Falar
Consigo Mesmo – pode ser redundante, pleonasmo, mas não é um erro! É importante
e necessário!
A compreensão da vida humana passa inicialmente pela
compreensão do indivíduo consigo mesmo,
passando pela tradição filosófica e obrigatoriamente dialogando com Sócrates.
O
diálogo é entre o eu que se manifesta como uma voz, e minha consciência que
responde as minhas indagações, nem sempre a resposta me agrada, mas é
importante dar ouvidos a ela, pois é através deste dialogo que me permite
ajustar a lente do olhar para o momento presente frente ao turbilhão de emoções
presentes, com maior nitidez tomar consciência delas, compreendê-las e saber o
que fazer, pesando causas e consequências.
A
partir deste dialogo, decidimos o que vai ser feito num projeto mental o qual
será executado pelo corpo junto ao mundo exterior, a intensidade do pensamento
oriundo deste diálogo interno é fonte de motivação, a mais sincera e a mais
confiável, que nos conduzirá de maneira satisfatória pelos caminhos da vida
numa relação individual e social.
O
conhecer a si mesmo é fruto deste dialogo que nos protege contra o autoengano,
ele ocorre em situações onde convencemos a nós mesmos de uma realidade que é
falsa, mas fazemos isso de forma inconsciente, e ao final nos perguntamos “como
pude fazer isto” ou “não estava fora de mim quando agi desta forma” demonstra
nossa falta de autonomia.
Sócrates,
foi um filósofo da Grécia antiga, célebre pela frase atribuída a ele “Conhece-te
a si mesmo”, percebe-se na frase sua simplicidade e profundidade, a atitude lhe
permitia derrubar a barreira da afronta e negação ao diálogo, tratava de
assuntos cotidianos aparentemente banais, as questões existenciais e morais
mais profundas da vida humana.
Com
sua naturalidade espontânea criou um modo baseado em perguntas críticas que
expõem as incoerências da doxa, fazendo com que as falsas certezas
sejam abandonadas e haja a tomada de consciência do "não-saber", da
própria ignorância, no mínimo percebemos que pouco sabemos sobre a vida.
Seu
modo ou método foi denominado de maiêutico por seu modo de falar livremente sem
ter de chegar a um fim determinado, ele fazia perguntas e aguardava uma possível
resposta de seu interlocutor, prosseguindo com nova pergunta, sem entrar numa circularidade,
demonstrando a criatividade e potencialidade do ser humano formulando boas
perguntas desmontando equívocos nas respostas prontas na ponta da língua.
Ainda
hoje Sócrates dialoga conosco
através das obras de Platão, Xenofontes
e Aristófanes, seus principais divulgadores, pois ele nada escreveu (mas
disse muito), o que conhecemos é através daquilo que foi escrito por seus
divulgadores, principalmente através da boca de Platão quem deu voz a Sócrates.
Na
dialética socrática, perguntas e respostas formam um arcabouço de conhecimentos
obtidos através do diálogo possibilitando um melhor conhecimento de si mesmo, dialogar
com outras pessoas com quem nos relacionamos nos permitem respostas com outros
pontos de vista, imprimindo-nos aqui um duplo significado, reconhecendo-nos
ainda limitados e ignorantes frente ao mundo e nossa finitude.
Internamente
nós temos uma espécie de juiz que se manifesta sempre que travamos um diálogo
interno, este juiz age de acordo com as virtudes estabelecidas pelo regramento
da vida em comum com os outros. Neste jogo de perguntas e respostas estabelecemos
uma relação de ocupação consigo mesmo, as vozes se manifestam ordenadamente
numa espécie de duplicação onde travo um diálogo reflexivo do eu comigo mesmo, ao
final do diálogo resultará numa concordância que irá me motivar a fazer isto ou
aquilo e também mais preparado a olhar para o meu papel no mundo exterior.
A
ocupação “consigo mesmo” através do diálogo do eu comigo mesmo está na origem
de minha autonomia, é nela que consiste a possibilidade para meu auto-domínio moral,
revelando que eu como indivíduo sou capaz de conviver comigo mesmo, estarei
mais apto a conviver com as demais pessoas.
Temos
a nossa disposição ferramentas desenvolvidas por muitos pensadores e filósofos a
disposição na Filosofia, tais ferramentas funcionam como diferentes de lentes para
vermos o mundo interior e exterior. A Filosofia tem em sua natureza estabelecer
um diálogo permanente procurando estender a ideia do domínio sobre si mesmo, contribuindo
e propagando a todos seus apreciadores o quanto estamos ou não em desacordo
entre a lei interna e as injustiças acobertadas por certas leis da sociedade.
A
educação na Paideia tinha um caráter comunitário, nosso filósofo tinha uma
maneira peculiar de ensinar, ele acreditava que ensinar estava no dialogo vivo realizado
diretamente entre as pessoas, esta forma de ensinar obteve um efeito grandioso
principalmente entre aos jovens os quais os encontrava em praça pública. Foi através
dos diálogos que ele se tornou famoso, bem quisto e malquisto. Malquisto porque
seu método questionou as autoridades gregas e demonstrou que o que era
compreendido como sabedoria, não passava de meras opiniões sustentadas pelo
senso comum, rendendo-lhe inimigos entre os poderosos de Atenas, muitas vezes
expostos ao ridículo pela ironia socrática, tal afronta resultou em sua morte.
O
ensino atualmente está passando por uma mudança com ótica construtivista, diria
que sugestionada pelos princípios socráticos, pois está tentando conectar o conhecimento
através do diálogo processual entre educadores e educandos rejeitando a
verticalidade existentes na transmissão simplista, estranha e mecânica de conteúdo
sem conexão com a vida prática.
Um
bom ensino começa ajudando as pessoas a vencerem primeiro o preconceito consigo
mesmo, o dialogo será possível quando dissermos ao outro que queremos ouvir
dele sua resposta, mesmo que ele ainda aparentemente não tenha confiança para
se manifestar.
Tanto
educadores quanto educandos, ambos trazem consigo uma bagagem e a possibilidade
em potência da semente do conhecimento, que também pode brotar de dentro para
fora, numa constante construção de conhecimentos e desenvolvimento humano.
Sócrates
dizia que sua sabedoria era limitada à sua própria ignorância. Segundo ele, a
verdade, escondida em cada um de nós, só é visível aos olhos da razão, ele
acreditava que os erros são consequência da ignorância humana, ter os erros expostos
ninguém gosta, eis que a maior dificuldade do aprendizado é admitir sinceramente
que “não sei”.
Aqui
deixo registrado meu protesto: Atualmente nosso Sócrates representado pela
Filosofia está sendo morto pela resistência dos sucessivos governos em mantê-la
fora dos currículos escolares, é um engodo como forma de evitar que mais
pessoas atinjam sua autonomia e sejam empoderadas com conhecimento filosófico crítico
e exponham aa ignorância de nossos governantes.
As
pessoas sabem o que é certo ou errado, o que lhes falta é argumentação, a
Filosofia é uma arma que mata muito mais ignorantes que todo o arsenal mundial,
ela sem derramar uma gota de sangue poderia quem sabe desarmar o mundo, sem
revolveres, fuzis e bombas, poderíamos ter maior igualdade sem o desequilíbrio criado
por aqueles melhor armados que escravizam e matam.
Falar
Consigo Mesmo – pode ser redundante, pleonasmo, mas não é um erro! É importante
e necessário!