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quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Cisne de Avon

William Shakespeare, o "Cisne de Avon", transcende sua identidade como poeta e dramaturgo para se tornar um prisma pelo qual examinamos a alma humana. Ele não é apenas um autor; é um filósofo da vida disfarçado de contador de histórias. A metáfora do cisne, símbolo de beleza e serenidade, contrasta ironicamente com os temas profundos e muitas vezes sombrios que atravessam suas obras, nos convidando a mergulhar em questões filosóficas essenciais: o ser, o tempo, o destino e a moralidade.

A Dualidade do Cisne e da Obra

O cisne é tradicionalmente associado à graça, mas também carrega conotações de silêncio e mistério, como na lenda de que ele canta apenas antes da morte. Shakespeare reflete essa dualidade em sua obra: sua poesia é sublime e harmoniosa, mas é na tragédia que ele encontra sua mais alta expressão. "Hamlet", por exemplo, explora a tensão entre ação e inação, mostrando que o "cisne" não é apenas um símbolo de beleza, mas de introspecção e tormento interno.

Na filosofia, essa dualidade ressoa com as ideias de Søren Kierkegaard sobre a existência. Kierkegaard argumenta que o homem vive entre os estágios estético, ético e religioso, muitas vezes em conflito. Shakespeare, como o cisne, oferece um espelho onde essas camadas se sobrepõem. Hamlet, ao hesitar diante de sua vingança, representa a luta existencial de um homem dividido entre o dever moral e a contemplação filosófica.

Shakespeare e a Tragicidade da Vida

Shakespeare é um mestre em capturar a fragilidade e a efemeridade da condição humana. Em "Macbeth", ele questiona a natureza do destino, do poder e da ambição: "A vida é apenas uma sombra ambulante, um pobre ator que se pavoneia e se agita por uma hora no palco e depois não é mais ouvido". Aqui, encontramos ecos da visão de Martin Heidegger, para quem o ser humano é um "ser-para-a-morte". A metáfora do cisne cantando antes de morrer encapsula essa ideia: a consciência da finitude dá profundidade à experiência humana.

Ao mesmo tempo, Shakespeare não é um niilista. Ele reconhece o absurdo da existência, mas, como Albert Camus sugere em "O Mito de Sísifo", parece encorajar-nos a abraçá-lo. Em peças como "A Tempestade", ele propõe uma visão mais conciliadora, em que a aceitação da transitoriedade da vida pode levar à paz: "Somos feitos da matéria de que são feitos os sonhos, e nossa breve vida é cercada por um sono".

O Cisne e a Moralidade

Outra dimensão filosófica das obras de Shakespeare é sua abordagem da moralidade. Diferentemente de pensadores como Platão, que buscavam absolutos, Shakespeare é um explorador da ambiguidade. Em "Otelo", a linha entre o bem e o mal é borrada por Iago, um vilão cuja complexidade moral desafia nossa necessidade de categorias fixas. Essa fluidez ética reflete o pensamento de Friedrich Nietzsche, que via na moralidade tradicional uma construção humana, muitas vezes arbitrária e contraditória.

Shakespeare, no entanto, não oferece respostas fáceis. Ele nos convida a sermos cúmplices em seu questionamento. Assim como o cisne desliza pela água sem revelar o esforço de suas patas abaixo da superfície, suas histórias nos levam a refletir sobre a tensão entre o que aparece e o que realmente é.

O Legado Filosófico do Cisne de Avon

Se o cisne é o emblema da elegância, Shakespeare é o arquétipo do pensamento humano em movimento. Suas obras continuam a dialogar com as questões centrais da filosofia: o que é a verdade? Qual é o sentido da vida? Como devemos viver? Sua grandeza está em sua recusa em fechar essas questões, preferindo deixar-nos com o eco de suas palavras, como um canto de cisne interminável.

Talvez o maior ensinamento de Shakespeare seja este: viver é um ato de interpretação constante. Assim como o cisne desliza silenciosamente pela superfície da água, nossas vidas contêm profundidades invisíveis que só emergem quando enfrentamos nossas tragédias e nossas alegrias. Shakespeare, o Cisne de Avon, nos guia por essas águas, não com respostas, mas com perguntas que ecoam através dos tempos.

