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terça-feira, 29 de julho de 2025

Predomínio da Vulgaridade

Quando a vulgaridade toma conta: o silêncio como refúgio

Hoje em dia, parece que tudo grita. Redes sociais gritam, os anúncios gritam, até as conversas casuais andam carregadas de performance. É como se o gosto — aquilo que molda o belo, o justo, o sensato — tivesse sido esmagado por um rolo compressor de urgências vazias. Quando a vulgaridade vira norma, o sensível vira exceção. E é justamente nesse ponto que os antigos escolhiam o caminho oposto: o do retiro silencioso.

O filósofo romano Sêneca, em sua carta a Lucílio, aconselhava: “Retira-te para dentro de ti mesmo, tanto quanto puderes.” Para ele, o barulho do mundo era mais que uma distração — era um perigo para a alma. E essa ideia, longe de ultrapassada, talvez nunca tenha sido tão atual. Em tempos de excesso, o verdadeiro luxo é o silêncio. Em tempos de exposição constante, o verdadeiro gesto revolucionário pode ser desaparecer por um tempo, não para fugir, mas para recuperar-se.

O retiro, nesse sentido, não é um isolamento arrogante, mas uma reaproximação humilde. É como voltar para casa depois de ter se perdido numa cidade ruidosa. Lá dentro, no silêncio do que somos, longe do gosto massificado e da repetição cansada, podemos voltar a sentir o que realmente nos toca. A vulgaridade não se combate com briga — mas com recuo. Porque às vezes é preciso sair da festa para lembrar por que ela começou.

O gosto, então, talvez não morra — apenas adormeça. E o retiro, seja ele um quarto calmo, um banco no parque ou um mergulho no próprio pensamento, é o lugar onde ele acorda.

sábado, 12 de julho de 2025

Aceitar o inevitável

Por que resistir é uma escolha estúpida (segundo Sêneca)

Tem dias em que a vida bate com gosto. Você perdeu o ônibus, levou uma bronca injusta no trabalho, o amor da sua vida decidiu que te ama… mas como amigo. Nessas horas, a gente se debate por dentro, faz cena por fora, e sofre – como se isso mudasse alguma coisa. Mas Sêneca, o velho estoico romano, talvez te desse um tapinha nas costas (ou uma bronca) e dissesse: "Você está escolhendo sofrer".

O inevitável não consulta a sua opinião

O problema não é o que acontece. O problema é o que você esperava que acontecesse. A chuva não é trágica; trágico é ter saído sem guarda-chuva achando que o céu ia colaborar. Sêneca nos convida a olhar o que é fato, e o que é fantasia da nossa expectativa. Para ele, lutar contra o inevitável — a perda, a dor, a morte, a frustração — é como discutir com o mar para que ele pare de fazer ondas.

No ensaio Da Tranquilidade da Alma, ele diz:

"Não é a coisa em si que nos perturba, mas o juízo que fazemos dela."

A tempestade vem. Cabe a nós abrir o guarda-chuva da lucidez ou ficar molhado só para provar um ponto que ninguém está vendo.

A dor da perda: quando o mundo realmente muda

Agora, sejamos justos. Há perdas que desmontam a alma. A morte de quem a gente ama não é só ausência — é silêncio onde havia voz, espaço vazio onde havia presença, é mesa posta para dois quando só resta um. Perder alguém não é só um acontecimento: é uma mudança de mundo.

Sêneca perdeu o filho ainda pequeno. E mesmo assim, escreveu que a morte não deveria ser lamentada com desespero. Parece frio? Talvez. Mas ele dizia que o amor verdadeiro não termina quando o corpo se vai. E mais: que a dor não deve ocupar o lugar da gratidão.

"Chorar é natural," ele diria, "mas eternizar a tristeza é injusto com quem se foi e com quem ficou."

A perda nos visita como um ladrão — sem avisar, sem bater na porta. E o que ela leva, às vezes, é mais do que podíamos dar. Mas depois do luto inevitável, há uma decisão silenciosa: continuar carregando o que perdemos como uma ferida aberta ou como uma lembrança digna.

Sofrer é humano, mas insistir é teimosia

Há algo de revolucionário em perceber que sofrimento não é destino, mas resposta. É como se a dor tocasse a campainha e você decidisse se vai abrir a porta ou não. Sofrer, às vezes, é natural. Mas Sêneca propõe uma escolha: não transformar dor em drama, nem fracasso em identidade.

Não se trata de virar uma pedra sem emoção. Trata-se de entender que resistir ao que já é consome mais energia do que aceitar e agir a partir disso. Aceitação, aqui, não é rendição. É estratégia. É tomar o real como ponto de partida, não como sentença.

