Pesquisar este blog

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Rosa de Hiroshima, uma metáfora, um simbolo do segredo!

 

 


 Como andam suas metáforas? Como você anda?

 

Quem usa metáfora? A maioria das pessoas usam metáforas várias vezes ao dia e é quase impossível nos comunicarmos sem elas!

 

Metáfora é a figura de linguagem que usamos e encontramos em toda parte, geralmente a utilizamos várias vezes ao dia, elas fazem parte de nosso cotidiano na escrita e na fala, é uma forma que o ser humano inventou para se comunicar com maior eloquência, tanto para aqueles que leem e nos ouvem, sua utilização é tão presente que é praticamente impossível de nos comunicarmos sem o uso delas.

 

Aprendemos no cotidiano a usar metáforas, elas carregam uma mensagem como símbolos pessoais, nos ajudam a ler e entender nossa própria simbologia. As nossas metáforas permitem que nos conheçamos e entendamos nossa vida de uma maneira diferente, principalmente quando usamos esta ou aquela metáfora mais constantemente, inclusive elas podem indicar o momento que se está vivendo.

 

Perceba a riqueza das palavras na seguinte declaração:

 

"A minha raiva é como dançar com um tigre. Eu posso enxergá-la toda agora, a sala, o lustre, ouvir a música, sentir meu coração batendo enquanto nós rodopiamos entre os outros casais no salão de baile... Eu estou no limiar entre a vida e a morte."

 

A metáfora é indispensável, ela consegue resumir muitos sentimentos e emoções em tempo real, num piscar de olhos é como uma fotografia. Não podemos nos comunicar sem metáfora, até nossos pensamentos são carregados com elas, elas são parte da evolução da consciência humana, estão presente praticamente em tudo, até mesmo nas imagens e na arte como representação abstrata do mundo visto com os “olhos do coração”.

 

A metáfora é tão fundamental para a nossa maneira de pensar e de falar que somente as mais óbvias é que são registradas pela nossa consciência:

 

Eu te vejo com os olhos do meu coração.

 

Eu estou sempre dando murro em ponta de faca.

 

Eu carrego o mundo nos meus ombros.

 

Eu vejo uma luz no fim do túnel.

 

Essas expressões são obviamente metafóricas, simbólicas e representacionais. Nós sabemos que na realidade o coração não tem olhos, não existe nenhuma faca, que o locutor não se transformou num Atlas, e que ele de fato não está num túnel. Pelo contrário. Nós temos um mecanismo inato que registra a natureza figurativa dessas expressões em nossa mente e as aceita simbolizando uma experiência mais do que a experiência em si, revelam por sua vez a forma com que vemos as situações e como expressamos nosso entendimento, sendo ela boa por sua capacidade de iluminar o emprego da linguagem, a claridade que reporta pode ser um fim em si mesmo.

Nós sabemos a priori e intuitivamente que no dia a dia, as coisas e os comportamentos (o coração, a faca, o murro, os ombros, o mundo, uma luz e o túnel) estão sendo usados para representar outras experiências: o carinho, a falta de progresso, a excessiva responsabilidade, e achar que ainda tem esperança.

 

As metáforas evocam abundantes imagens e a percepção do sentido do que está sendo descrito de forma pessoal ou coletiva. Elas podem expressar, com muita nitidez, uma única ideia ou uma experiência de vida. Apesar de que muitos linguistas costumam rejeitá-las como "meramente figurativas", neste caso embora entendamos suas particularidades, elas hoje são aceitas como uma descrição altamente correta de percepção.

Atualmente percebemos o deslocamento da metáfora, de uma posição exclusiva da linguagem para o pensamento seguido da ação, ela faz parte da construção sócio-cognitiva daquilo que entendemos por realidade do cotidiano.

 a metáfora está infiltrada na vida cotidiana, não somente na linguagem, mas também no pensamento e na ação. Nosso sistema conceptual comum, em termos do qual não só pensamos, mas também agimos, é metafórico por natureza. (LAKOFF; JOHNSON (1980 [2002], p. 45)

 

Quando falamos sobre nós, nossos problemas, nossas emoções, nossos desejos, nossos relacionamentos – aquelas coisas mais importantes para nós – é ainda mais provável que façamos uso da metáfora para nos ajudar a descrever com eloquência a profundidade e a complexidade da nossa experiência pessoal.

