… e o que mais?
A
gente costuma achar que só aprende pela cabeça ou pelo coração. Ou você sente —
e aprende com o calor, o frio, o medo, o gosto das coisas — ou você pensa —
calcula, raciocina, organiza as ideias para entender o mundo. Parece não haver
saída desse binário. Mas será mesmo?
Veja
o exemplo do menino que aprende a andar de bicicleta. No começo ele pensa:
“segura firme o guidão, olha pra frente, pedala devagar…”. Também sente: medo
de cair, emoção ao deslizar pela rua. Mas chega uma hora em que nem sente nem
pensa. O corpo aprende sozinho. Ele vira bicicleta. O saber passou para as
pernas, os braços, o equilíbrio. É o conhecimento do corpo — o tal “saber
fazer” que nenhum livro ensina.
Ou
pense naquelas decisões que você toma sem saber por quê. Um desvio de caminho,
um "não vou entrar nessa loja agora", um "vou ligar pra fulano
hoje". Não foi pensamento lógico nem sentimento claro. Foi um saber que
veio de outro lugar — a tal da intuição. E quantas vezes ela acerta? Muitas.
Tem
também o saber da convivência. Você nunca parou para pensar como se espera uma
fila no banco. Ninguém te explicou. Você simplesmente aprendeu — porque vive
aqui, porque observa sem perceber. Isso é cultura agindo em silêncio. Nem
sentir, nem pensar: é absorver pelo convívio.
E
ainda há o saber do momento presente. O zen-budista diria: quando você come uma
fruta e presta atenção total nela — no sabor, na textura, no cheiro — está
conhecendo direto, sem pensar, sem julgar, sem interpretar. Conhecimento puro,
sem intermediários.
Talvez
o mundo não caiba só no sentir e no pensar. Há corpos que sabem sozinhos. Há
intuições que chegam sem convite. Há culturas que moldam você sem pedir
permissão. Há presenças que ensinam sem dizer palavra.
Os
filósofos antigos sabiam disso. Espinosa, lá no século XVII, já dizia
que o corpo tem uma inteligência própria — capaz de fazer coisas das quais a
mente nem sonha. E Henri Bergson, no século XX, desconfiava que a
intuição nos leva a conhecer verdades que o pensamento não alcança.
Quem
sabe conhecer seja como viver: não se faz só com a cabeça e o peito. Também se
faz com o corpo, com o instante, com o outro.
Talvez
— no fundo — a gente seja uma soma estranha de tudo isso. E por isso aprender
nunca se esgota.
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