Outro dia, assistindo a um vídeo sobre como as pessoas se enganam com conceitos aparentemente simples, percebi algo curioso. A confiança com que alguém explica um tema complexo, como física quântica ou economia global, muitas vezes mascara uma verdade desconfortável: não entendemos tanto quanto pensamos. Talvez você já tenha ouvido uma explicação tão redondinha que parecia um oráculo falando – mas, ao questionar os detalhes, tudo desmorona como um castelo de cartas. Essa situação me fez refletir: será que estamos mais interessados em parecer que compreendemos do que em realmente compreender?
A Ilusão Confortável da Compreensão
A ilusão da compreensão é um fenômeno fascinante.
Ela funciona como um abrigo psicológico. Quando acreditamos que entendemos
algo, ganhamos segurança, ordem mental e até mesmo um senso de controle sobre o
mundo. Mas será que a compreensão em si é o objetivo? Para muitas pessoas, o
ato de entender de verdade parece menos importante do que a sensação de estar
no controle. A ilusão é confortável. É como assistir a um tutorial no YouTube e
sentir que você já sabe fazer aquela receita complicada, mesmo sem nunca ter
acendido o fogão.
Filósofos como Nietzsche falam da necessidade
humana de criar narrativas que expliquem a realidade. Em Além do Bem e do Mal,
ele sugere que somos mestres em autoengano e buscamos verdades convenientes,
muitas vezes em detrimento das verdades reais, que são desconfortáveis e
caóticas. Vivemos criando "metáforas" do real, e o perigo é nos
esquecermos de que elas são apenas isso – metáforas, e não a coisa em si.
Quando a Compreensão Se Revela Ilusão
Pense no conceito de "verdade
científica". No passado, acreditávamos em teorias que hoje parecem
absurdas. O flogisto, por exemplo, foi uma ideia aceita por séculos para
explicar a combustão, até ser descartada pela química moderna. E, se pensarmos
bem, muitas das verdades científicas de hoje provavelmente serão consideradas
ilusões amanhã. A ciência é um processo em constante revisão, e ainda assim
muitos a veem como um repositório de certezas absolutas.
Essa dinâmica não está apenas no campo acadêmico;
ela invade nossas vidas cotidianas. Quantas vezes defendemos com fervor uma
ideia – seja política, seja pessoal – apenas para perceber, anos depois, que
ela não fazia tanto sentido quanto imaginávamos? A ilusão da compreensão é uma
armadilha que nos dá a falsa sensação de progresso, enquanto a verdadeira
compreensão exige humildade e disposição para o questionamento constante.
A Filosofia Como Antídoto
A filosofia, com sua vocação de incomodar, nos
oferece uma saída para esse dilema. Sócrates, com sua famosa frase "Só sei
que nada sei", é o exemplo perfeito de como a verdadeira sabedoria começa
na aceitação da ignorância. Ele desafiava seus interlocutores a questionar o
que achavam que sabiam, revelando, muitas vezes, que suas certezas eram
construídas sobre bases frágeis.
No Brasil, Marilena Chauí também reflete sobre como
o senso comum e as ideologias nos vendem falsas compreensões. Em Convite à
Filosofia, ela mostra que a filosofia não é sobre "saber tudo", mas
sobre abrir espaço para dúvidas, para o desconhecido e para a consciência de
que o entendimento é um processo interminável.
Finalizando (ou Não)
A ilusão da compreensão é, ao mesmo tempo, uma
armadilha e uma necessidade humana. Sem ela, talvez fôssemos consumidos pela
ansiedade de não saber; com ela, corremos o risco de viver presos em verdades
superficiais. O desafio é equilibrar esses extremos, aceitando que o que
consideramos compreensão hoje pode, no futuro, ser revelado como ilusão.
Afinal, como Nietzsche diria, "as convicções são inimigas mais perigosas
da verdade do que as mentiras". Talvez seja hora de abandonar algumas
ilusões e abraçar a dúvida como nossa verdadeira aliada.
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