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segunda-feira, 10 de maio de 2021

Zen e a arte de manutenção de motocicletas – Uma investigação sobre valores

 

 

O nome do livro é meio estranho, o subtítulo já o torna mais interessante, o livro foi escrito em 1974, um best-seller, porem em principio o livro foi rejeitado por muitas editoras até que uma editora publicou e ele explodiu surpreendendo a todos, pior para quem negou a edição, se arrependimento matasse...

Para grata surpresa demonstrou ser uma joia da literatura, e principalmente para ser lido neste momento que vivemos, nele podemos nos imaginar com a mochila nas costas viajando estrada afora, ao mesmo tempo que a leitura é leve, ela nos permite ter contato com diálogos muito interessantes entre pai e filho.

O autor é Robert M. Pirsig, filósofo e escritor estadunidense, ele nasceu em 1928, por ser uma criança superdotada com um QI em 170, aos 9 anos foi adiantado em vários graus na escola. Lutou na guerra da Coreia quando aproveitou e viajou ao Japão onde conheceu o Zen budismo, ele passou por muitas situações difíceis inclusive problemas causados pela guerra. Ele retornou para Minnesota e completou o curso de filosofia em 1950. Ele então foi para Banaras Hindu University, na Índia, para aprender sobre a filosofia oriental. Ele também fez filosofia na Universidade de Chicago. Faleceu a pouco tempo, foi em abril de 2017.

Este livro baixei em pdf no site “doceiro”, é lá que tenho baixado livro para ler, embora eu prefira o livro impresso, que leva muitas vantagens, pelo prazer de senti-lo com as mãos, com olhos e se livro novo pelo cheiro de “livro novo”, parece até uma relação muito intima, também penso seja melhor porque nos permite maior concentração, menor cansaço visual e se for antes de dormir melhor ainda, levo para a cama pois facilita o sono.

O livro Zen e a arte de manutenção de motocicletas – Uma investigação sobre valores descreve de forma agradável e leve, como foi a longa viagem de 17 dias de motocicleta que ele fez com o filho, viajando de ponta a ponta dos Estados Unidos. Nessa viagem vão falando da vida e de problemas do cotidiano, há muitos diálogos muito interessantes, diálogos com caráter existencialista, nos faz pensar a respeito das facetas da vida numa visão humanista, onde o humor se mistura com as contingências vivenciais do dia a dia.

Ele conta que durante a viagem houveram necessidades de manutenção e reparação mecânicas da motocicleta, tais necessidades serviram de referências metafóricas que foram narradas de forma simples permitindo vislumbrar que a beleza existe na maneira como vemos o presente e as coisas que acontecem, tudo vale a pena ser intensamente “vividos”, este estado de presença nos reconcilia a nossa natureza e condições pelas quais vivemos. Como por exemplo neste trecho:

 

A esta altura, a ampliação mu é a única coisa que quero lem­brar sobre as ciladas factuais. É hora de falar sobre as ciladas psicomotoras. Este é o universo intelectual mais diretamente rela­cionado ao que acontece com a máquina.

Aqui, a cilada mais frustrante é o problema das ferramen­tas inadequadas. Nada é tão desmoralizante quanto suspender um conserto por falta de ferramentas. Compre boas ferramentas, na medida do possível, que você nunca vai se arrepender. Se qui­ser economizar, consulte sempre os anúncios de jornal. As boas ferramentas geralmente não se desgastam, e as boas ferramentas usadas costumam ser muito melhores do que ferramentas novas, mas medíocres. Examine os catálogos de ferramentas. Você pode aprender muito com eles.

Além das ferramentas ruins, outra grande cilada para o brio são os problemas ambientais. Procure trabalhar sob iluminação adequada. O número de erros que uma boa iluminação pode evitar é impressionante. (pg.322)

Ele faz uma relação e fala da diferença entre viajar de carro e de motocicleta, de motocicleta se vê e sente as “coisas” de maneira completamente diferente se viajasse de carro; de motocicleta a gente sente que faz parte das cenas, estamos não só olhando, estamos presentes, se quiser podemos colocar o pé no chão, ele associa o mundo real ao mundo da motocicleta, o carro ele diz que é o isolamento por trás da janela, e de certa forma estamos isolados do mundo, não temos a mesma percepção e sensação.

Para mim que já tive motocicletas e viajei um pouco, realmente é uma experiência diferenciada, é muito prazeroso, de fato há um contato maior com o mundo, as sensações e emoções permeiam até o espírito da gente, porem todo motociclista sabe faz parte de uma população de grande risco. Justamente este contato direto com o mundo exige do motociclista toda atenção e cuidados tais como fazer varias paradas, aumentar o tempo de cada parada e um conselho que todo motociclista dá e recebe é fazer uma checagem da motocicleta antes de cada viagem, e em cada parada fazer um breve relaxamento de alguns minutos ficando quieto e com os olhos fechados.

Trechos do livro:

Quando a gente passa as férias viajando de moto, vê as coi­sas de um jeito completamente diferente. De carro a gente está sempre confinada, e como já estamos acostumados, nem notamos que tudo que vemos pela janela não passa de mais um programa de televisão. Sentimo-nos como um espectador, a paisagem fica passando monotonamente na tela, fora do nosso alcance.

 

Já na motocicleta, não há limites. Fica-se inteiramente em contato com a paisagem. A gente faz parte da cena, não fica mais só assistindo, e a sensação de estar presente é esmagadora. Aque­le concreto zunindo a uns quinze centímetros da sola dos pés é real, é o chão onde se pisa, está bem ali, tão indistinto devido à velocidade que nem se pode fixar a vista nele; e, no entanto, para tocá-lo basta esticar o pé. A gente nunca se desliga daquilo que está acontecendo.

 

Sua experiência de vida e formação em filosofia oriental foram importantes na reconciliação da construção da forma de ser e estar, onde se conjugam valores ocidentais e valores orientais, o que para a época foi uma obra inovadora que fundia ambas formas de pensar, então percebe-se que o título do livro não é sem sentido. A obra permanece atual e interessante, pois consegue confrontar o ideário ocidental e oriental, inspirar e nos colocar em contato com valores existenciais a todos que lerem.

Fonte:

Pirsig. Robert M. A Arte de Manutenção de Motocicletas – Uma investigação sobre valores. Traduzido por Celina Cardim Cavalcanti; Editora Paz e Terra, Ano 1984

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