 

Jung compreendeu e assim conceituou que ao utilizarmos as narrativas míticas e metáforas a realidade do indivíduo é ampliada, de modo, que o indivíduo se identifica com o aspecto coletivo, de tal forma, que o corpo/psique é integrado na dinâmica, esse processo consiste em pensar que todas as narrativas simbólicas que nos tocam são metáforas de nossos processos profundos que ocorrem em nosso psiquismo.

 

As meditações criam um vendaval em nós...

 

Minha mente em seu alvoroço me fez cavalgar o vento...

 

Se você não sabe como remar, mudar de barco não vai ajudar.

 

Confúcio, dizia: “Você não pode mudar o vento, mas pode ajustar as velas do barco para chegar onde quer”.

 

Vejamos outros exemplos:

Uma âncora nunca deve ser lançada quando tivermos nossas velas içadas, embolsadas pelo vento, este é um dilema, nosso eterno conflito de agir, o medo e a coragem. A dúvida e a certeza, que constantemente nos acompanham.

 

Aquele rapaz é um “gato”. –  A metáfora ocorre porque implicitamente o rapaz é comparado a um gato. Quer dizer que é encantador, fofinho, bonito, etc.

 

Ela me encarou e seu olhar era “pedra”. – A dureza e rigidez da pedra está sendo atribuída ao olhar. Podemos observar que a palavra pedra está sendo usada de forma figurativa e não no sentido literal da palavra.

 

Aquela menina é uma “flor”. – Subtende-se que a menina é meiga, bonita, cheirosa, delicada. Ou seja, possui características de flor. Mas, sabemos que aqui o vocábulo “flor” não se refere ao órgão de reprodução de uma planta.

Esta questão é apenas a” ponta do iceberg”. (Quer dizer que a questão é pequena diante de outras.)

Ela é uma “formiga” para doces. (Quer dizer que ela adora doces como se fosse formiga)

Onde há fumaça, há fogo. (Indica que, quando a pessoa desconfia de algo ou alguém por ter sinais, realmente motivo para tal desconfiança.)

Na metáfora Remédio Infalível, percebemos a inocência, ignorância, espertezas e desejo de justiça com uso das próprias mãos, tudo isso está presente na conduta humana:

 

Remédio Infalível

Um vendedor ambulante percorria os povoados oferecendo remédio contra coice de burro. Instalou-se numa pracinha, junto à capela, e começou a gritar com aquela habilidade própria dos charlatões:

- Alô, pessoal! Ouvi contar que aqui há muito burro xucro. É só agente passar perto e já vem o coice. Mas tenho aqui um remédio infalível. Querem experimentar?

Os curiosos se juntavam. Então ele mostrava um pacotinho bem fechado, dizendo:

- Cada pacotinho desses contém o remédio. Cura quem levou o coice e previne contra coices futuros. O pacotinho custa apenas ... E dava o preço de um, de dois, de três pacotes, sempre com o desconto de praxe. Mas, cuidado, perde o efeito.

Muitos roceiros compraram o tal remédio. Chegando às suas casas, abriram curiosamente o embrulho e encontraram dentro três metros de barbante e o conselho por escrito:

"Para evitar coice de burro, basta ficar longe do animal numa distância correspondente ao comprimento deste barbante." Desapontados e ludibriados, foram atrás do vendedor para lhe aplicar uma boa surra. Mas o espertalhão já havia sumido da praça.

 

A metáfora presente na poesia e na música

Wittgenstein (filósofo austríaco naturalizado britânico – 1889/1951), em seu Tractatus Logico-Philosophicus (TLP), tinha o objetivo imediato de explicar como a linguagem consegue representar o mundo, mais especificamente, pretendeu mostrar como uma proposição é capaz de representar um estado de coisas real ou possível. Em sua filosofia não procurou criar uma nova linguagem; antes, lutou com a linguagem a fim de superar os erros decorrentes do seu mau uso. No máximo, o que Wittgenstein fez foi criar novos símiles, imaginar novas formas de vida, utilizar conceitos fictícios, assim como a poesia faz e utiliza, com o objetivo de tornar a filosofia uma atividade terapêutica libertadora. Para ele as metáforas e, mais amplamente, as ligações analógicas terão um papel importante na reflexão de Wittgenstein após o Tractatus” e em sua filosofia.

