A ideia de "sublime estupidez" parece contraditória à primeira vista, um paradoxo em que a beleza do sublime é maculada pela limitação da estupidez. No entanto, ao olharmos mais de perto, talvez seja exatamente essa colisão que nos revele algo profundo sobre a condição humana. Afinal, o sublime frequentemente emerge do inesperado, do caos ou do erro que transcende sua própria natureza.
A Estupidez como Parte do Humano
Nietzsche, em Assim Falou Zaratustra, afirma:
"É preciso ter caos dentro de si para dar à luz uma estrela
dançante." E não seria a estupidez uma forma de caos? Ela frequentemente
age como um catalisador para ações que parecem desprovidas de sentido imediato,
mas que, ao longo do tempo, ganham contornos de grandeza ou revelam verdades
ocultas.
Pensemos em nossas próprias vidas: quantas vezes um
erro crasso ou uma decisão impulsiva nos levaram a resultados inesperados e, às
vezes, maravilhosos? A estupidez, quando não é mal-intencionada, pode carregar
uma pureza que desafia a lógica fria e calculista, abrindo caminhos para o
inesperado e o belo.
O Sublime e o Incontrolável
Kant define o sublime como algo que transcende
nossa capacidade de compreensão, uma experiência que nos lembra da nossa
pequenez diante do infinito. Curiosamente, a estupidez pode assumir um papel
semelhante: ela escapa às tentativas de controle e análise, desafiando as
convenções e a racionalidade.
Um exemplo cotidiano pode ser encontrado na criança
que desenha com cores aparentemente aleatórias, fora das linhas de um desenho
pré-moldado. À primeira vista, o resultado pode parecer “estúpido” aos olhos de
um adulto preso a convenções. Contudo, é nessa liberdade ingênua que reside
algo sublime, algo que não busca agradar ou ser compreendido, mas simplesmente
é.
O Risco da Sublime Estupidez
Se por um lado a estupidez pode se tornar sublime,
ela também carrega o potencial de se tornar destrutiva. Hannah Arendt, ao
analisar os horrores do nazismo em Eichmann em Jerusalém, cunhou a expressão
"banalidade do mal". Ela argumenta que a estupidez burocrática e a
falta de reflexão crítica permitiram que atrocidades fossem cometidas sob o véu
da normalidade. Aqui, a estupidez não é sublime, mas perigosa, pois se alia à
ausência de responsabilidade moral.
Isso nos ensina que a sublime estupidez só é
possível quando há espaço para a reflexão posterior, para transformar o erro em
aprendizado e o caos em criação.
O Papel da Filosofia
A filosofia, como um exercício de pensamento, nos
convida a não julgar imediatamente a estupidez, mas a interrogá-la. O que ela
revela sobre nossos limites, nossas ilusões de controle e nossa capacidade de
criar no inesperado? Talvez o verdadeiro sublime esteja em nossa habilidade de
reconhecer que a estupidez, mesmo em sua forma mais crua, pode carregar as
sementes de algo maior.
Um Convite à Reflexão
Portanto, ao encontrarmos a estupidez – seja em nós
mesmos ou nos outros –, talvez devêssemos encará-la não apenas como uma falha,
mas como uma oportunidade. Há algo de sublime em nos permitirmos errar, em
aceitar nossas limitações e em transformar o caos em beleza.
E, afinal, quem nunca se surpreendeu ao olhar para
trás e perceber que os momentos mais tolos acabaram moldando o que há de mais
verdadeiro em nós?
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