Outro dia, enquanto observava uma xícara de café esfriar na mesa, comecei a refletir sobre como entendemos o mundo. Essa xícara é apenas um objeto no espaço — isso parece simples o suficiente. Mas então, algo mexeu com minha curiosidade: o que significa saber que ela é uma xícara? Ou ainda, o que significa que ela é? Parece banal, mas aí está um dos cruzamentos mais intrigantes da filosofia: a relação entre o epistemológico (o que podemos saber) e o ontológico (o que as coisas são).
O
Jogo entre Saber e Ser
No
campo epistemológico, o foco está no que podemos conhecer. É o domínio da
dúvida cartesiana, da investigação científica, da busca por verdades. Já o
ontológico foca na existência, na essência do ser. Ele se preocupa com a
estrutura da realidade: o que existe? E como existe?
Na
prática, as duas áreas parecem inseparáveis. Por exemplo, quando dizemos que
uma pessoa é gentil, estamos usando uma lente epistemológica para identificar
traços de comportamento que associamos à gentileza. Mas, ao mesmo tempo,
estamos fazendo um julgamento ontológico: atribuímos à pessoa uma essência de
bondade.
Cotidiano
e Filosofia
Essas
questões não são apenas exercícios abstratos; elas estão presentes no dia a
dia. Imagine uma discussão sobre inteligência artificial. Quando perguntamos se
uma IA “pensa” (epistemologia), estamos implicitamente perguntando o que é
“pensar” (ontologia). Quando usamos aplicativos de mapeamento para nos guiar,
estamos confiando no conhecimento (epistemologia), mas raramente refletimos
sobre o que significa "estar em um lugar" (ontologia).
E
o amor? Quando sentimos que amamos alguém, sabemos disso por meio de
evidências: gestos, palavras, tempo juntos. Mas o que é o amor em si? É apenas
um conjunto de reações químicas no cérebro? Ou é algo que transcende, uma
realidade ontológica que só pode ser experimentada, mas nunca totalmente
compreendida?
Entre
Mundos: Filosofia em Ação
Martin
Heidegger, um dos gigantes do pensamento ontológico, dizia que o “ser” não é
algo estático. Ele é dinâmico, um “vir a ser”. O epistemológico, por sua vez,
busca capturar esse dinamismo em conceitos e teorias. É como tentar fotografar
uma correnteza: o momento é imortalizado, mas a água continua a fluir.
Outro
pensador que ilumina esse debate é Gaston Bachelard, que conectou a
epistemologia ao processo criativo. Ele argumenta que o conhecimento não é algo
acumulado linearmente, mas uma série de rupturas e recomeços. O ser, para ele,
é algo que o conhecimento nunca consegue aprisionar completamente.
Talvez
o mais fascinante seja perceber que o epistemológico e o ontológico são
parceiros inseparáveis no grande balé da existência. Saber o que uma coisa é
(ontologia) sempre envolve uma forma de conhecê-la (epistemologia), e
vice-versa. No fundo, o que essa relação nos ensina é a humildade diante do
mistério da realidade.
Então,
quando você olhar para uma simples xícara de café, talvez você também sinta
essa pontada de admiração. Saber que ela existe é uma coisa. Mas o que
significa existir? Isso, meu amigo, é a pergunta que nos conecta aos maiores
mistérios do ser.
Nenhum comentário:
Postar um comentário