Shakespeare não é apenas o poeta do palco; é o filósofo do coração humano. Ao trazer à tona as contradições, angústias e belezas de existir, ele nos convida a sermos cisnes em nosso próprio rio de vida — a navegar com graça, a cantar com intensidade, e a desaparecer, enfim, deixando um rastro de mistério e significado.


segunda-feira, 1 de abril de 2024

Gêneros de Consenso


Ah, os gêneros de consenso! Aquelas coisas que todo mundo parece curtir, seja lá qual for o seu estilo. De música a filmes, passando por livros e até mesmo comida, sempre tem aquele tipo de coisa que parece unir as pessoas, independentemente de quem sejam. Vamos dar uma olhada em algumas dessas situações cotidianas onde os gêneros de consenso brilham e, quem sabe, descobrir por que isso acontece.

Na Música: Batendo Palmas em Sintonia

Imagine você em um barzinho movimentado. O som é ao vivo, e a banda está mandando ver. De repente, começa aquela música que todo mundo conhece, e antes que perceba, todo mundo está batendo palmas e cantando junto. Esse é o poder dos gêneros de consenso na música. Não importa se você é fã de rock, pop ou sertanejo, sempre há aquelas músicas que todo mundo sabe de cor e salteado. Como diria o grande filósofo musical, Bob Marley, "One love, one heart, let's get together and feel all right"(Um só amor, um só coração. Vamos seguir juntos para ficarmos bem). E realmente, quando se trata dessas músicas, todo mundo se sente "all right".

Nos Filmes: Risadas Garantidas

Agora, mudando para o mundo do cinema, quem não gosta de uma boa comédia? Não importa se você é fã de ação, romance ou ficção científica, quando se trata de rir, todos nós falamos a mesma língua. Imagine estar em uma sessão de cinema, e aquela cena engraçada acontece. Você olha para o lado e vê todo mundo rindo junto, como se fossem velhos amigos. É a magia dos gêneros de consenso em ação. Como disse o sábio do humor, Charlie Chaplin, "Um dia sem rir é um dia desperdiçado". E quando se trata desses filmes que arrancam gargalhadas, é difícil desperdiçar um dia sequer.

Na Literatura: Todos Amam um Bom Conto

E o que dizer dos livros? Ah, os livros! Seja você um devorador de romances, um aficionado por ficção científica ou um amante de clássicos, sempre há aquelas histórias que todos conhecem e apreciam. É como se cada página fosse uma nova aventura compartilhada com amigos. Como disse o mestre das letras, William Shakespeare, "O que não se pode evitar, aceita-se". E quando se trata desses gêneros de consenso na literatura, é difícil evitar se envolver e se apaixonar por essas histórias que todos conhecemos tão bem.

Então, aí está. Os gêneros de consenso estão por toda parte, nos unindo em torno das coisas que todos amamos. Quer seja batendo palmas em um show, rindo em uma sessão de cinema ou mergulhando em um livro cativante, essas são as coisas que nos conectam como seres humanos. Como disse o visionário Walt Disney, "A felicidade é uma borboleta que, sempre que perseguida, parecerá inatingível; no entanto, se você se sentar calmamente, ela poderá pousar em você". E quando se trata desses momentos de conexão através dos gêneros de consenso, a felicidade parece pousar em todos nós. Então, vamos aproveitar esses momentos juntos e celebrar aquilo que nos une.


quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Resenha do livro “Hamlet” de Shakespeare

É uma obra incrível, interessante e instigante, trata-se de uma peça e obra prima de Shakespeare, encenada pela primeira vez no início do século XVII, ela é baseada numa lenda escandinava medieval.

Hamlet, nosso protagonista, jovem príncipe dinamarquês que toma conhecimento da morte do pai causada supostamente pelo tio que toma o trono, neste caso o irmão do rei, com medo de ter o mesmo desfecho de seu pai, Hamlet se faz de louco e assim parece ser inofensivo (será que se faz de louco, ou ele enlouqueceu?), ele cresce e pega a espada do pai e mata o tio, é uma peça que parece ter um final feliz em razão de um círculo que se fecha com uma sucessão de justiças pelas diversas mortes.