Na poesia, segundo as considerações de Wittgenstein, cada expressão precisa ser colocada cuidadosamente e artisticamente no local adequado, é isso o que garante a beleza e a integridade do poema. Da mesma forma, considera que em filosofia uma boa metáfora ou uma expressão correta pode ser mais importante do que a formulação de uma hipótese ou de uma teoria. Uma boa analogia gera como consequência a satisfação, enquanto que uma teoria ou hipótese precisa passar pela verificação: “E se a metáfora se revela boa por sua capacidade de iluminar o emprego da linguagem, a claridade que reporta pode ser um fim em si mesmo”. Além do mais, uma teoria nunca é definitiva, já uma metáfora subsiste no tempo, gerando um efeito libertador.

Tomemos como exemplo alguns versos do poema de Vinícius de Morais (1913 – 1980) - “Rosa de Hiroshima”, o poema também virou música na voz de Ney Matogrosso (https://www.youtube.com/watch?v=Tt_goIGovGs)

 

Rosa de Hiroshima

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada

 

No poema A rosa de Hiroshima, de Vinicius de Moraes, a “rosa” a que o eu lírico se refere é uma metáfora para a famigerada bomba atômica, ou seja, ela é comparada a uma flor maravilhosa, a rosa símbolo da paixão. No entanto, em nenhum momento, a bomba é explicitamente mencionada no poema.

 

Na poesia, Vinícius usa muitas metáforas. Uma que chama muito a atenção é a palavra “rosa” usada no lugar de “bomba”. O texto nos induz a comparar a bomba jogada sobre Hiroshima com uma rosa, neste caso uma representação de fortíssimo apelo emocional. A palavra "rosa" ainda foi objeto de discussão na idade média na querela dos universais, a questão é colocada de modo quase poético no problema do nome da rosa. o nome da rosa, mesmo que não houvessem mais rosas, significaria alguma coisa em nossas mentes, ou a própria proposição "não existem rosas" deixaria de fazer sentido.



A rosa que é uma flor linda e maravilhosa, que se abre em muitas pétalas, com suas folhas ovaladas ou planas e exala perfume inebriante. A bomba também se abriu ao explodir, e a imagem lembrou a de uma rosa a desabrochar. Porém exalou radioatividade, tirou vidas no presente e no futuro, pois seu alcance espalhou o mal contaminando as gerações vindouras, representou a crueldade estadunidense e a maneira com que veem os não “americanos”.

 

Outra comparação é se refletirmos sobre a difusão e a expansão que os dois termos podem denotar. O cheiro da rosa é capaz de difundir-se exalando perfume e podendo ser projetado por determinadas distâncias. A bomba de Hiroshima, difundiu um mal que se projetou por longas distâncias e até mesmo através do tempo, a história registrou o ato genocida da crueldade humana.

 

Também observamos que o poeta chama a bomba de “rosa hereditária”. A expressão é metafórica e talvez se refira às consequências causadas. O acontecido acarretou um mal que se perpetuou, que passou de geração para geração, de pai para filho. É uma maneira de não nos deixar esquecer do câncer disseminado pelo alto poder da radiação e principalmente nosso olhar desconfiado aos interesses da nação cruel que quis e quer amedrontar o mundo, são volúveis, pois conforme o partido que assume a presidência ora tem uma visão em defesa da natureza, e ora tem interesses puramente capitalistas, basta comparar as contradições nos discursos e nos atos dos últimos governos.

 

Uma rosa é cor de rosa, vermelha, branca e amarela; é rosa dos ventos que representa as direções que sopram os diferentes ventos; é Rosa de Saron uma expressão bíblica que se encontra no Antigo Testamento em Cântico dos Cântico; Rosa do deserto uma flor do deserto, enfim uma rosa esta presente na vida da terra sob muitas formas e sentidos, na metáfora ela adquiriu a beleza sombria da morte ceifadora do presente e futuro, um símbolo do segredo.

