Hoje acordei pensando na palavra "original". No meio da correria do dia, entre tomar o café da manhã e me organizar para as tarefas, fui até a padaria e na rua vi um cara com uma camiseta estampada com algo provocador: "Seja você mesmo, os outros já existem". A frase é repetida por aí, como um bordão moderno, mas algo nela me incomodou. Será que ser "original" é só sobre ser diferente? Ou será que é mais profundo, sobre ser fiel a algo interno, uma espécie de autenticidade que não depende do que os outros são, mas do que nós, verdadeiramente, somos? O que é um sujeito original?
Ser original é uma das metas mais exaltadas nos
dias de hoje. Parece que todos queremos ser reconhecidos como únicos, uma peça
rara num oceano de repetição. Mas o que faz um sujeito verdadeiramente
original? Ser original não é simplesmente se vestir de maneira excêntrica ou
ter opiniões contrárias à maioria. Originalidade é, antes de mais nada, uma
questão de postura interna, de estar em sintonia com o que somos na essência.
Um sujeito original é aquele que tem a coragem de
não se moldar às expectativas externas de forma acrítica. Ele ou ela pode até
participar das mesmas convenções sociais, trabalhar nos mesmos empregos e
conviver nas mesmas relações, mas não permite que essas camadas de rotina
diluam sua essência. Para isso, muitas vezes, é necessário um grau de
isolamento, não no sentido físico, mas mental. É um silêncio interior que
permite escutar a própria voz.
A imitação inevitável
Viver em sociedade nos condiciona a imitar os
outros, de formas sutis ou evidentes. Desde o modo como falamos até os nossos
gestos, tudo é aprendido de outros seres humanos. Maurice Merleau-Ponty, um
filósofo francês, disse que o corpo é nossa primeira linguagem, e boa parte
dessa linguagem vem da imitação do que vemos ao nosso redor. Então, a pergunta
que surge é: se imitamos tanto, como ser original?
A resposta, talvez, esteja em como transformamos o
que recebemos do mundo. Um sujeito original não nega suas influências, mas
consegue dar a elas uma nova forma, um novo sentido. Como um pintor que usa as
mesmas cores disponíveis para todos, mas cria algo que ninguém mais seria capaz
de pintar. Assim, a originalidade não está na rejeição pura e simples da
tradição ou do que os outros fazem, mas no modo como aquilo passa pelo crivo da
própria personalidade.
O risco de ser original
Ser original tem um preço, e não é pequeno. Numa
sociedade que valoriza a conformidade e a repetição de padrões, o sujeito
original pode ser visto como excêntrico, difícil ou até perigoso. A história
está cheia de exemplos de pessoas que foram marginalizadas por suas ideias e
atitudes fora do comum. Pense em Sócrates, por exemplo. Sua busca incessante
pela verdade e pelo questionamento do que se considerava "normal"
acabou levando à sua condenação à morte.
Nos dias de hoje, o risco talvez não seja tão
extremo, mas a pressão por ser como todo mundo continua forte. Redes sociais,
modas e tendências nos bombardeiam com padrões a seguir. Em muitos ambientes de
trabalho, ser diferente pode ser um caminho para o isolamento. Mas o sujeito
original sabe que esse é o preço a pagar pela integridade.
A originalidade no cotidiano
Ser original no dia a dia não significa romper com
tudo e todos o tempo todo. Pode ser algo sutil, como tomar decisões baseadas no
que realmente acreditamos, e não no que a maioria espera de nós. Pode ser na
maneira como tratamos os outros, fugindo de fórmulas prontas e buscando uma
interação mais genuína. Pode ser até na maneira como lidamos com os pequenos
prazeres ou contratempos da vida. A originalidade pode aparecer no modo como
lidamos com uma dificuldade, sem recorrer aos clichês da autopiedade ou do
conformismo.
No fim das contas, o sujeito original não busca ser
diferente só por ser. Ele é, antes de tudo, alguém que está em paz com o que é,
sem se preocupar tanto com o que o resto do mundo espera. Ele é fiel à sua
própria natureza, e é essa fidelidade que o torna, de fato, original.
Um toque filosófico
Mário Ferreira dos Santos, um filósofo brasileiro
autodidata, dizia que o ser humano deve aprender a ser "de si mesmo",
isto é, a construir uma vida baseada em seu próprio entendimento do mundo. Isso
não significa se fechar ao novo ou às ideias alheias, mas sim filtrar aquilo
que recebemos, transformando as influências externas em algo que reflita nossa
própria visão e sentido de vida. Segundo ele, é na individualidade pensante, na
reflexão crítica sobre quem somos e o que queremos ser, que reside a chave da
originalidade.
Portanto, ser original é um desafio constante. Não
é uma posição confortável, nem fácil. Mas é, sem dúvida, uma das formas mais
profundas de liberdade que podemos alcançar. E, no meio de um mundo de cópias,
um sujeito original é como uma luz única que ilumina o caminho.