Hamlet é um brilhante estudante universitário que volta para casa por conta da morte do pai, daí a pouco tempo sua mãe se casa com o cunhado, irmão do pai o rei, daí o irmão chamado Claudio se torna o rei da Dinamarca, no entanto na lista de sucessão esta Hamlet, e ele Hamlet é muito mais carismático, era o preferido a suceder o pai pelo fato dele ser muito amado pelo seu povo e o próximo na sucessão, então como ele não sucedeu o pai no trono da Dinamarca?, ele também entende que o casamento da mãe com o cunhado se trata de um incesto, além do mais Hamlet se enche de raiva pelo fato dele não estar no lugar de Claudio, aqui trata-se de uma relação freudiana edipiana, realmente há muito o que se pensar a respeito dos acontecimentos.

Hamlet fala muito consigo mesmo, ele entra num processo de descobrimento e entendimento do que está acontecendo.

Alguns solilóquios e elucubrações de Hamlet:

“Ser ou não ser, eis a questão”;

“O descanso é silêncio”

A peça inicia com um diálogo entre soldados que estão na ronda do castelo, soldados que contam  que todos os dias à meia noite aparece um fantasma, eles contam o fato para Horácio, amigo de Hamlet, Horácio conta para Hamlet e ele resolve ver se é verdade, os soldados e Hamlet avistam o fantasma, Hamlet inicia uma conversa com o fantasma reconhecido como o fantasma de seu pai, os soldados presenciam a conversa entre o fantasma do pai e Hamlet, Hamlet jura ao pai que se vingara e os soldados juram que nada dirão a respeito da conversa entre pai e filho, tudo dentro de uma seriedade enorme, juram sobre a espada de Hamlet.

Personagens de Hamlet:

  • Cláudio é Rei da Dinamarca, eleito ao trono após a morte de seu irmão, o Rei Hamlet. Cláudio casou-se então com Gertrudes, esposa do seu falecido irmão.
  • Gertrudes é a Rainha da Dinamarca, e esposa do falecido Rei Hamlet, agora casada com Cláudio, e mãe de Hamlet.
  • O Fantasma do pai de Hamlet, que lhe aparece para falar que, na realidade, foi envenenado por seu irmão Cláudio.
  • Polônio é o primeiro-ministro, conselheiro do Rei Cláudio.
  • Laertes é o filho de Polônio, e está retornando de Paris para Elsinore.
  • Ofélia é a filha de Polônio, e irmã de Laertes, que vive com seu pai em Elsinore. Ela é apaixonada pelo príncipe Hamlet. E podemos dizer que por fim morreu de amor.
  • Horácio é um grande amigo de Hamlet, que se moveu a Elsinore com o intuito de presenciar o funeral do Rei seu pai.
  • Rosencrantz e Guildenstern são amigos de infância e de escola do príncipe Hamlet. Foram chamados por Cláudio e Gertrudes, que desejavam alegrar o príncipe com a presença dos amigos, já que ele se encontrava melancólico pela morte do pai.
  • Fórtimbras é sobrinho do antigo Rei da Noruega, e atual Rei desse país. Ele também é filho do sênior Fórtimbras, que morreu num combate com o pai de Hamlet.

A partir daí ele se faz de louco, só Horácio sabe desta estratégia de Hamlet, ele se finge de louco para parecer inofensivo, ele também age assim para ganhar tempo e confirmar o que o fantasma contou para ele, se Claudio teria envenenado seu pai, tudo isto dentro de sua ética pessoal, ele não queria ser injusto, dentre vários outros atos de indecisão, ele passa a passar uma imagem de indeciso e procrastinador.

Ler o livro é ler fala a fala, cena a cena, é ler o dialogo dos atores, é vibrar no papel de cada um dos personagens, é muito interessante porque faz o leitor incorporar alguns dos personagens pela simpatia ou pela antipatia, é uma peça com teor psicológico, como se fossem várias peças, uma dentro da outra, realmente se trata de uma brilhante construção do pensamento humano racionais e irracionais, carregado de muitas emoções e sentimentos com suas justificativas, levando a atitudes que nem sempre tem suas consequências bem avaliadas, e assim é a vida humana.

