Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores poetas
brasileiros do século XX, em seu poema "Os ombros suportam o Mundo",
nos convida a uma jornada através das complexidades da existência humana.
Através de imagens vívidas e metafóricas, Drummond descreve como os indivíduos
carregam não apenas suas próprias vidas, mas também o peso do mundo ao seu
redor.
O
poema "Os ombros suportam o Mundo" de Carlos Drummond de Andrade é
uma obra que reflete sobre a condição humana e o peso das responsabilidades que
cada indivíduo carrega ao longo da vida. Dividido em três partes, o poema
utiliza metáforas poderosas para transmitir sua mensagem.
Chega
um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo
de absoluta depuração.
Tempo
em que não se diz mais: meu amor.
Porque
o amor resultou inútil.
E
os olhos não choram.
E
as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E
o coração está seco.
Em
vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste
sozinho, a luz apagou-se,
mas
na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És
todo certeza, já não sabes sofrer.
E
nada esperas de teus amigos.
Pouco
importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus
ombros suportam o mundo
E
ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As
guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
Provam
apenas que a vida prossegue
E
nem todos se libertaram ainda.
Alguns,
achando bárbaro o espetáculo,
Prefeririam
(os delicados) morrer.
Chegou
um tempo em que não adianta morrer.
Chegou
um tempo em que a vida é uma ordem.
A
vida apenas, sem mistificação.
Na
primeira parte, Drummond descreve figuras humanas que carregam elementos do
mundo físico: um homem carrega o mar nas costas, outro carrega montanhas e
cidades, cada um suportando um pedaço do mundo material como um fardo pessoal.
Na
segunda parte, o poeta passa a descrever cargas emocionais e psicológicas. Ele
menciona aqueles que carregam o peso da angústia humana, das tristezas e das
dores pessoais. Aqui, a carga se torna mais íntima e reflexiva, abordando as
dificuldades emocionais que todos enfrentamos ao longo da vida.
A
terceira parte do poema é uma reflexão sobre a natureza da existência e a
capacidade do ser humano de suportar as adversidades. Drummond sugere que,
apesar de toda a dificuldade e peso que carregamos, há uma beleza na capacidade
de resistir e continuar enfrentando os desafios da vida.
Ao
longo de todo o poema, a linguagem é densa e carregada de significado, com
imagens vívidas que evocam tanto a grandiosidade quanto a angústia da condição
humana. Drummond utiliza a metáfora dos ombros que suportam o mundo para nos
fazer refletir sobre a nossa própria capacidade de lidar com as complexidades
da existência, seja física, emocional ou espiritualmente.
"Os
ombros suportam o Mundo" é uma obra-prima que ressoa com leitores ao redor
do mundo, oferecendo uma meditação profunda sobre a vida e os desafios que
todos enfrentamos, ao mesmo tempo em que celebra a força e a resiliência do
espírito humano.
Em uma manhã comum, enquanto espero o metrô lotado
para o trabalho, me pego pensando nas palavras penetrantes de Drummond. As
pessoas ao meu redor, cada uma imersa em seus próprios pensamentos e
preocupações, parecem carregar não apenas suas mochilas e bolsas, mas também os
fardos invisíveis da vida moderna. É como se cada um de nós, de alguma forma,
estivesse carregando um pedaço do mundo nas costas, como o poeta descreve
magistralmente.
Ao observar um senhor idoso que gentilmente cede
seu assento a uma mãe com um bebê no colo, vejo ali uma pequena representação
do poema de Drummond. O gesto simples de cortesia revela uma carga
compartilhada de compaixão e solidariedade, uma pequena parte do mundo sendo
carregada nas costas de um estranho.
Drummond nos lembra também das cargas emocionais
que carregamos. Aquela discussão acalorada com um colega de trabalho, as
preocupações com o futuro dos filhos, a pressão diária por produtividade — tudo
isso forma parte do peso que todos nós, de alguma forma, carregamos em nossos
ombros.
Mas há beleza também na capacidade humana de
suportar. Como o poeta sugere, não estamos sozinhos em nossas cargas. Assim
como no poema, onde diferentes figuras compartilham o fardo do mundo, na vida
cotidiana encontramos apoio e companheirismo que tornam nossos fardos mais
leves.
Drummond, com sua habilidade única, captura a
essência da experiência humana em suas palavras. Ele nos desafia a refletir não
apenas sobre nossos próprios fardos, mas também sobre como podemos compartilhar
e aliviar o peso uns dos outros. A poesia, assim como a vida, é uma jornada de
descoberta e conexão, onde encontramos significado e beleza nos pequenos
momentos e nas grandes reflexões.
Portanto, quando me encontrar esperando o metrô
lotado, vou lembrar das palavras de Drummond e olhar ao meu redor com novos
olhos. Cada pessoa que vejo, cada gesto de gentileza ou apoio, é uma lembrança
de que todos nós, de alguma forma, estamos carregando o mundo em nossos ombros
— e é nesse compartilhar que encontramos verdadeira humanidade.