A escolha entre dano e desastre

Uma demissão é um dano. Sofrer por ela por meses pode ser um desastre. Um término é um fato. Arrastar esse fim como corrente por anos é um projeto de autoflagelo. Uma perda é inevitável. Transformá-la em culpa, castigo ou fim de si mesmo é opcional.

Aceitar o inevitável é, paradoxalmente, a forma mais inteligente de preservar nossa liberdade interior.

Sêneca diria que sofrer por algo inevitável é um duplo infortúnio: primeiro a dor do mundo, depois a dor do orgulho. E a pior parte é que o segundo golpe, quem dá somos nós mesmos.

Quando o inevitável somos nós que perdemos

Nem sempre é uma pessoa que se vai. Às vezes, a perda é de algo que não chegou a existir: um projeto de vida, uma carreira que parecia promissora, um sonho que foi gasto antes de nascer. Nesses casos, o luto é silencioso. Ninguém manda flores para quem perdeu a fé em si mesmo.

Você olha para trás e percebe que aquele "você de antes" também morreu — aquele mais ingênuo, mais esperançoso, mais confiante. E o que dói é justamente ter de continuar vivendo com quem você se tornou, ainda sem saber muito bem quem é.

Sêneca não ignoraria essa dor. Ele mesmo enfrentou exílios, humilhações públicas, traições. O que ele propõe não é virar mármore, mas lembrar que sofrer é um estágio, não um endereço fixo.

"O homem forte não é o que não sente a dor, mas o que não se escraviza a ela." — diria ele.

Aceitar o inevitável, nesse caso, é abrir espaço para o novo eu que pode nascer depois da perda. Não se trata de esquecer o que foi, mas de deixar de lutar contra o que é.

A aceitação como um ato de amor-próprio

Aceitar o inevitável é muitas vezes o primeiro passo para amar-se novamente. A ferida não vai embora porque você quer. Mas cicatriza quando você para de cutucar.

É possível olhar para a dor da perda com reverência, e não com rancor. É possível agradecer por ter amado alguém ao invés de se amargurar por não poder amar mais. É possível entender que perder algo não é ser menos, mas é ser alguém que teve algo precioso. E que, por isso mesmo, sentiu sua ausência.

No fim, aceitar o inevitável não é se curvar. É se levantar de outro jeito.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Ansiedade tão atual e tão abrangente, Sêneca sempre atual

 


Reflexões sobre a ansiedade é assim que a dominamos, pensando e falando sobre ela tão humana, em sua etimologia quer dizer sufocar, apertar, caminho estreio e doloroso visando alguma coisa que está no futuro da vida, para o qual não nos sentimos preparados para enfrentar, há muitas expectativas e a relação de nosso momento histórico dão mais combustível para incendiar-nos, o ser humano esta acostumado com esta companhia é o que nos faz andar, o primeiro passo é caminhar e a ansiedade esta presente no dar o primeiro passo, a ansiedade está ali presente, junto a ela esta o medo, que tanto serve para nos frear ou nos avisar para dirigir com cuidado, se descontrolada o medo de ter medo é o pânico quando perdemos a lucidez, o medo da ansiedade é mais pânico do que medo, medo faz parte de quem tem certo grau de consciência.  

Para Freud, a ansiedade é adaptativa não apenas por preparar o animal para lidar com o perigo por meio da mobilização de energia psíquica, mas também por auxiliar na detecção antecipada de novas ocorrências do estado de perigo.

Nossa filósofa Lucia Helena Galvão da Nova Acrópole é referência para lidar com mais este tema que assola as sociedades, muito do que ela trata em suas palestras são problemas do cotidiano e a ansiedade é um tema precioso tratado magistralmente, ouvir o que ela tem a dizer ajuda-nos a pensar a respeito do que pode ser feito e qual a postura dos ansiosos frente aos medos que paralisam, a ansiedade não deixa de fora o medo de fracassar, a ideia de fracasso causa ansiedade que pode ser o gatilho para o fracasso, a falta de lucidez causado pela ansiedade exagerada se transforma em pânico e a fraqueza da lucidez.

Uma resposta diante da vida vem através do conhecimento e através de seu valor intrínseco, as coisas que tem maior valor em si são as coisas com maior valor na vida, bondade, amor, lealdade, compaixão, é preciso trabalho para obter momentos de alegria que em sua multiplicação se transformarão em felicidade, felicidade sólida, a ansiedade se dobrará a este forte inimigo que é o conhecimento, o conhecimento nos ensina a saborear a vida em seu tempo presente, o conhecimento junto a sabedoria nos ensinam a raciocinar e sermos lúcidos sem deixar as emoções tomarem conta de nosso estado de espírito, nossa lucidez ensina a não excedermos nossa projeção e expectativas de pé no chão, alguns dissabores são fruto de nossa falta de cuidado, a expectativa nos tira a lucidez, parece que alimentamos uma fábrica de ansiedades.