 

Fonte digital: www.jahr.org – “A trágica história de Hamlet – Principe da Dinamarca” por William Shakespeare. Edição Ridendo Castigat Moraes. Versão para eBook

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Resenha da Peça “Otelo, o mouro de Veneza” de William Shakespeare

Otelo e Desdêmona

“Otelo, O mouro de Veneza”, é uma peça de teatro composta por William Shakespeare por volta do ano de 1603, é classificado como tragédia por envolver, ciúme, drama, traição, a presença da morte, o nome do personagem principal que empresta seu nome a obra é Otelo, um grande general mouro trabalhando muito bem defendo Veneza contra os invasores e na conquista de novos territórios, ele era um cara muito bem-sucedido para inveja e despeito de alguns. A história gira em torno de quatro personagens principais: Otelo (um general mouro que serve o reino de Veneza), sua esposa Desdêmona, seu tenente Cássio, e seu sub-oficial Iago.

É uma obra muito atual, por causa dos seus temas variados, tais como: preconceito racial (racismo), religioso e contra estrangeiros (xenofobia), amor, ciúme injustificado, inveja e traição, temas que continuam a desempenhar relevante papel para os dias atuais, motivos de muitas tragédias e dramas, nem todos com finais felizes. Exemplos disso está no problema da xenofobia enfrentado por povos, em geral muçulmanos provenientes do Oriente Médio, na Europa e nos Estados Unidos e no Brasil o problema está relacionado majoritariamente ao racismo, pois a intolerância religiosa é praticada contra os adeptos das religiões africanas.

A amplitude desta obra também se presta a estudos sobre o psicológico das fraquezas humanas, as emoções abordadas na tragédia por Shakespeare são emoções pertinentes ao campo de batalha no cotidiano da vida, desde o momento em que os seres humanos começaram a se relacionar socialmente.

O autor, William Shakespeare nasceu em Stratford-upon-Avon, no ano de 1564. A maior parte da sua obra foi produzida em Londres entre os anos de 1590 e 1613. Ele é autor de várias obras de sucesso como Romeu e Julieta, Hamlet, Macbeth, A megera domada, Sonho de uma noite de verão, O mercador de Veneza e A tempestade. No caso de Otelo, a peça possui duas possibilidades de data para a sua composição, quais sejam: entre o final de 1601 e 1602 ou como data comumente adotada, 1603 ou 1604.

Personagens

O Doge de Veneza.

BRABÂNCIO, senador. Outros senadores.

GRACIANO, irmão de Brabâncio.

LUDOVICO, parente de Brabâncio.

OTELO, mouro nobre, a serviço da República de Veneza.

CÁSSIO, seu tenente.

IAGO, seu alferes.

RODRIGO, fidalgo veneziano.

MONTANO, governador de Chipre antes de Otelo.

BOBO, criado de Otelo.

DESDÊMONA, filha de Brabâncio e esposa de Otelo.

EMÍLIA, esposa de Iago.

BIANCA, amante de Cássio.

Marinheiro, oficiais, gentis-homens, mensageiros, músicos, arautos, criados.

Otelo é uma tragédia, portanto os acontecimentos são dramáticos, cheio de intrigas e manipulações, a leitura requer que antecipadamente tenhamos presente que se trata de uma tragédia e que não tem um final feliz, o drama gira em torno de orgulho, infidelidade e ciúme, fala muito sobre confiança e falta de confiança, muito do que ocorre no drama é dentro de um núcleo familiar, a ideia é que tudo se passa dentro de poucos dias, o desenrolar da história é rápido, até haverá dúvidas quanto a consumação do casamento de Otelo e Desdêmona, diante de tanta intriga e maldade a ordem para ser restaurada precisará da presença da morte dos personagens, o que é típico das tragédias de Shakespeare.

