Outro dia, observei um pai apressando o filho no parquinho. “Vamos logo! Mais uma vez no escorregador e acabou!” O menino nem teve tempo de protestar – só deslizou resignado, como se já soubesse que a vida adulta começa cedo demais. Essa cena me fez lembrar das ideias de Carl Honoré, autor do livro Under Pressure, onde ele critica a obsessão contemporânea por acelerar a infância. Será que estamos criando nossos filhos ou apenas gerenciando pequenas carreiras em desenvolvimento?
Honoré
defende um conceito que deveria ser óbvio, mas que soa quase subversivo hoje em
dia: criar filhos sem pressa. Em um mundo onde os pequenos são matriculados em
cursos de mandarim antes de conseguirem amarrar os próprios sapatos e
participam de agendas dignas de executivos de alto escalão, desacelerar parece
um ato de resistência. Mas e se, em vez de tratarmos a infância como uma
corrida, a víssemos como uma experiência em si mesma?
O
paradoxo da superpreparação
Vivemos
a era do “superfilho”: aquele que toca violino aos cinco anos, domina
programação aos sete e já pensa em bolsa de estudos para Harvard antes mesmo da
adolescência. Pais bem-intencionados tentam “otimizar” o tempo dos filhos,
evitando qualquer desperdício de potencial. No entanto, será que essa busca
incessante por prepará-los para o futuro não os impede de viver plenamente o
presente?
O
filósofo Byung-Chul Han aponta que a sociedade contemporânea vive no que ele
chama de “sociedade do desempenho”, onde tudo precisa ser produtivo, até o
lazer. Assim, a infância se torna uma fase de preparação, não um momento com
valor próprio. O brincar livre, a conversa sem rumo e até o tédio são vistos
como inimigos da eficiência, quando na verdade são essenciais para o
desenvolvimento emocional e criativo.
Pais
ansiosos, filhos ansiosos
Honoré
sugere que o excesso de controle sobre a infância vem, em grande parte, da
ansiedade dos próprios pais. Queremos protegê-los de frustrações, preparar o
terreno para que tenham sucesso e evitar qualquer erro que possa comprometer
suas futuras oportunidades. Mas, paradoxalmente, essa tentativa de blindagem
pode torná-los menos resilientes e mais inseguros.
Aqui
entra um conceito interessante do filósofo brasileiro Rubem Alves: ele dizia
que educar é como ensinar a voar, e não construir gaiolas douradas. Se queremos
que nossos filhos sejam independentes, precisamos deixá-los experimentar,
errar, cair e levantar. A pressa em moldá-los para um futuro idealizado pode
acabar roubando-lhes a chance de se descobrirem por si mesmos.
O
tempo da infância
Se
há algo que Honoré nos ensina, é que desacelerar não significa ser negligente,
mas sim permitir que os filhos vivam a infância com plenitude. Deixá-los
explorar o mundo sem um cronômetro na mão, aprender no seu próprio ritmo e se
entediar de vez em quando pode ser mais educativo do que qualquer aula
extracurricular.
Talvez
o maior presente que podemos dar a eles não seja um futuro brilhante, mas um
presente vivido com significado. Afinal, quando foi que decidimos que crescer
deveria ser uma maratona e não uma dança?