Apóstolo Paulo nos ensinou:

 “Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes?

 

Nosso filósofo, Luis Felipe Pondé já nos alertou: "A ansiedade é algo sem fim hoje em dia, e isso não é bom”, ele complementa: "É complicado não ser ansioso em um mundo em que somos cobrados a todo instante. Em que há um chamado contínuo dizendo que devemos ser felizes o tempo todo, dar resultados e equilibrar todas as áreas da sua vida --trabalho, sucesso, amor, sexo, futuro, filhos, cachorros, férias...... –

Os diversos problemas intimidam, a mente é suscetível as más notícias, os jornais e noticiários trazem uma gama gigantesca de más notícias, o foco no catastrófico tiram nosso foco das coisas boas, o foco mórbido faz com que o homem seja intimidado, então não tem como reagirmos ao mundo sem ansiedade, porem os sábios sabem que os problemas fazem parte da vida, então nosso foco deve estar voltado para as coisas boas, a dinâmica da vida ensina que existem problemas, mas também nos mostra a luz e o equilíbrio.

O estoicismo nos legou sabias reflexões, um de seus maiores expoentes Sêneca em sua décima terceira carta, dirigida a seu amigo Lucilio intitulada “Sobre medos infundados”, escreve sobre a ansiedade e o medo, penso que após sua leitura a impressão é que deixamos a ficha cair. Vou compartilhar alguns trechos:

Há mais coisas… que podem nos assustar do que nos esmagar; nós sofremos com mais frequência na imaginação do que na realidade.

Seu conselho ao amigo Lucilio e que vale para todos nós:

O que eu aconselho que faças é não seres infeliz antes da crise chegar; pois pode ser que os perigos ante os quais estremeceste como se te estivessem a ameaçar, nunca irão acontecer; certamente ainda não chegaram.

Assim, algumas coisas atormentam-nos mais do que deveriam; algumas atormentam-nos antes do que deveriam; e algumas atormentam-nos quando não nos deveriam atormentar.

É provável que alguns problemas nos acometam; mas não é um fato presente. Quantas vezes o inesperado aconteceu! Quantas vezes o esperado nunca acontece! E mesmo que seja ordenado, o que valerá para se encontrar com o seu sofrimento? Você sofrerá em breve, quando chegar; por isso espere ansiosamente por coisas melhores.

A mente às vezes modela para si as formas falsas do mal, quando não há sinais que apontem para algum mal; interpreta da pior forma alguma palavra de significado duvidoso; ou imagina algum rancor pessoal ser mais sério do que realmente é, considerando não quão irritado o inimigo está, mas a que extensão poderá chegar sua ira.

Mas a vida não vale a pena ser vivida, e não há limites para nossas dores, se entregarmos nossos medos ao máximo possível; neste assunto, deixe a prudência ajudá-lo, e despreze o medo com um espírito resoluto mesmo quando ele está à vista. Se você não pode fazer isso, combata uma fraqueza com outra, e tempere o seu medo com esperança.

Não há nada tão certo nesse assunto de medo como as coisas que tememos darem em nada e que as coisas as quais esperamos zombarem de nós. Consequentemente, pese cuidadosamente as suas esperanças, assim como seus temores, e sempre que todos os elementos estiverem em dúvida, decida em seu favor; acredita no que você preferir.

E se o medo ganha a maioria dos votos, incline-se na outra direção de qualquer maneira, e deixe de incomodar sua alma, refletindo continuamente que a maioria dos mortais, mesmo quando não têm problemas realmente à mão, certamente os têm esperados no futuro, e tornam-se excitados e inquietos.

Nossas preocupações exageradas tiram nosso sossego e oportunidade de vivermos plenamente, parte de nossa sabedoria está contida no conhecimento externo e no autoconhecimento, ambos são os inimigos do medo e da ansiedade, são eles que controlam as emoções de forma lúcida, a paz de espírito nos permite olhar os detalhes da caminhada e a dar o primeiro passo com coragem.

As cartas de Sêneca escritas para seu amigo Lucilio também podem estar dirigidas a nós e obviamente ficaram para a posteridade, sua mensagem é para ser lida e degustada pausadamente, assim como degustamos um chocolate pedaço a pedaço deixando dissolver na boca, nos causam enorme sensação de prazer.

 

Fontes:

Sêneca, Lúcio Aneu. CARTAS DE UM ESTOICO, Volume I - Um guia para a Vida Feliz / Sêneca; seleção, introdução, tradução e notas de Alexandre Pires Vieira. – São Paulo, SP: Montecristo Editora, 2017.

 

https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2018/07/12/sera-que-sofremos-mais-com-a-ansiedade-hoje-do-que-sofriamos-antigamente.htm