Otelo é um homem mouro e negro, apesar de sua aparência rude, ele era um homem nobre em seus sentimentos e atitudes, porém muito ingênuo ao ponto de ser engano, infelizmente não acreditava o suficiente em seu amor e também sua insegurança foi suficiente para se deixar envolver por intrigas, ele tinha opositores desde os seus soldados subordinados até dentre os nobres, não entendiam como um mouro e negro tinha tanto poder, mesmo tendo se convertido ao cristianismo, como mouro ele tinha sua procedência e origem barbara, sua origem é que era o maior problema, era mais uma questão de povo civilizado X povo bárbaro, e a exclusão do estrangeiro era muito forte naqueles tempos, a cor da sua pele para eles ainda não era o maior problema, até porque a noção de escravização naquela época ela mais por conquista de povos e espólios de guerra, a “civilização” ainda não tinha emburrecido tanto ao ponto de escravizar alguém por sua cor da pele, coisa que foi tomar forma por iniciativa dos portugueses no século XV com a exploração da costa africana.

Os mouros eram povos que habitavam e estavam instalados na península ibérica durante a idade média, os mais conhecidos são os árabes, berberes, entre outros.

Desdêmona é uma jovem nobre, linda, religiosa, recatada, tinha vários pretendentes de boas famílias, naquela época um casamente representava um negócio e a união entre famílias importantes, no entanto ela por ter a confiança do seu pai conquistou o direito de escolher seu marido, sua escolha pelo mouro foi um passo além do que seu pai poderia imaginar, para aquela época sua atitude seria incompreensível, pois abriu mão do conforto e nobreza para viver uma vida aventurosa de um militar. Seu final foi difícil, assassinada por Otelo em razão da desconfiança de sua fidelidade, morreu com sua imagem maculada, sem também ter um desfecho cristão, deve ter se sentido abandonada por Deus, morreu sem o consolo da religião, coisa que para a época eram muito importantes.

A peça é repleta de preconceitos em virtude de origens, etnia, há outro caso Xenofobia o de Cassio que era um jovem matemático Florentino, que nunca havia comandado um soldado em guerra, foi promovido a tenente, coisa que também incomodavam os venezianos, eles não aceitam que alguém de fora de Veneza tivesse algum cargo de importância, o preconceito contra Otelo é maior por ele ser um bárbaro, por ser mouro e negro, como podemos observar nas palavras de Rodrigo um apaixonado não correspondido por Desdêmona, Rodrigo ao pé da janela de Brabâncio (pai de Desdêmona), inflado por Iago denuncia a fuga de Desdêmona com Otelo para se casarem as escondidas, no entanto eles dizem a Brabâncio que ela havia sido raptada por Otelo, levada a força:

 

RODRIGO — Responderei por tudo. Mas pergunto-vos, senhor, se foi com vosso assentimento, vosso sábio conselho — como quase fico a pensar — que vossa linda filha, na calada de noite tão escura, saiu em companhia de um sujeito nem melhor nem pior do que um velhaco por qualquer alugado, num gondoleiro, para aos abraços torpes entregar-se de um Mouro luxurioso; se, realmente, sabeis de tudo e concordais com isso, bem: nesse caso é certo vos fazermos inominável e atrevida ofensa. Mas se desconheceis o que se passa, ensina-me o costume que não tendes razão de censurar-nos desse modo. Não creiais que tão falho eu me revele de cortesia, para vir agora zombar de vossa grande reverência. Vossa filha — de novo vos declaro — se não lhe destes permissão, mui grave pecado cometeu, unindo o espírito, a beleza, o dever e seus haveres a um estrangeiro andejo e desgarrado daqui e de toda parte. Pag.13

 

O maior vilão da peça é Iago – o honesto, talvez o maior vilão dos vilões da literatura, ele é o principal antagonista da peça, tudo que ele trama contra Otelo é devido a seu orgulho ferido, é como se Iago incorpora-se Satã, são tantas as suas tramas e maldades que é possível fazer esta afirmação, tudo que Iago faz é em nome do mal, aproveitando-se da insegurança e desconfianças de Otelo, um ciúme sexual, Otelo tem medo da traição como da morte, é o que faz mover muitas tragédias, porém muito de suas atitudes, reações e emoções são por nós reconhecidos como não nefastos ou maléficos, como alguns dos motivos que movem os atos de Iago, o prazer que se tem pelo exercício de habilidades e aptidões, como desejo de poder, desejo de aprovação, coisa que não seriam de todo coisas más, pois fazem parte daquilo que as pessoas admiram e buscam em seu cotidiano, os artifícios de Iago toma um rumo da manipulação, artifícios que são maquiavélicos e o transformam de honesto a traiçoeiro.

