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segunda-feira, 5 de maio de 2025

Má-fé


Eu poderia começar dizendo que a má-fé está em toda parte, como o ar que respiramos, mas isso soaria cínico demais. No entanto, basta uma observação atenta do cotidiano para perceber que a má-fé é uma prática quase instintiva em nossas interações. Desde aquele amigo que sempre esquece a carteira na hora da conta até a promessa política que já nasce vazia, a má-fé permeia nossos relacionamentos, muitas vezes disfarçada de boas intenções.

Filosoficamente, Jean-Paul Sartre talvez tenha sido o pensador que mais explorou o conceito de má-fé (“mauvaise foi”). Para ele, a má-fé não é simplesmente enganar os outros, mas, acima de tudo, enganar a si mesmo. É a negação de nossa própria liberdade e responsabilidade ao assumirmos papéis fixos na sociedade. Um garçom que se comporta de maneira exageradamente servil, atuando como se fosse uma máquina programada para atender, está em má-fé; um indivíduo que justifica sua covardia dizendo que "não teve escolha" também está praticando a má-fé.

No cotidiano, a má-fé se apresenta de forma tão banalizada que quase não a notamos. Quem nunca viu alguém fingindo estar ocupado para evitar um compromisso? Ou aquela pessoa que mente para si mesma dizendo que vai mudar de vida, mas segue repetindo os mesmos hábitos? A má-fé nos mantém em zonas de conforto psicológico, onde justificamos nossas inércias com desculpas elaboradas.

Mas a má-fé também tem um lado coletivo. Quando sociedades inteiras compram discursos falaciosos, preferindo ilusões confortáveis à dura realidade, a má-fé se torna um mecanismo de controle. Se todos acreditam que "as coisas sempre foram assim e sempre serão", ninguém sente a necessidade de mudá-las. Essa acepção da má-fé nos aprisiona, tornando-nos cúmplices de um mundo que poderia ser diferente.

A superação da má-fé exige coragem. Coragem para admitir que não somos vítimas do destino, que nossos fracassos nem sempre são culpa dos outros, que podemos escolher agir diferentemente. Reconhecer a má-fé em nós mesmos é desconfortável, mas é também um primeiro passo para a autenticidade. Talvez não possamos eliminar todas as formas de má-fé da nossa existência, mas podemos pelo menos evitar ser seus prisioneiros.