Outro dia, enquanto tomava meu café em uma padaria perto do escritório, observei um casal na mesa ao lado. Eles discutiam em voz baixa, mas o tom era inegavelmente tenso. A mulher, com lágrimas nos olhos, dizia que sentia falta de quando ele estava presente, não só fisicamente, mas de corpo e alma. O homem, com o rosto fechado, argumentava que estava trabalhando mais do que nunca para garantir o futuro deles. De repente, me ocorreu como aquela dedicação, que deveria ser uma força positiva na vida deles, estava lentamente corroendo o relacionamento. Foi então que me lembrei do velho ditado: "cada coisa se destrói pelo mal que lhe é próprio." A reflexão me acompanhou pelo resto do dia e me levou a pensar em quantas vezes, no nosso cotidiano, aquilo que acreditamos ser nossa maior virtude pode, se não for bem dosado, se tornar o nosso maior inimigo.
A
vida tem uma maneira curiosa de nos mostrar que, muitas vezes, aquilo que
carrega o potencial de nos elevar também carrega o germe de nossa destruição.
Pegue, por exemplo, o ambicioso empresário que constrói seu império com
determinação inabalável. Sua sede por sucesso, que o impulsionou a grandes
alturas, pode se tornar sua queda. Quando a obsessão pelo poder e pelo controle
ultrapassa os limites do razoável, ele começa a se isolar, perde o equilíbrio
entre vida pessoal e profissional, e, eventualmente, implode sob o peso de suas
próprias expectativas.
Esse
cenário é comum em tantas áreas da vida. A mesma força que nos leva adiante
pode se tornar um veneno, se consumida em excesso. Imagine um atleta de ponta,
dedicado a um ponto quase sobre-humano. Sua disciplina é sua maior virtude, mas
também é o que pode levá-lo a ignorar os sinais de seu corpo pedindo descanso.
A busca incessante pela perfeição pode resultar em lesões que, ironicamente,
podem encerrar sua carreira prematuramente.
Podemos
observar isso até mesmo em contextos mais simples do dia a dia. Pense na pessoa
que é extremamente generosa, sempre pronta para ajudar os outros, sem jamais
pensar em si mesma. Essa generosidade, que deveria ser sua maior qualidade,
pode facilmente se tornar o que a desgasta, deixando-a esgotada e ressentida. O
que antes era um ato de bondade se transforma em um fardo, gerando um ciclo de
desgaste emocional.
Esse princípio de "cada coisa se destrói pelo mal que lhe é próprio" é bem observado na filosofia. Aristóteles, por exemplo, falava da mesótes, a doutrina do meio-termo, onde cada virtude, se levada ao extremo, se torna um vício. A coragem, em excesso, se torna imprudência; a generosidade, uma autodestruição. O equilíbrio é, portanto, a chave para evitar que nossas maiores qualidades se transformem em nossas ruínas.
No fundo, isso nos ensina a importância de reconhecer nossos próprios limites e entender que, às vezes, é preciso frear aquilo que acreditamos ser nosso maior trunfo. É um lembrete de que as coisas, quando levadas ao extremo, carregam em si a semente de sua própria destruição. Seja na ambição, no amor, na dedicação ou na generosidade, tudo deve ser equilibrado para que não se transforme em nosso maior inimigo. Afinal, o que faz de nós seres humanos completos é a capacidade de entender e moderar nossas próprias paixões, evitando que elas nos consumam.
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