O paradoxo da "banalidade portentosa" nos convida a refletir sobre a coexistência de grandeza e trivialidade na mesma experiência ou acontecimento. À primeira vista, parece contraditório: como algo cotidiano pode carregar uma magnitude que transcende sua aparência simples? Contudo, talvez seja justamente aí que resida o encantamento da vida: no extraordinário que se oculta nas dobras do ordinário.
A grandiosidade do comum
Imagine o ritual de tomar café pela manhã. Não há
nada mais banal: a xícara sempre no mesmo lugar, o açúcar medido sem pressa, a
colher girando no mesmo sentido. Um observador desatento poderia classificar
esse momento como irrelevante. Mas e se, nesse instante de aparente
simplicidade, encontrarmos a essência da existência? A repetição desse gesto é
também um testemunho de continuidade, uma espécie de resistência silenciosa ao
caos do mundo. Heidegger diria que é nesse "estar no mundo" que se
revela a profundidade do ser: o ordinário como portal para o extraordinário.
A banalidade como narrativa portentosa
A literatura e o cinema frequentemente transformam
o comum em épico. Em As Horas, de Michael Cunningham, um bolo mal assado é o
estopim de uma crise existencial. Em A Vida é Bela, Roberto Benigni transforma
a monotonia de um campo de concentração em uma história de esperança. Essas
narrativas subvertem a percepção do banal, mostrando que ele pode carregar em
si o peso de uma vida inteira. Assim como uma pedra lançada em um lago cria
ondas que reverberam, o gesto mais simples pode ser o início de algo
imensurável.
Filosofia e o olhar para o pequeno
Simone Weil, em sua obra, frequentemente apontava
para a necessidade de uma atenção cuidadosa ao pequeno. Para ela, é na atenção
que reside o sagrado. Não seria a banalidade, então, uma forma camuflada do
divino? Talvez a verdadeira portentosidade resida em reconhecer que o sentido
não se esconde apenas nos grandes eventos, mas também no que parece
insignificante.
Banalidade portentosa no cotidiano
Pense em como uma conversa despretensiosa pode
transformar um dia inteiro. Ou como um sorriso entre estranhos, na fila do
mercado, pode reacender a crença na bondade humana. Esses momentos são pequenos
portentos – pequenas epifanias que nos lembram da profundidade latente em cada
experiência.
Um convite ao olhar portentoso
A "banalidade portentosa" nos desafia a
reavaliar nossa relação com o mundo. É uma filosofia de atenção, um chamado à
contemplação do que geralmente ignoramos. Porque, no final das contas, o
sentido não está nas coisas, mas em como as percebemos. Nas palavras de Clarice
Lispector:
“É uma pausa, um intervalo, mas que contém toda a
vida."
E se olharmos mais de perto, talvez vejamos que
toda banalidade carrega em si uma promessa de grandeza. O extraordinário já
está aqui, na simplicidade de sermos.