Vamos falar do Eu e o Ego...
Acordar
de manhã, escovar os dentes, olhar para o espelho e ver aquele velho conhecido:
o ego. Sempre ali, arrumadinho, como se fosse um funcionário dedicado que a
gente nunca contratou. "Esse sou eu", pensamos, como quem assina uma
entrega sem nem abrir a caixa. Mas será mesmo?
Desde
que nascemos, nos deram um kit básico de identidade: nome, sobrenome,
nacionalidade, talvez até um time de futebol para torcer. Tudo pronto para você
começar a viver — ou melhor, para começar a atuar. O ego, esse eu de aluguel, é
como aquelas fantasias baratas de super-herói: a gente veste, tira umas fotos,
faz pose e espera que todo mundo acredite que é de verdade.
Manual
de Uso do Ego (Letras Miúdas Não Inclusas)
Ninguém
nos avisa, mas aceitar o ego é como aceitar aqueles termos de uso da internet:
você concorda com tudo sem ler nada. A família, a escola, a sociedade depositam
em você uma série de expectativas, padrões e rótulos como quem joga sacolas de
compras no seu colo. E você, obedientemente, tenta equilibrar tudo, sorrindo,
enquanto as sacolas rasgam.
Você
precisa ser inteligente, mas não demais. Bonito, mas sem exagero. Rico, mas
humilde. Feliz, mas de forma que não irrite os outros. Seja você mesmo! —
dizem. Mas "você mesmo" dentro do catálogo de personalidades
aprovadas, por favor.
O
ego, nesse teatro de absurdos, é o seu crachá de entrada. Não importa se ele te
aperta, se te sufoca ou se simplesmente não combina com você: sem crachá, você
não entra.
Devolvendo
o Produto com Nota Fiscal
A
boa notícia é que, diferente daquela roupa horrorosa que você comprou por
impulso e nunca usou, o ego emprestado pode ser devolvido. Claro, prepare-se: a
fila de devoluções é longa e mal organizada. Devolver o ego é visto com maus
olhos. "Como assim você não quer ser alguém na vida?" "Como
assim você não quer uma identidade sólida, admirável e completamente
artificial?"
O
problema não é ter um ego — é esquecer que ele é só um adereço. Achar que o ego
é o verdadeiro eu é como achar que o ator é o papel: confundir Sean Connery com
James Bond. Não, amigo, o ego é o figurino; você é o sujeito tentando respirar
dentro da roupa apertada.
Como
dizia o velho Sócrates (aquele chato que mandava todo mundo se conhecer),
talvez o truque seja admitir que nem sabemos direito quem somos — e que esse
"eu" mais verdadeiro não cabe nos formulários nem nas redes sociais.
Rasgue
o Manual (ou Pelo Menos Rabisque)
No
fim das contas, viver identificado com o ego é como morar de aluguel e achar
que a casa é sua. Você arruma, decora, investe emocionalmente... e um dia
alguém te despeja sem aviso.
Então,
em vez de investir tanto na fachada, talvez seja mais interessante conhecer
quem habita lá dentro. Nem sempre será bonito — mas pelo menos será real. O ego
pode até continuar por perto, como um velho terno usado só em ocasiões formais.
Mas no dia a dia, entre um café mal feito e uma fila que não anda, seria bom
circular com o rosto limpo: sem máscaras, sem crachás, sem necessidade de
parecer algo mais.
E
que se dane se olharem torto!
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