Pesquisar este blog

Mostrando postagens com marcador feed. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador feed. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 1 de abril de 2025

Existencialismo Digital

A Condenação de Estarmos Conectados

Outro dia, estava rolando infinitamente o feed de uma rede social quando me peguei encarando uma tela vazia. Nada ali parecia real, mas tudo exigia minha atenção. Como um Sísifo digital, eu deslizava o dedo, subia e descia, em busca de algo que nunca se concretizava. Foi quando me ocorreu: será que estamos existindo de forma autêntica no espaço digital, ou apenas simulando presença?

O existencialismo clássico, de Sartre e Heidegger, nos coloca diante da liberdade radical e do peso da existência. "Estamos condenados a ser livres", dizia Sartre, pois não há essência antes da existência. Mas e quando essa existência se dá no meio digital, onde o ser parece fragmentado em múltiplas personas, postagens e narrativas? A liberdade virtual é autêntica ou apenas mais um labirinto sem saída?

Na era digital, a identidade é fluida e altamente performática. Criamos perfis, moldamos imagens, escolhemos quais aspectos de nós mesmos exibir e quais ocultar. Isso ecoa a ideia sartreana de "má-fé", quando nos enganamos sobre quem somos para evitar o peso da liberdade. Na internet, a má-fé se torna um algoritmo: curamos nossa própria existência para o olhar dos outros, ao ponto de não sabermos mais onde termina a performance e começa o ser.

Heidegger nos alertava sobre o perigo do "se" impessoal, essa força invisível que nos faz agir conforme "o que se faz". No mundo digital, esse "se" se manifesta na necessidade de engajamento: postamos não porque queremos, mas porque é o que se espera; reagimos para manter a relevância; participamos do fluxo incessante de informações para não sermos esquecidos. Assim, a angústia existencial ganha um novo formato: não apenas tememos a morte, mas também o esquecimento algorítmico.

O existencialismo digital também nos leva a questionar o sentido do real. Se "a existência precede a essência", mas nosso ser está diluído em redes que operam por padrões, preferências e manipulação de dados, quem realmente somos? E mais: a liberdade que Sartre tanto defendeu ainda existe quando nossas escolhas são moldadas por sugestões personalizadas e bolhas de informação?

A solução não é rejeitar a existência digital, mas assumir conscientemente seu peso. Se estamos condenados a ser digitais, que ao menos possamos ser autênticos nisso. Que escolhamos nosso ser para além das métricas e do desejo de validação. Talvez a saída esteja em um paradoxo: usar a conexão para nos desconectar do "se", para reencontrar a angústia produtiva de existir de verdade.

Enquanto isso, sigo rolando o feed, mas com outra consciência. O abismo do digital me encara, e eu encaro de volta.