A gente vive colecionando certezas como quem acumula bugigangas na estante. E, quanto mais a estante se enche, mais difícil fica perceber a poeira sobre as ideias. No entanto, há um tipo de sabedoria que não se exibe como troféu nem se impõe com arrogância: é a douta ignorância, o saber que se sabe não saber, como diria Nicolau de Cusa, o teólogo e filósofo que cunhou essa expressão lá no século XV.
Cusa
nos
ensina que há limites no conhecer humano, e que reconhecer esses limites é,
paradoxalmente, um ato de altíssima sabedoria. A ignorância aqui não é burrice
— é lucidez. É quando o sujeito percebe que, por trás de cada certeza
conquistada, há um novo abismo de perguntas sem resposta. Como nas palavras de Sócrates:
“só sei que nada sei”, o que não é um lamento, mas uma postura aberta e
desarmada diante do mistério das coisas.
Esse
tipo de ignorância é um antídoto contra a arrogância dos especialistas que
julgam ter a última palavra sobre tudo. A douta ignorância convida ao diálogo,
à escuta, à dúvida fecunda. Ela se parece mais com o espanto de uma criança do
que com o discurso de um manual técnico. E, como diria Edgar Morin,
saber é sempre inacabado, tecido por complexidades e incertezas que a razão
linear insiste em varrer para debaixo do tapete.
Nos
tempos de respostas rápidas e opiniões em caixa alta, reaprender a ignorar — no
sentido mais sábio da palavra — talvez seja o começo de um pensamento mais
honesto. Porque quem sabe de tudo já não tem mais nada a aprender. E isso,
convenhamos, é o pior tipo de ignorância: a que se veste de saber.
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