Quando bater na madeira é mais do que um gesto...
Tem
gente que nem acredita em nada, mas bate na madeira do mesmo jeito. Só por via
das dúvidas. É como se dissesse: “vai que, né?”. No fundo, ninguém quer brincar
com o destino, mesmo quando jura que o destino não existe.
No
dia a dia, superstição e crença andam lado a lado, tropeçando uma na outra
feito gente numa calçada estreita. Uma é aquela velha senhora que leva um
galhinho de arruda atrás da orelha. A outra, um jovem de óculos de realidade
aumentada que acredita em inteligência artificial como oráculo. Ambas, no fim
das contas, estão tentando responder à mesma coisa: como viver num mundo que
não se explica todo?
Entre
o invisível e o improvável
Superstições
são gestos herdados, fragmentos de um saber que não passou pelo crivo da
ciência, mas que sobreviveu ao tempo. Elas não prometem verdades, mas oferecem
alívio. Já a crença é mais estrutural — é como uma casa onde o sujeito se
abriga. Pode ter teto de religião, parede de filosofia, ou chão de misticismo.
Às vezes, é uma cabana improvisada; às vezes, uma catedral inteira.
A
religião oferece um Deus, um plano, um sentido maior. O misticismo não se
preocupa tanto com dogmas, mas com vibrações, energias, ciclos. A fé, por sua
vez, pode existir sem nome nem endereço fixo: acreditar que vai dar certo, que
existe algo além, que o amor cura — isso já é fé.
E
a ciência popular? É aquele remédio de vó que funciona “porque sempre
funcionou”, mesmo que nenhum estudo comprove. É o chá de boldo, a canja para
gripe, o sabugo de milho para dor de ouvido. Não está nos livros, mas está na
boca do povo — e na prática de quem quer sobreviver com o que tem.
A
inovação está na pergunta, não na resposta
A
filosofia tradicional sempre quis separar razão e crença. Mas e se a gente
inovar e perguntar: e se toda crença, superstição ou ciência for apenas formas
diferentes de lidar com a ignorância? E se bater na madeira, fazer um
gráfico, acender uma vela ou consultar um oráculo forem variações de um mesmo
gesto humano — o de procurar sentido onde o mundo parece mudo?
O
filósofo Ernst Cassirer dizia que o ser humano é antes de tudo um animal
simbólico — a gente não vive só de fatos, vive de significados. O que a
superstição e a crença revelam não é ignorância, mas sensibilidade. É a
percepção de que há uma camada do real que escapa às fórmulas, mas não escapa
ao sentimento.
No
fim, acreditar é um ato de imaginação. E talvez seja esse o maior poder humano:
preencher com histórias, gestos, rituais e afetos aquilo que a lógica não
explica por completo. Afinal, nem tudo que é real precisa ser comprovado;
basta ser vivido.