadores, bandidos e similares, mas também pessoas de bem que foram sendo corrompidas, ou seja, o local era habitado por pessoas de índole má, questionável e também por boas pessoas, era de fato um ambiente muito diversificado.

João Romão também queria obter fama como seu adversário Miranda, ele disputa o título de barão com um burguês que tem um palacete ao lado do cortiço, chamado Miranda, e perde. Após a derrota, a ideia que ele teve foi a de se casar com a filha de Miranda.

As histórias de cada um dos personagens são muito vivas e surpreendentes, cheios de problemas e defeitos, por exemplo à situação de Bertoleza era muito delicada, ela pensava que seu amigo e amante João Romão havia comprado sua alforria, se decepcionou a ponto de tirar a própria vida, pois João Romão já lhe via como um impedimento aos seus interesses, ele denuncia como escrava fugida e ela vivendo no fundo da depressão por sua situação indigna e sem melhores perspectivas, usa a mesma faca que usava para limpar peixes, se mata ao perceber que também havia sido enganada.

Filme disponível no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=USdxKiALLi0

A leitura demonstra a história de personagens que são maus continuam sendo maus, e os que são bons, quando não se corrompem não se dão bem. Percebem alguma semelhança em nossa atualidade?

O livro é realmente uma bela obra e se torna uma leitura obrigatória por sua importância na literatura nacional e internacional, é uma crítica social de extrema relevância.

Fonte: Azevedo, Aluísio. O cortiço. – 3.ed.-Jandira, SP: Principis, 2019