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terça-feira, 22 de abril de 2025

Cruzam ou Permanecem

Vamos falar sobre encontros, caminhos e o inesperado da vida: enquanto, "Uns cruzam, outros permanecem”.

Outro dia, estava sentado num banco de praça esperando o tempo passar ou talvez esperando que alguma ideia me atravessasse, fiquei observando o movimento das pessoas. Um senhor com uma bengala parou por alguns segundos ao lado de uma mulher que falava ao celular — por um breve instante, os dois compartilharam o mesmo espaço, mas logo seguiram caminhos diferentes. E foi ali, entre um passo e outro, que pensei: quantos encontros nos atravessam todos os dias sem que percebamos?

Alguns encontros são como trens em estações diferentes: passam rápido, fazem barulho, deixam rastros, mas vão embora. Outros, no entanto, chegam devagar, estacionam, e ficam. Há também aqueles que nem percebemos que foram encontros, mas que, anos depois, retornam como uma lembrança insistente, uma saudade que não sabíamos que tínhamos.

A vida se faz nesses cruzamentos. Mas o mais curioso é que não controlamos quem passa por nós, nem quando. Existe uma espécie de coreografia secreta entre o acaso e o destino — e nós, meio desajeitados, tentamos dançar essa dança sem saber muito bem os passos.

O filósofo francês Emmanuel Lévinas dizia que o rosto do outro nos convoca — nos tira de nós mesmos, nos inquieta. Talvez por isso alguns encontros nos deixam em estado de alerta, de emoção, de transformação. Aquele que cruza o nosso caminho e nos olha de um jeito que muda algo por dentro, ainda que não diga nada. Lévinas via no encontro com o outro uma abertura para o infinito. Não um infinito metafísico, distante, mas um que começa aqui, no olhar de alguém que nos atravessa.

E, ao contrário do que muitos pensam, não são apenas os grandes encontros — os amores da vida, os amigos de alma, os mentores — que nos transformam. Às vezes, é o entregador que sorri mesmo debaixo da chuva, é a criança que nos observa no ônibus como se fôssemos personagens de uma história. São esses encontros que costuram o tecido do cotidiano com pequenos pontos de humanidade.

Mas há também os desencontros. Aqueles que nos frustram, que nos fazem perguntar “e se?”. E se eu tivesse dito algo? E se eu tivesse ficado? E se eu tivesse olhado pra trás? Acontece que o tempo não tem tecla de "voltar". E talvez a vida, sábia do jeito que é, saiba a medida exata entre o que permanece e o que apenas passa. Porque, no fundo, tudo que nos atravessa, mesmo que vá embora, nos deixa um pouco diferentes do que éramos antes.

A arte de viver, talvez, seja aceitar que nem tudo o que cruza o nosso caminho está destinado a caminhar ao nosso lado. Alguns vêm apenas para nos ensinar a dizer adeus, outros para nos lembrar como é bom dizer "olá". Há quem fique uma vida, há quem fique um instante. Mas todos, de alguma forma, fazem parte da narrativa que somos.

E quando olhamos pra trás, não vemos uma linha reta. Vemos um mapa tortuoso de encontros, desvios, permanências e ausências. Um emaranhado bonito e doloroso que chamamos de vida.

Então, que a gente aprenda a acolher os que cruzam, a valorizar os que ficam e a soltar com gratidão os que seguem outro rumo. No fim das contas, todos somos viajantes tentando entender onde termina o nosso caminho e onde começa o do outro — e se, por acaso, podemos caminhar juntos por mais um trecho.


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