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quinta-feira, 29 de agosto de 2024

A Voz na Escuridão

A voz na escuridão é aquele sussurro que vem do fundo do nosso ser, uma espécie de guia silencioso que tenta nos alertar sobre algo que ainda não compreendemos completamente. No cotidiano, essa voz pode se manifestar de várias maneiras: uma sensação de inquietação ao tomar uma decisão, um pressentimento sobre uma pessoa, ou até mesmo um sonho que insiste em retornar, como se tivesse algo importante a dizer.

Imagine uma situação comum: você está prestes a aceitar um novo emprego. No papel, tudo parece perfeito – o salário, os benefícios, a localização. Mas há algo, uma pequena dúvida, que persiste no fundo da sua mente. Essa dúvida é a voz na escuridão. Ela não é barulhenta, não impõe uma resposta imediata, mas sua presença é inegável. Ignorá-la pode parecer a opção mais lógica, afinal, quem quer se preocupar com o que não pode ser explicado? Mas ouvir essa voz pode ser o que impede um erro de se concretizar.

Outro exemplo: você está em uma conversa com amigos, tudo parece normal, mas de repente, uma frase dita por alguém faz seu estômago revirar. Você não consegue identificar o porquê, mas algo dentro de você diz que há mais naquela fala do que parece. Essa é outra manifestação da voz na escuridão, aquele sexto sentido que nos avisa para prestar atenção, mesmo quando a razão nos diz que não há nada ali.

Martin Heidegger, um dos grandes filósofos do século XX, abordou algo semelhante em sua obra. Para ele, a angústia é um estado fundamental do ser humano, um momento em que nos deparamos com o nada, com o desconhecido. Essa angústia é uma forma de a voz na escuridão se manifestar. Ela não nos traz respostas prontas, mas nos coloca diante do abismo, onde somos forçados a encarar o que há de mais profundo em nós mesmos.

Heidegger sugere que essa voz, essa angústia, não deve ser silenciada, mas ouvida e compreendida. É através dela que podemos nos reconectar com nossa própria existência, descobrir quem realmente somos e quais são nossos verdadeiros desejos e medos. No cotidiano, isso pode significar parar de evitar aquelas perguntas incômodas que sempre deixamos para depois, ou dar atenção àquela sensação de que algo não está certo, mesmo quando tudo parece estar em ordem.

A voz na escuridão não é um inimigo, mas um aliado. Ela nos chama a explorar os cantos mais sombrios de nossa psique, a enfrentar o desconhecido e a crescer com isso. O cotidiano nos dá inúmeras oportunidades de ouvi-la, seja em grandes decisões ou em pequenos momentos de desconforto. A escolha de ignorá-la ou segui-la está em nossas mãos, mas talvez, ao ouvi-la, possamos descobrir verdades sobre nós mesmos que nunca imaginaríamos.


quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Simone de Beauvoir: Uma Voz Inflamante do Existencialismo e do Feminismo

 


Simone de Beauvoir, uma das intelectuais mais proeminentes do século XX, deixou uma marca indelével no mundo da filosofia, literatura e feminismo. Sua influência perdura até os dias de hoje, e sua obra continua a inspirar e desafiar pessoas em todo o mundo.

Simone Lucie-Ernestine-Marie Bertrand de Beauvoir nasceu em 9 de janeiro de 1908, em Paris, França. Cresceu em uma família burguesa e teve acesso à educação de alta qualidade desde cedo. Sua jornada intelectual a levou à École Normale Supérieure, onde conheceu o filósofo Jean-Paul Sartre, com quem teve uma ligação profunda e complexa ao longo de suas vidas.

De Beauvoir e Sartre se tornaram figuras centrais do movimento existencialista, uma corrente filosófica que enfatiza a importância da liberdade individual, da responsabilidade e da busca por significado em um mundo aparentemente absurdo. A filosofia existencialista explorava as angústias e dilemas da existência humana, e Simone de Beauvoir contribuiu para essa corrente com sua própria perspectiva única.

A obra de Simone de Beauvoir refletia suas preocupações existenciais e sua busca pela autenticidade. Ela abordou temas como a liberdade, a escolha e a responsabilidade em suas obras filosóficas e literárias. Seu livro "O Segundo Sexo", publicado em 1949, é uma peça seminal que aborda a opressão das mulheres ao longo da história. De Beauvoir argumenta que as mulheres foram historicamente definidas em relação aos homens, em vez de serem consideradas como seres autônomos. Ela explorou como as estruturas sociais e culturais perpetuaram a desigualdade de gênero e lançou as bases para o movimento feminista moderno.

