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sábado, 26 de abril de 2025

Existir, Não Viver

Outro dia, enquanto esperava o pão sair do forno na padaria, percebi que ninguém parecia realmente ali. Uma senhora mexia no celular sem piscar, um rapaz olhava para o chão como quem fugia do próprio corpo, e até a atendente repetia “bom dia” no automático, como uma gravação antiga. A fila andava, as pessoas se mexiam, o pão cheirava bem, mas havia um vazio no ar — uma espécie de ausência presente. E aí me veio essa frase: existir, não viver.

Parece exagero? Talvez. Mas quantos de nós estamos de fato vivendo e não apenas marcando ponto no planeta?

O Existir Automático

Existir é, no fundo, uma função biológica. Respirar, comer, andar, trabalhar — tudo isso pode acontecer sem que haja uma verdadeira entrega ao instante. Somos excelentes operadores da nossa rotina: acordamos, pegamos condução, respondemos mensagens, entregamos relatórios, rimos por educação e terminamos o dia com a sensação de que não acontecemos em nenhum momento.

Como diria o filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, muitos vivem “na estética”, ou seja, buscam distrações, prazeres e afazeres para não encarar a angústia de uma vida sem sentido profundo. Essa forma de existência anestesiada é o oposto de uma vida autêntica — e ela é tão comum que já parece normal.

Viver é Incômodo

Ao contrário do existir, viver exige presença. E presença, meus amigos, dói. É olhar para dentro, sentir o mundo, fazer escolhas conscientes, perder tempo com o que importa, mesmo que isso não dê lucro nem prestígio. Viver é parar no meio da rua para ver o pôr do sol mesmo que te chamem de bobo. É perguntar “como você está?” e realmente esperar a resposta.

A filósofa brasileira Viviane Mosé diz que “viver é um ato poético” — e poesia, como sabemos, não se resume a técnica, mas a sensibilidade. Quem vive de verdade está disposto a não saber tudo, a se vulnerabilizar, a rir alto e a chorar feio, a perder tempo com gente, bicho, planta e memória. E isso, infelizmente, parece um luxo em tempos de produtividade tóxica.

A Sobrevivência Como Estilo de Vida

Existe um modo de vida que se vende como solução, mas que é apenas sobrevivência disfarçada. É o “modo avião da alma”, onde nada entra e nada sai. Uma espécie de hibernação em vida, onde o medo de sofrer também impede o prazer, onde o medo de falhar impede o risco, e o medo de sentir impede... tudo.

E então nos tornamos seres que não vivem, mas ocupam lugar. Ocupamos cadeiras, empregos, apartamentos e perfis nas redes sociais. Produzimos, consumimos, acumulamos, mas não habitamos a própria experiência.

A Vida Está Fora da Agenda

Talvez viver não caiba mesmo na agenda. Talvez viver seja aquela conversa inesperada no ponto de ônibus, o café que esfria porque a conversa esquenta, o silêncio que não incomoda. Talvez viver seja esse instante em que você para de correr e, pela primeira vez no dia, sente que está aqui.

Viver é interromper o existir automático.

Nietzsche já alertava para o perigo de uma vida que não se transforma em arte. Uma vida sem criação, sem autoria, sem cor, é apenas respiração em série. E mesmo isso, uma hora, cessa. Porque existir é finito. Já viver — se for intenso o bastante — pode ecoar mesmo depois do fim.

Então, se um dia te perguntarem o que você fez da vida, tente não responder com a planilha. Fale de uma tarde boa, de um abraço sincero, de uma decisão difícil que te fez sentir vivo. Porque, no fim das contas, a diferença entre existir e viver talvez esteja em quantas vezes você realmente esteve presente — inclusive no cheiro do pão saindo do forno.


domingo, 15 de setembro de 2024

Quase Inconscientemente

Você já parou para pensar em quantas ações realizamos no nosso dia a dia quase inconscientemente? Nossa vida cotidiana está cheia de momentos em que agimos no piloto automático, sem pensar muito sobre o que estamos fazendo. Vamos explorar algumas dessas situações comuns e refletir sobre o impacto do automatismo em nossas vidas.

A Rotina Matinal

Acordar, levantar da cama, escovar os dentes, tomar banho, vestir-se, preparar o café da manhã. Esses são passos que muitos de nós seguimos todas as manhãs sem realmente prestar atenção. Já notou como, às vezes, você chega ao trabalho e mal se lembra do trajeto?

Essa rotina matinal é tão familiar que nosso cérebro não precisa gastar muita energia para realizá-la. Agimos quase inconscientemente, o que nos permite economizar recursos mentais para outras tarefas mais complexas ao longo do dia.

O Trajeto para o Trabalho

Quantas vezes você já pegou o carro ou o transporte público e, de repente, se deu conta de que não lembra de partes do trajeto? Isso acontece porque seu cérebro já memorizou o caminho. Você dirige ou segue o percurso de forma quase automática, permitindo-se pensar em outras coisas, ouvir música, ou até mesmo planejar o dia.

Esse comportamento automático é uma maneira eficiente de lidar com tarefas repetitivas, mas também pode fazer com que percamos a oportunidade de apreciar o caminho e os pequenos detalhes ao nosso redor.

As Redes Sociais

Quantas vezes você se pegou rolando o feed das redes sociais sem nem perceber? Esse ato de deslizar o dedo pela tela se tornou tão automático que fazemos sem pensar. A busca por novas notificações, curtidas e atualizações se tornou um reflexo quase inconsciente, consumindo uma quantidade significativa do nosso tempo e atenção.

Embora seja uma maneira rápida de se manter informado e conectado, esse hábito pode nos distrair de atividades mais significativas e reduzir nossa capacidade de focar no presente.

Comer Sem Pensar

Quantas vezes você já comeu uma refeição enquanto assistia TV ou trabalhava? Comer quase inconscientemente é um hábito comum. Quando não prestamos atenção ao que estamos comendo, é fácil acabar consumindo mais do que o necessário e perder o prazer de saborear a comida.

Ao nos conscientizarmos desse comportamento, podemos tentar praticar a alimentação consciente, apreciando cada mordida e reconhecendo os sabores e texturas dos alimentos.

O Filósofo Fala: Martin Heidegger e o "Ser-aí"

Martin Heidegger, um dos filósofos mais influentes do século XX, falou sobre o conceito de "Ser-aí" (Dasein), que se refere à nossa existência cotidiana. Ele sugere que muitas vezes vivemos de maneira não autêntica, perdendo-nos em atividades rotineiras e distrações, em vez de realmente estarmos presentes no mundo.

Agir quase inconscientemente é uma parte natural da nossa rotina diária. Embora esse automatismo possa nos ajudar a economizar energia mental e ser eficiente em tarefas repetitivas, é importante estar ciente de quando ele pode nos levar a perder a apreciação pelo momento presente. Tomar consciência das nossas ações cotidianas e praticar a presença pode enriquecer nossas experiências diárias, permitindo-nos desfrutar mais plenamente dos pequenos detalhes da vida. Afinal, estar presente no agora é o que realmente nos conecta com a essência da nossa existência.