 

Saber ler e entender uma metáfora é a capacidade que praticamente todas as pessoas possuem, no entanto, entender o que vai nas entrelinhas é para poucos, alguns até confundem com a catacrese, que também é uma figura de linguagem, mas é utilizada para denominar um elemento quando não há um termo específico que o conceitue. Ela é diferente da metáfora, que tem característica subjetiva e momentânea. Um apelido por exemplo, pode distinguir um ou um grupo de pessoas e nele estar carregado de informações, basta ter a capacidade de analisar.

 

Como vimos a Metáfora é uma palavra que está sendo empregada fora de seu sentido concreto, real, literal. Trata-se de uma comparação implícita, subentendida no texto.  Se caracteriza por comparar sem que sejam empregados termos comparativos. As nossas metáforas e símbolos pessoais nos ajudam a compreender o mundo, inclusive em seus conflitos políticos.

 

Elas dão forma àqueles aspectos da nossa vida que são os mais místicos – nossos problemas e suas soluções, nossos medos e desejos, nossas doenças e saúde, nossa pobreza e riqueza, e a nossa capacidade de amar e ser amado.

 

Quando são dadas formas representacionais a essas experiências, e elas são vistas pelo lado simbólico, deixam de ser efêmeras, aí então se tornam acessíveis para a exploração e a transformação pessoal, nelas são cultivadas nossas emoções com raízes mais profundas.

 

Fontes:

https://metaforas.com.br/artigo/a-magia-da-metafora.htm

https://metaforas.com.br/1998-12-31/remedio-infalivel.htm

https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/intuitio/article/view/18613/13537

Jung, Carl, O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeiro. 2ª. Ed. Nova Fronteira, 2008.

Lakoff, George & Johnson, Mark, Metáforas da Vida Cotidiana .

James Lawley e Penny Tompkins são psicoterapeutas registrados na Grã Bretanha pela United Kingdom Council for Psychotherapy (UKCP). Eles moram em Londres e ensinam no mundo inteiro. São os autores de Metaphors in Mind: Transformation through Symbolic Modelling. Podem ser contatados na The Developing Company pelo e-mail info@cleanlanguage.co.uk.

O artigo original "The Magic of Metaphor" está no site www.cleanlanguage.co.uk

segunda-feira, 26 de abril de 2021

“Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá.”

 

 

Para Immanuel Kant, filósofo alemão do séc. XIX, mesmo as chamadas propriedades objetivas da física pendem de projeções humanas subjetivas, e embora exista uma realidade que, de alguma forma, exerça uma função na constituição das aparências e no fenômeno da experiência, essa dita realidade não pode ser encontrada no reino das aparências sensatas, pois o mundo que vemos e sentimos a nossa volta envolve as projeções da consciência humana, cada um tem sua própria experiência da realidade.

Ela não é a realidade independente que aparenta, e os responsáveis em criar estas aparências ilusórias da experiência comum diária, somos nós mesmos seres humanos, enganamos a nós mesmos, ao projetarmos o mundo de nossa experiência própria, atribuímos a ele uma realidade independente e, portanto alienamos nossa liberdade, é tão profundo nosso engano que chega a tornando-nos escravos dos outros e de um sistema econômico e político. 

Hoje, ainda rimos da ingenuidade e arrogância das antigas visões que colocavam nosso planeta azul como centro do universo, mudar esta visão fez rolarem cabeças, no passado formulavam seu entendimento utilizando apenas aquilo que ainda hoje percebemos com os olhos, como por exemplo a ilusão de que é o sol que circunda a terra e a terra o centro do universo.

Nosso egocentrismo é tão grande que ainda não abandonamos a afirmação do sol que nasce e se põe, esta afirmação equivocada é repetida diariamente por todos e dá a entender que permanecemos acreditando no geocentrismo, a teoria do geocentrismo foi abandonada desde o século XVI através da sistematização de Copérnico revolucionando a visão do cosmo quebrando o paradigma quando apresentou a teoria do heliocentrismo que se contrapunha ao geocentrismo. 