Iago é o alferes (no regime militar atual seria o posto 2º tenente) de Otelo, ele odiava Otelo por ele ter promovido Cassio para o posto de tenente, posto que Iago almejava e se julgava mais habilitado para a função, além disto ele odiava Otelo por ser mouro e ser negro e odiava a Cassio por ser uma pessoa sem as qualidades para exercer o cargo. Iago era casado com Emília, que por sua vez era assistente de Desdêmona.

Iago em seu ódio por Otelo elabora um plano para o destruir, fazendo-o acreditar que a sua esposa está a ter um caso com o Cassio, coisa que não seria muito de difícil de fazer pois a fragilidade de Otelo estava em sua autoestima, ele se achava abaixo socialmente de Desdêmona, logo sua insegurança poderia ser alvo das intrigas e manipulações diabólicas de Iago.

Quem plantou a primeira sementinha de dúvidas quanto a fidelidade de Desdêmona foi o próprio pai dela como vemos neste dialogo, entre o sogro e Otelo:

BRABÂNCIO — Cuidado, Mouro! Se olhos tens, abre-os bem em toda a parte; se o pai ela enganou, pode enganar-te. Pg. 37

Otelo havia dado um mimo para Desdêmona, deu de presente para ela um lencinho que se tornou inseparável e seu objeto de adoração, muitas vezes beijava seu lencinho e conversava com ele como se falasse com Otelo, naquela época o lencinho feminino era objeto que representava muita finura e delicadeza, mal sabiam eles que este objeto seria utilizado como armação de intrigas de Iago, seria o objeto que selaria o suposto envolvimento amoroso entre Desdêmona e Cassio. Com ajuda de Emilia, Cassio conseguiu obter a posse clandestina do lencinho e o plantou junto as roupas de Cassio, Iago procurou Otelo e insinuou que Desdêmona e Cassio estariam o traindo e a prova seria o lencinho dado por Desdêmona a Cassio, o golpe deu certo.

IAGO — Acautelai-vos senhor, do ciúme; é um monstro de olhos verdes, que zomba do alimento de que vive. Vive feliz o esposo que, enganado, mas ciente do que passa, não dedica nenhum afeto a quem lhe causa o ultraje. Mas que minutos infernais não conta quem adora e duvida, quem suspeitas contínuas alimenta e ama deveras! Pag. 92 Ato III – Cena III: Iago

Cego de ciúme, Otelo mata Desdêmona e só depois descobre que ela era inocente. Então, cheio de culpa, ele se suicida.

Ésquilo que é o pai da tragédia veria nesta obra de Shakespeare o ápice de uma tragédia muito bem desenvolvida, trabalhando as fraquezas humanas como coisas do cotidiano que se perdermos o domínio de nós mesmos tais fraquezas poderão terminar em tragédia sem final feliz, a acomodação só se deu com a morte dos personagens, cada um em sua própria tragédia.

A leitura é obrigatória por sua riqueza de emoções e sentimentos, tão próximos e intensos em nosso cotidiano, ler esta obra é de verdade uma oportunidade para reflexão, ao final da leitura com certeza haverá uma sensação estranha que nos incomoda quando não tem aquele final feliz tão esperado, mas afinal a vida nem sempre nos reserva um final feliz, principalmente quando fazemos ou sofremos com alguma intriga, viver também é estar vigilante, é saber o que fazer com o que pensamos e sentimos.

Fonte:

Shakespeare, William. Otelo, O Mouro de Veneza. Edição Ridendo Castigat Mores

Versão para eBook eBooksBrasil.com. Fonte Digital www.jahr.org