Uma palavra que, ao ser dita, evoca a ideia de muros que cercam, protegem e, ao mesmo tempo, isolam. Ao refletir sobre ela, penso imediatamente na vida que construímos para nós mesmos, dentro de nossas próprias paredes mentais e emocionais, delimitando até onde permitimos que os outros nos conheçam ou onde ousamos nos aventurar no desconhecido. No nosso dia a dia, estamos o tempo todo "intramuros" – nas rotinas, nas redes sociais, nas bolhas de pensamentos e crenças. Esses muros, no entanto, podem ser tanto fortalezas de proteção quanto prisões invisíveis.
Você
já reparou como gostamos de criar nossas próprias fronteiras? Sejam elas
físicas, como a organização da casa, ou sociais, nas amizades e círculos que
cultivamos. Fazemos isso porque o familiar nos oferece segurança. Sentimo-nos
no controle quando conhecemos o terreno em que pisamos. Mas será que essas
paredes que construímos, de certa forma, também não nos limitam?
Maurice
Halbwachs, o sociólogo que estudou a memória coletiva, poderia dizer que os
muros que erguemos têm a ver com a forma como preservamos nossas lembranças e
histórias. Ele argumentava que a memória não é individual, mas coletiva, sendo
influenciada pelo grupo ao qual pertencemos. Assim, ao construirmos nossos
muros, estamos também definindo os limites de quem somos e do que lembramos,
moldados pelas influências daqueles ao nosso redor.
Intramuros,
na prática, pode ser aquela sensação de conforto ao seguir as tradições
familiares, por exemplo. É o jantar em família aos domingos, onde repetimos
conversas e rotinas já estabelecidas, reforçando o que é conhecido e
compartilhado. Mas ao mesmo tempo, essa prática também nos prende em padrões
que evitam o novo, impedindo que experimentemos algo fora da zona de conforto.
Há
também a dimensão mais literal de intramuros. Basta pensar nas cidades muradas,
como a histórica Intramuros, em Manila, nas Filipinas. Criadas para proteger
seus habitantes de invasores, essas cidades antigas eram o perfeito exemplo de
como a segurança pode também restringir a expansão. Dentro dos muros, a vida
seguia um ritmo mais lento, mais controlado. Fora deles, o caos e a
possibilidade da aventura.
Na
nossa vida cotidiana, muitas vezes ficamos "intramuros" por medo do
desconhecido, e não é difícil identificar exemplos. O trabalho que conhecemos,
mesmo que seja frustrante, é mais seguro que tentar algo novo. A relação
estável, ainda que desgastada, oferece mais conforto que a solidão ou a
incerteza de um novo começo. Talvez, como Halbwachs sugeriria, seja o nosso
ambiente e nossas interações que nos empurram a viver entre esses muros, de
forma que nossa identidade está entrelaçada ao que construímos junto com os
outros. O grande desafio, então, seria entender que, embora intramuros ofereça
segurança, são as aberturas nesses muros que nos permitem crescer e evoluir.
Talvez
o segredo seja encontrar um equilíbrio: reconhecer que precisamos de muros para
nos proteger, mas também que devemos deixá-los permeáveis, permitindo que o
novo e o desconhecido entrem e nos transformem.
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