E lógico, a quebra de um paradigma leva tempo para ocorrer, há dificuldade em enxergar um novo padrão, é necessário visão e coragem, porém é inevitável quando uma nova ideia ganha forma, para desligar um velho padrão deve-se usar um pensamento disruptivo e des-estruturante para romper com velhas ideias, principalmente se tratando de um tema milenar, alimentado e fomentado repetidamente tomado, contrariar as forças ditas donas da verdade e da suposta realidade consideradas como um sacrilégio, é por si só a rebeldia punível com a perda da vida.

Estamos rodeados de ilusões de óptica e a televisão é um exemplo. Ela é um conjunto de imagens estáticas que parecem ter movimento quando são apresentadas de forma rápida. É o cérebro humano que faz a montagem de todas essas imagens e as observa de forma mais lenta em relação a como ela é mostrada.

Outro exemplo que temos acerca de nossa percepção equivocada é quando observamos as rodas de um automóvel em movimento que parecem estar girando em sentido contrário.

A ciência já achou que as ilusões de movimento eram fisiológicas, efeitos que aconteciam só na retina, no entanto novas pesquisas que monitoraram a atividade neural demonstraram que há influência cognitiva e cerebral.

O cérebro é a parte física e a mente, a abstrata. Enquanto o cérebro cuida do perfeito funcionamento do corpo, dos sinais elétricos e da resposta emocional quando pensamos em algo que nos gera emoção, a mente é a responsável por gerar o pensamento que motivou o cérebro a iniciar seu trabalho.

Uma máxima da Ciência é que nada no Universo é tão complexo quanto o cérebro humano – a não ser o próprio Universo! Nosso cérebro com 100 bilhões de neurônios formando infindáveis conexões entre si, o cérebro é capaz de processar uma quantidade gigantesca de informações que chegam, todos os segundos, aos nossos órgãos sensoriais. https://www.brainn.org.br/brainn-um-centro-de-pesquisas-sobre-o-cerebro/

A ciência através de muitos estudos já nos apresentou provas suficientes para aceitarmos o “mundo” que realmente vemos é uma ilusão, não é real. O mundo que realmente vejo centra-se em mim, em meu “eu” físico, logo um mínimo de reflexão nos diz que o mundo em si não pode ser simplesmente assim como vejo.

Os sentidos como os conhecemos há muito são considerados como a interface orgânica para formarmos conhecimento do mundo, e como sabemos por experiência própria, qualquer forma de percepção sensorial pode estar sujeita e ilusões ocasionais.

Os sentidos podem ser utilizados numa outra forma como ferramentas, podem ser ferramentas utilizados noutras formas de se conceber a experiência ou vivência mística, sobretudo, para além das grandes tradições religiosas universais, nada tem com experiências de cultos de misticismos, superstições e cerimônias extravagantes, a mística aqui tratada se refere é uma mística não vinculada a nenhuma religião em especial.

A experiência mística é transcendental, ocorre na mente que é uma parte incorpórea, e é nesse campo de atuação que se manifestam os processos de percepção. A mente é esse veículo que sente e filtra o mundo a partir dos sentidos – mas eles enganam quem ainda permanece dormindo, permanece na ilusão, permanece dependendo apenas de condições externas, quando a verdade e o real acontecem em nossa mente.

Nossa mente é uma porta de libertação da caverna do irreal, é uma porta que Platão teria usado para acessar um nível superior de realidade, a porta liberta os prisioneiros que frequentemente e erroneamente supõem que a realidade em que vivemos é superior e mais verdadeira de todas, em parte não deixa de ser verdade, mas uma verdade limitada ao mundo dos cinco sentidos, pobres limitações de um nível superior de realidade.

Para se falar com propriedade sobre outros mundos, mundo real, mais real e ilusório, seria necessário ter alguma experiência metafísica que permita conhecer algo sobre o assunto, caso contrário, nosso conhecimento não passaria de ideias de terceiros supostamente sem fundamento, tal como o mundo das ideias de Platão no qual ele afirma existir um mundo ideal e que o mundo em que vivemos seriam apenas cópias imperfeitas.

