A ideia de "massa de quimera" evoca uma imagem poderosa: algo moldável, imaginativo, mas que também se dissolve facilmente ao toque da realidade. Como um mito da Grécia Antiga, a quimera é um ser híbrido e impossível, uma junção de partes que não deveriam coexistir. A quimera é um ser híbrido com cabeça de leão, corpo de cabra e cauda de serpente ou dragão, que tem a capacidade de lançar fogo pelas narinas. A palavra vem do grego khímaira,as e significa "monstro extraordinário".
Transportando essa metáfora para o campo
filosófico, podemos refletir sobre como lidamos com nossos sonhos, criações e
aspirações que, muitas vezes, parecem igualmente híbridas e inalcançáveis.
O Sonho Como Construção
Desde a infância, somos mestres em criar quimeras
internas. Montamos nossos desejos como escultores de barro, com pedaços de
histórias, influências culturais e sentimentos. A "massa de quimera"
simboliza essa capacidade de imaginar o impossível, de projetar mundos que
desafiam a lógica. Mas, como Platão já sugeriu em seu "Mito da
Caverna", nem tudo que imaginamos é real, e as sombras que criamos podem
ser enganosas.
Por outro lado, a imaginação também é um motor
criativo. Sem ela, não haveria avanços na ciência, na arte ou mesmo no
cotidiano. Construímos "massas de quimera" para depois tentar
dar-lhes forma mais sólida, algo que toque a realidade e se torne
significativo.
A Fragilidade do Irreal
Se tudo o que moldamos é feito de uma massa
maleável e indefinida, surge a questão: até onde podemos confiar em nossas
criações? O filósofo brasileiro Vilém Flusser, ao refletir sobre as imagens
técnicas, alerta para o perigo de confundirmos o símbolo com o real. Para
Flusser, a tecnologia e a cultura contemporânea criaram uma realidade cada vez
mais "quimérica", onde a ficção muitas vezes suplanta a verdade.
Da mesma forma, no nível individual, há sonhos que,
quando confrontados com a realidade, desmoronam como castelos de areia. É um
lembrete de que nem todas as quimeras são destinadas a sobreviver fora do mundo
da imaginação.
A Utilidade do Impossível
Porém, seria um erro descartar a "massa de
quimera" como inútil. Se os sonhos são frágeis, também são
transformadores. Simone Weil, filósofa francesa, certa vez disse que "o
impossível é o único caminho para o possível." A construção de sonhos
aparentemente inalcançáveis é o que nos impulsiona a transcender nossos
próprios limites.
A massa de quimera, mesmo sendo instável, nos
obriga a experimentar, a esculpir e a refazer incessantemente. É uma metáfora
para o processo humano de tentativa e erro, para a criação de sentido em um
mundo frequentemente caótico.
No Cotidiano: Nossas Pequenas Quimeras
No dia a dia, as quimeras se manifestam em
situações triviais. Planejamos uma viagem que nunca acontece, idealizamos
relações que não correspondem à realidade, ou até imaginamos versões melhores
de nós mesmos que, por vezes, nos escapam. A quimera é tanto uma aspiração
quanto uma frustração.
Mas essas pequenas quimeras não são inúteis. Elas
dão cor à vida, servindo como faróis que iluminam caminhos, mesmo que nunca os
sigamos por completo. Elas nos fazem sonhar, e sonhar é o primeiro passo para
criar.
O Equilíbrio Entre Realidade e Ilusão
A "massa de quimera" nos ensina que a
vida é feita de paradoxos. Precisamos do impossível para dar sentido ao
possível, da imaginação para alimentar a realidade. Ao mesmo tempo, é
necessário reconhecer a fragilidade de nossas criações, para não nos perdermos
nelas.
Assim como o escultor que trabalha com argila,
moldamos nossas quimeras sabendo que nem todas resistirão ao tempo. Mas, ao
final, o que importa não é apenas o produto final, mas o ato de moldar, de
criar e de sonhar. Afinal, como já dizia Fernando Pessoa, "Deus quer, o
homem sonha, a obra nasce." A massa de quimera, por mais efêmera que seja,
é parte essencial dessa jornada.