Podemos relacionar algumas das ideias de Beauvoir com discussões contemporâneas sobre o papel das mulheres na religião e na espiritualidade. Ela questionou a forma como as mulheres eram historicamente vistas como "o outro" em relação aos homens, e como essa visão influenciava seu status e papel na sociedade. Ela também explorou as maneiras pelas quais as estruturas patriarcais moldavam a identidade feminina e restringiam o desenvolvimento pleno das mulheres como seres humanos autônomos.

"O Segundo Sexo" é frequentemente descrito como um manifesto feminista. Nele, de Beauvoir analisa a condição das mulheres, suas lutas e aspirações, e argumenta apaixonadamente por uma redefinição das relações de gênero. Sua obra estimulou discussões sobre direitos iguais, autonomia feminina e a necessidade de questionar normas prejudiciais.

Simone de Beauvoir promoveu a ideia de que as mulheres não deveriam ser limitadas por sua biologia ou papéis tradicionais, mas sim capacitadas a buscar suas próprias aspirações intelectuais, profissionais e pessoais. Seu impacto no feminismo ecoa em movimentos contemporâneos que continuam a lutar por igualdade de gênero e empoderamento das mulheres.

“O Segundo Sexo” é uma obra impressionante, Simone de Beauvoir realmente mergulhou fundo na análise da opressão das mulheres ao longo da história. Ela discute como a sociedade construiu a imagem da mulher como "o outro", subordinado ao homem, e como isso moldou nossas percepções e relações. A ideia de "a mulher é feita, não nascida" ressoa profundamente em nós, leitores. Beauvoir argumenta que as diferenças entre os gêneros não são naturais, mas sim construídas social e culturalmente. Ela explora como as mulheres foram historicamente relegadas a um papel secundário, limitando suas oportunidades e liberdades.

É incrível como ela desmonta as justificativas para a opressão das mulheres. A maneira como ela critica a ideia de que as mulheres são "inferiores" ou "menos capazes" é muito persuasiva. Ela argumenta que essas noções são resultado de uma sociedade que perpetua essas crenças para manter o status quo e não podemos esquecer o conceito de "má-fé" que ela discute, onde as mulheres internalizam os papéis que lhes são impostos, acreditando que são naturais. Isso realmente ressoa com a ideia existencialista de autenticidade e liberdade. A "má-fé" é um conceito intrigante. Beauvoir nos desafia a questionar nossas próprias crenças e a reconhecer como a sociedade influencia nossas percepções sobre nós mesmos e os outros.

Essa leitura é uma jornada intensa. A filosofia de Beauvoir continua a ser relevante, especialmente quando vemos os desafios contínuos enfrentados pelas mulheres na sociedade contemporânea. A leitura desta obra é uma nova maneira de vermos, é um ganho de uma nova perspectiva sobre as questões de gênero e uma apreciação mais profunda pelas lutas das mulheres por igualdade. Com certeza quem leu esta obra vai continuar explorando mais obras de Simone de Beauvoir e outros pensadores feministas.

Simone de Beauvoir desafiou as normas sociais, políticas e filosóficas de sua época, deixando um legado profundo e duradouro. Sua contribuição para o existencialismo expandiu os horizontes da filosofia e sua defesa apaixonada pelo feminismo trouxe à tona discussões cruciais sobre desigualdade de gênero e empoderamento feminino. Sua obra ressoa tanto nas salas de aula quanto nas ruas, continuando a inspirar aqueles que buscam compreender a complexidade da existência humana e lutar por um mundo mais justo e igualitário. A voz inflamante de Simone de Beauvoir continua a ecoar, desafiando-nos a questionar, refletir e agir.

Fonte:

Beauvoir, Simone. O Segundo Sexo – Fatos e Mitos – Vol. I. Trad. de Sérgio Milliet. 4ª Ed. Difusão Europeia do Livro. São Paulo, 1970.

­­­­­­­­­­­­­­­­­__________________ O Segundo Sexo – A Experiência Vivida – Vol. II. Trad. de Sérgio Milliet. 2ª Ed. Difusão Europeia do Livro. São Paulo, 1967.

Motta, Alda Britto. Um diálogo com Simone de Beauvoir e outras falas/ Organizado por Alda Britto da Motta, Cecilia Sardenberg e Márcia Gomes. Salvador: NEIM/UFBA, 2000. 338 p. - (Coleção Bahianas; 5)