Posso falar de minhas experiências e afirmar a existência de outros mundos em outros planos dimensionais, eles coexistem em suas particulares realidades, um parecendo menos ou mais real do que o outro. Um plano mais elevado em que se é permitido acessar nos dá impressão de haver um real mais real, onde o ente se sente mais iluminado em sua auto consciência, mais aberto para o entendimento da necessidade de aprimorar sua humanidade, as várias acessões ao mundo em plano superior vão aos poucos dando ciência da oportunidade de nossa existência que se tem na vida material.

Os contatos metafísicos proporcionam uma transformação metafísica do ente que está abrigado neste invólucro material, neste casulo projetado para experiências e novas vivencias na busca de evolução e iluminação.

As experiências metafísicas de cada um possuem suas particularidades, relatar suas vivencias poderá parecer sem sentido para a maioria das pessoas, em sua maioria evitarão falar sobre elas para não parecerem tolos, o assunto para a maioria materialista não terá olhos para enxergar aquilo que lhes parecerá indizível e incomunicável.

A comunicação entre pessoas que tem alguma experiência mística ocorre tal como metáforas com seus códigos pertinentes, comunicando um segundo sentido de uma expressão sem que todos que estão ouvindo entendam que a emissão carrega em si um duplo sentido, o qual só terá sentido para aqueles iniciados familiarizados com os termos. Assim quando compartilhamos com outra pessoa um segundo significado para um termo, apenas essa pessoa saberá o que estamos dizendo de fato, enquanto outras pessoas entenderão apenas o sentido literal da expressão perdendo o que está por trás das aparências em razão de estarem contaminados pela mera existência física escravizados em suas ilusões de percepção egocêntrica.

Não é preciso ser genial nem uma pessoa com formação acadêmica para ingressar no mundo místico, entendo que a maioria das pessoas já tenham pensado no que significa a palavra desapego, como por exemplo do conteúdo místico que encontra-se na palavra “desapego”, para os iniciados remete a “entrega”, trata-se de um deslocamento que ocorre no interior da mente, num continuum, como se para um ocorrer depende do outro, num processo de ultrapassagem, iniciando pelo desapego exigindo a disposição para um esforço em abrir mão de suas conexões do cotidiano que colocam nossa mente em constante estado de agitação, numa tagarelice até insuportável.

O “eu” precisa se distanciar da mente e transcender sem que com isto paralise a mente, apenas deixar a inteligência da mente se conectar naquilo que realmente importa. Alguns pensam em paralisar os pensamentos, isto seria ir contra milhões de anos de evolução pelo qual o homem passou até chegar ao que somos hoje, então não seria natural. 

O caminho está na pratica e exercícios de meditação, eles nos encaminham para realização de um esforço sem esforço, isto é, não se trata de um esforço positivo, ativo, nem mesmo ativo-passivo, no sentido comum da palavra. Aqui as palavras são consenso entre os praticantes, não são minhas, é consenso: Esse esforço da prática diz que ela deve ser dotada de vigor, diligência, persistência, tenacidade e nunca algo “que é feito impondo a si mesmo [...] ou a outrem; [... ouseja,] a prática nunca deve ser tentada por imposição”. Se ela for uma intervenção voluntariosa ou mesmo uma coerção metódica, produzirá no praticante um efeito contrário ao da concentração, seria dispersão de energia levando ao cansaço e fadiga, sem falar na desmotivação da prática.

Acreditar no transcendente é para a maioria das pessoas apenas um ato de fé cega, a escolha de uma e outra religião são apenas as escolhas feitas pelo condicionamento social do caminho e a trilha onde passa o rebanho, alguns escapam do controle e encontram outros caminhos, poucos conseguem oferecer um contato com planos dimensionais mais elevados, pois ainda estão envoltos pelo véu da superficialidade e artificialidade num mundo movido pela mecânica do consumo e o vício na alegria fugaz. Perceber o erro nos dá uma noção de que se trata uma ilusão neste plano do real, nos dá uma ideia do irreal no real tentando preencher um vazio que se torna infinito.

A verdade é aquela vivenciada numa condição supramental, vivenciada através de algum tipo de experiência mística, é quando se passa a perceber o nosso dito mundo material real como ilusório, até então não percebido adequadamente devido a nossa pouca capacidade de enxergar objetivamente.

