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sexta-feira, 30 de maio de 2025

Tempo e Ser

 

Já reparou como, às vezes, o tempo parece escorrer por entre os dedos — como areia molhada? Você acorda, toma café, vai ao trabalho, responde e-mails, olha o relógio, almoça apressado, volta... e, quando vê, é noite. Você viveu, mas passou por você?

Heidegger, já mais velho, também pensava nisso. E decidiu voltar à pergunta que nunca o abandonou: o que é o ser? Mas agora com outra lente: o tempo não é só um pano de fundo — ele é o próprio caminho por onde o ser se mostra.

 

1. Uma inversão: não somos nós que controlamos o tempo

A primeira mudança de chave em Tempo e Ser é essa: não somos nós que temos o tempo — é o tempo que nos tem.

Parece estranho? Pensa naquela reunião que você achou que ia durar 15 minutos e virou 2 horas. Ou naquele feriado que voou. O tempo não se mede só no relógio. Ele é vivido — e, por isso, pode expandir ou encolher. Heidegger chama isso de tempo próprio, tempo apropriador (Ereignis).

 

2. Do ser como presença ao ser como doação

Lá em Ser e Tempo, Heidegger ainda tratava o ser como algo que se manifestava dentro do tempo. Agora, em Tempo e Ser, ele diz que o tempo é a condição do ser se mostrar. O ser não está “lá” o tempo todo — ele se doa, se revela, se retira.

É como as pessoas na nossa vida: tem amigos que aparecem quando a gente menos espera — e outros que, mesmo presentes, estão ausentes. O ser também é assim — se dá no tempo certo, e só no tempo certo.

 

3. O Ereignis: o momento em que o ser acontece

Heidegger inventa uma palavra complexa: Ereignis. Traduzem como “acontecimento apropriador” ou “evento de apropriação”. Mas pense nisso como aquele instante em que tudo se encaixa, mesmo que por um segundo.

Tipo quando você está andando na rua, distraído, e sente que está no lugar certo, na hora certa. Ou quando escuta uma música antiga e algo em você se revela — uma lembrança, uma emoção esquecida.

Não é você quem provoca isso — é o tempo que te entrega.

 

4. O tempo como clareira (Lichtung)

Heidegger fala que o ser precisa de uma clareira para aparecer — como uma luz que atravessa a floresta. Essa luz é o tempo.

Na prática? É como quando você finalmente tem um domingo livre. Silêncio em casa. Você senta, olha pela janela e pensa em tudo que não pensa durante a semana. A vida parece abrir espaço para você pensar no que está fazendo com ela.
Esse instante de clareira é um presente do tempo. E o ser, tímido, aparece ali — se você estiver atento.

 

5. Nem cronômetro, nem relógio — tempo como relação

Heidegger nos convida a abandonar a ideia de tempo como algo linear e medido em minutos. Ele quer que a gente perceba o tempo como relação com o ser.
Você já teve um almoço com alguém que parecia durar cinco minutos, mas mudou o seu mês? Ou já ficou olhando para o teto por três horas sem conseguir respirar de tanta angústia? O tempo que vale não é o dos ponteiros, mas o da experiência.

 

Viver é acolher o tempo que nos escolhe

Em Tempo e Ser, Heidegger não está oferecendo uma receita de como aproveitar melhor o tempo, como os gurus da produtividade. Ele está dizendo:

“Pare de correr. Escute o tempo. Ele não é seu inimigo. Ele é o próprio lugar onde o ser se mostra.”

Na prática? Talvez seja deixar o celular de lado por meia hora. Sentar em silêncio. Ouvir um amigo com atenção. Aceitar que nem tudo está no nosso controle — e que o que realmente importa acontece quando você permite que o tempo aconteça em você.

quinta-feira, 4 de julho de 2024

Gênio Inconstante

Você já teve aqueles dias em que se sente uma verdadeira força da natureza, capaz de conquistar o mundo, mas, de repente, sem aviso prévio, a inspiração desaparece como fumaça? Esse é o drama do gênio inconstante, uma figura fascinante e imprevisível, que se destaca tanto por seus momentos de brilhantismo quanto por suas súbitas mudanças de humor e energia.

Imagine um pintor que, num momento de epifania, cria uma obra-prima em poucas horas, apenas para, no dia seguinte, não conseguir sequer segurar o pincel com firmeza. Ou pense no escritor que passa noites insones, escrevendo páginas e mais páginas de um romance épico, mas que, de repente, sente que cada palavra escrita é uma tortura. Esses são exemplos clássicos de como a genialidade pode ser uma bênção e uma maldição ao mesmo tempo.

No cotidiano, podemos perceber essa inconstância de várias maneiras. Tomemos o exemplo do ambiente de trabalho. Sabe aquele colega que, num dia, apresenta uma solução inovadora para um problema complexo, ganhando elogios de todos, mas, na semana seguinte, parece incapaz de cumprir até as tarefas mais simples? Esse é o gênio inconstante, cuja criatividade e produtividade oscilam como uma montanha-russa. E se for você, talvez reconheça a frustração de não conseguir manter um ritmo constante, mesmo sabendo do seu potencial.

No âmbito pessoal, a situação pode ser ainda mais desafiadora. Imagine um relacionamento amoroso em que, num dia, tudo é paixão e cumplicidade, mas, no outro, o gênio inconstante se fecha em seu próprio mundo, deixando o parceiro confuso e preocupado. Essas flutuações podem criar momentos de tensão, mas também trazem a intensidade e a profundidade que muitos buscam em suas vidas amorosas.

Mas por que essa inconstância acontece? Um comentário do filósofo Friedrich Nietzsche pode nos ajudar a entender melhor essa questão. Ele disse: "Um espírito elevado e brilhante não precisa sempre da mesma intensidade de claridade. Ao contrário, ele precisa de períodos de escuridão e introspecção para se renovar." Em outras palavras, os momentos de baixa energia ou desânimo não são necessariamente um sinal de fraqueza, mas sim parte do processo de renovação e crescimento do gênio.

Portanto, em vez de lutar contra essa inconstância, talvez seja mais produtivo aceitá-la como parte essencial da jornada criativa. Reconhecer que os altos e baixos são normais pode aliviar a pressão e permitir que o gênio inconstante explore suas capacidades sem medo do fracasso.

Então, quando você se sentir no auge da inspiração, aproveite ao máximo. E quando a energia diminuir, lembre-se de que é apenas uma fase passageira. O importante é manter a fé no seu potencial e entender que a genialidade não é uma linha reta, mas sim um caminho cheio de curvas e desvios. Afinal, é essa inconstância que torna o gênio tão fascinante e único, capaz de transformar o ordinário em extraordinário, mesmo que de maneira imprevisível.