Estava pensando outro dia, enquanto caminhava no parque ao entardecer, como certas perguntas simplesmente nos encontram. Não são questões que buscamos; elas se plantam na nossa mente, como se o universo, ou algo além, nos cutucasse com um “e aí, já pensou nisso?”. Essa sensação de ser provocado por algo maior, de sentir que existe uma conexão além do visível e do tangível, é o que chamarei aqui de instigação divina.
Mas, o que seria exatamente essa instigação? Um
sopro de curiosidade vindo de algum canto metafísico? Uma voz silenciosa que
nos faz olhar para o céu, perguntar o que estamos fazendo ou buscar um
propósito maior? Ou talvez seja apenas a nossa mente, inquieta por natureza,
tentando projetar sentido onde não há nada além de caos e acaso?
O Chamado Que Não Se Cala
Historicamente, a humanidade sempre tentou
responder às instigações divinas. Desde as primeiras pinturas rupestres até as
catedrais góticas e os tratados filosóficos, essa busca por algo transcendente
parece estar no DNA humano. Santo Agostinho, por exemplo, falava que o coração
humano não descansa até encontrar Deus. Mas será que essa busca é genuína ou
apenas uma necessidade de preencher o vazio existencial com algum tipo de
narrativa?
Mesmo na vida cotidiana, sentimos essas
instigações. Aquela dúvida que surge ao olhar para o céu estrelado: “Será que
há algo me observando?” Ou aquela intuição inexplicável que nos faz mudar de
caminho no último momento, como se um lampejo de algo maior nos protegesse ou
nos guiasse.
Filosofia e Mistério
Para o filósofo francês Gabriel Marcel, a
experiência do mistério é central na vida humana. Ele distinguia problemas de
mistérios: problemas são coisas que podemos resolver, enquanto mistérios são
realidades em que estamos mergulhados e que nos ultrapassam. A instigação
divina talvez se encaixe nessa segunda categoria. Não é algo para resolvermos,
mas para sentirmos e vivermos.
Por outro lado, Friedrich Nietzsche nos alertava
para o perigo de criar ilusões reconfortantes. Ele argumentava que o ser
humano, na sua fraqueza, frequentemente inventa deuses para evitar encarar a
brutalidade da existência. A instigação divina, nesse sentido, poderia ser
tanto um impulso genuíno quanto uma armadilha da nossa imaginação.
No Cotidiano, um Eco
Na rotina, essas provocações aparecem em momentos
inesperados. Uma criança que faz uma pergunta desconcertante sobre a vida. Uma
música que desperta uma saudade de algo que nem sabemos o que é. Uma crise que
nos faz questionar tudo o que acreditávamos. Nessas horas, a instigação divina
não é uma voz clara, mas um sussurro. Não é uma ordem, mas um convite.
Talvez o maior valor da instigação divina esteja
justamente em não termos certeza do que ela é. Seria a centelha de algo maior
ou apenas um truque do nosso cérebro? Não importa. O que importa é que ela nos
move, nos faz sair da inércia e olhar para o desconhecido com coragem e
curiosidade.
Como bem disse o filósofo brasileiro Rubem Alves,
“O que sustenta a alma é o invisível”. Talvez a instigação divina seja isso: um
lembrete de que o mistério, por mais inquietante que seja, é o que torna a vida
infinitamente rica.
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