O que se pode dizer a partir das experiências supramentais é que os eventos estão todos inter-relacionados nos vários mundos e nos vários planos ou níveis de realidades, ou seja, não há uma realidade mais real, existem várias realidades cada uma relativa ao próprio plano, porem nada está separado, tudo está interligado.

Nem todas as pessoas buscarão a iluminação se isto lhes impuser fazerem escolhas que subtraiam o conforto e principalmente não o farão porque o medo do novo é o medo que assola todas as pessoas, então preferem viver no conforto da ignorância.

Vamos falar um pouco a respeito do medo, o medo é o maior inimigo ser humano. O medo está por trás do fracasso, da doença e das relações humanas desagradáveis, o medo pode ser positivo quando nos prepara para um enfrentamento, porem negativo quando nos tira a coragem de enfrentar os desafios da vida.

No budismo há a “metáfora da cobra que é uma corda”. Ela aparece frequentemente em ensinamentos sobre vacuidade, Caminho do Meio e Natureza de Buda.

Nessa analogia, numa sala escura sentimos medo ao ver o vulto de uma cobra. O Buda liga o interruptor da luz (tradicionalmente deve entrar como uma lamparina, ou algo assim), e reconhecemos que era apenas uma corda que na escuridão foi confundida com uma cobra. Assim, nos tranquilizamos.

O importante nessa metáfora é que, independente da luz, nunca houve cobra alguma. Liberamo-nos da ansiedade e do medo, mas nada mudou de fato. Desde o princípio não havia nada realmente perigoso ali. Teríamos medo se a luz fosse apagada novamente? Não. 

No exemplo acima, a insatisfação (1) é o medo, a causa do medo é nosso engano (2) com relação a haver uma cobra, e a liberação (3) é o processo de acender a luz. Uma vez que o reconhecimento da natureza de corda daquela cobra, uma vez que abandonemos as expectativas perante os fenômenos compostos serem capazes de produzir satisfação, não precisamos de nenhuma luz para saber que as coisas são como são. Porém, por compaixão, o Buda segue manifestando os ensinamentos para acordar os seres de seus pesadelos infundados. https://blogs.opovo.com.br/artesanatodamente/2015/06/12/a-luz-da-consciencia-na-superacao-dos-medos/

Tem um miniconto muito famoso que nos fará pensar a respeito do mundo que vivemos:

“Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá.”, neste mais famoso miniconto “O dinossauro”, escrito pelo guatemalteco Augusto Monterroso, ele utilizou da ambiguidade semântica escrevendo com apenas sete palavras, esta frase tão plurissignificativa que nos faz perceber que quando acordamos estamos presos numa gaiola do mundo, nos perguntamos: quem acordou e onde é lá?

Se pensarmos um pouco, nos damos conta que algo está errado em nossa forma de viver e no mundo sem sabermos o que é, este é o momento que devemos perceber que o que está errado, e está em nós, então é hora de mudar, iniciando por mudar as formas de ver este mundo, tomando boas atitudes e tentar buscar as conexões supramentais em nosso interior.

Só ler Platão não nos irá tirar da caverna, é preciso vivenciar e será através do intelecto e não somente através dos sentidos, a mente é mais importante que a matéria, o caminho é procurar conjugar corpo e mente neste trabalho de autoconhecimento, caso contrário o dinossauro continuará lá!

Por quê? Porque por mais que Platão e qualquer outro ser iluminado nos indique o caminho, quem deve fazer o trabalho de viver somos nós! Aproveite que o seu “eu” está no comando de sua mente, ensine seus pensamentos a fluírem de maneira positiva e tudo irá se refletir na sua autoestima, bom humor e leveza na vida. 

Dicas de velhas formulas: Filtre seus pensamentos e retenha só o que lhe for útil e necessário positivamente, faça uma troca entre pensamentos ruins por “suas coisas favoritas”; exercite sua mente através de leituras que acrescentem conhecimento, saia da rotina dos noticiários; não esqueça do exercício físico, pode ser até aquela boa caminhada ritmada que fará seu sangue circular e manterá seu corpo em condições de abrigar uma mente saudável.