Vamos ser sinceros: quantas vezes já olhamos ao redor e pensamos que tudo está um tanto vazio de propósito? No trabalho, na fila do banco, na avalanche de posts na internet, parece que falta algo fundamental que nos faça sentir mais vivos. Esse sentimento não é só pessoal, e nem surgiu agora; ele é um dos sintomas do niilismo, uma corrente de pensamento que vem nos acompanhar na modernidade como uma sombra incômoda. Mas afinal, o que é esse tal de niilismo, e por que parece ser tão relevante hoje?
Vivemos cercados por "zumbis tecnológicos," figuras quase hipnotizadas que passam horas deslizando os dedos sobre telas brilhantes, rolando infinitamente por feeds sem rumo ou propósito. Esses zumbis modernos parecem presos em um transe, repetindo gestos automáticos numa busca que nem eles sabem pelo quê. Em um paradoxo cruel, a conexão constante nos desconecta do mundo ao nosso redor: o toque humano se reduz a pixels e os diálogos, a frases curtas e emojis. Como máquinas, seguimos algoritmos invisíveis, permitindo que a tecnologia preencha o vazio com um fluxo incessante de imagens e distrações, deixando pouco espaço para reflexão ou propósito real.
O
niilismo, grosso modo, significa o esvaziamento de sentido, o colapso de
valores e a descrença em verdades absolutas. Friedrich Nietzsche, o filósofo
que deu o nome e a forma a essa ideia, dizia que o niilismo surge quando os
valores que sustentavam a vida humana perdem o valor. Para ele, “Deus está
morto” representava essa ausência de um eixo de significado supremo que antes
dava sentido à existência. E se, no passado, as crenças religiosas, morais e
sociais eram nosso mapa, hoje o niilismo aponta que talvez, na modernidade,
estejamos sem uma bússola.
Vivemos
numa época em que as grandes narrativas, como as religiões e ideologias
políticas absolutistas, parecem ter sido substituídas por um relativismo
universal. Podemos ser “qualquer coisa,” o que deveria nos deixar livres. Mas
será que não estamos mais perdidos do que livres? Numa sociedade de consumo
acelerado, onde tudo é descartável – de objetos a relacionamentos – muitos
acabam sentindo um vazio, uma angústia que vem da falta de algo sólido para se
apegar. Basta olhar ao redor: os índices de depressão e ansiedade subiram, as
relações são cada vez mais fragmentadas, e a internet, nosso grande palco
moderno, nos mostra a superficialidade e a volatilidade das conexões humanas. O
resultado é um niilismo social, onde as pessoas desconfiam até mesmo dos valores
tradicionais e duvidam de qualquer verdade.
Nietzsche,
claro, sabia que o niilismo era inevitável, mas ele o via também como uma
oportunidade. No “Crepúsculo dos Ídolos”, ele sugeria que precisamos superar o
niilismo – transformá-lo em uma força criativa. Em vez de deixar que o vazio
nos paralise, Nietzsche propõe que sejamos criadores de novos valores. Afinal,
o problema do niilismo não é a falta de sentido em si, mas a nossa incapacidade
de criar um sentido novo.
A sociedade moderna está diante de um dilema niilista: ou se resigna ao vazio, ou encontra coragem para, coletivamente e individualmente, construir novas formas de dar sentido à vida. É como o filósofo brasileiro Gerd Bornheim sugeriu: o niilismo não é um fim, mas uma transição. Ele nos empurra para uma busca nova, onde a liberdade de escolher o que é importante para cada um é o único caminho para nos reerguer. Pode ser assustador, mas é também uma chance única de recriarmos o mundo em que vivemos.
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