A mente humana é fascinante em sua capacidade de atribuir valor às coisas de forma seletiva, e muitas vezes, enganosa. Às vezes, investimos tanto em situações, pessoas, ou projetos que, com o tempo, nos revelam sua verdadeira insignificância. Isso ocorre não porque o objeto de nossa atenção tenha necessariamente mudado, mas porque nossa percepção mudou, evoluiu. Diante disso, a "cabeça esperta" faz algo engenhoso: ela apaga os rastros, desfaz as marcas daquilo que parecia importante, mas que, com o passar do tempo, revela-se fútil.
Imagine
que passamos boa parte da vida construindo castelos de areia, achando que
estamos erguendo muralhas impenetráveis. Esses castelos podem ser as metas
profissionais que, no fim, não nos trouxeram realização, ou as relações que
acreditávamos serem essenciais, mas que só drenaram nossa energia. Quando nos
damos conta do quão efêmera era nossa fixação nessas coisas, tentamos esquecer
que um dia foram importantes, quase como um mecanismo de defesa. Freud, ao
falar do esquecimento e da repressão, já dizia que nossa mente atua para evitar
o confronto com a realidade dolorosa. Apagar os rastros de uma decisão ou
crença mal colocada é um ato quase instintivo, uma tentativa de preservar a
nossa psique.
Pierre
Bourdieu, sociólogo francês, oferece uma visão interessante para entender por
que, em primeiro lugar, damos importância a coisas que mais tarde consideramos
irrelevantes. Ele fala do conceito de "habitus", que são as
disposições internalizadas que orientam nossas escolhas e ações sem que
tenhamos plena consciência delas. O habitus é moldado pelas influências sociais
e culturais ao nosso redor. Assim, muitas vezes, o que acreditamos ser
importante vem de um condicionamento social — não de uma escolha genuína.
No
cotidiano, isso aparece de várias formas. A ansiedade por adquirir bens
materiais, o status social, a necessidade de reconhecimento em redes sociais.
No calor do momento, acreditamos que essas são coisas vitais para nossa
felicidade. Entretanto, ao longo do tempo, percebemos que o que nos mantinha
acordados à noite não tinha peso algum. Esse "erro de julgamento" nos
envergonha, e aí, a cabeça esperta tenta apagar os rastros, desviar-se do
desconforto que vem ao reconhecer que estávamos investindo energia no lugar
errado.
Aqui
entra uma reflexão interessante de Fernando Pessoa, que dizia: "Tudo vale
a pena, se a alma não é pequena." O ato de apagar os rastros pode ser
visto como uma forma de tentar expandir a alma, de libertá-la das armadilhas da
superficialidade, buscando um sentido mais profundo na vida. É quase como se,
ao percebermos o quão pequenas eram as coisas que considerávamos grandes,
estivéssemos tentando recomeçar, dando à alma uma chance de buscar algo que
realmente valha a pena.
No
fim, apagar os rastros é um movimento natural de autodefesa e
autoaperfeiçoamento. Afinal, não se trata apenas de fugir do desconforto da
frustração, mas de limpar o caminho para novas experiências e entendimentos
mais profundos.
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