Quando a Confusão Vira Regra
Você
já teve que explicar para três pessoas diferentes o mesmo mal-entendido por
WhatsApp, e, no fim, todos entenderam algo diferente? Já tentou resolver uma
simples pendência num órgão público e saiu com mais perguntas do que respostas?
Ou pior: já entrou numa discussão que nem sabia direito como começou, mas que
já virou um nó emocional? Esses são exemplos do que podemos chamar, com certo
humor resignado, de imbróglios modernos — enroscos sociais, afetivos e
institucionais que, de tão frequentes, parecem ter virado parte do nosso modo
de existir.
Vivemos
numa sociedade em que a complexidade virou rotina. Quanto mais tentamos
organizar, mais nos enrolamos. A vida digital deveria facilitar, mas
frequentemente adiciona camadas de ruído. O trabalho, que era só executar, hoje
exige que sejamos também comunicadores, gestores de tempo e terapeutas de
colegas. Até a amizade, antes simples presença, agora precisa de manutenção
online, validação por emojis e leitura de subtextos não ditos. O resultado? Uma
sucessão de mal-entendidos, disputas mal explicadas, e sentimentos mal
digeridos.
Imbróglio
1: A reunião que não decide
Imagine
uma cena comum: uma reunião de trabalho. Todos têm algo a dizer, ninguém ouve
de verdade, e o PowerPoint parece mais importante que o conteúdo. A decisão que
deveria ser tomada é adiada, ou pior, é tomada por inércia. Sai-se da sala com
mais confusão do que quando se entrou. Esse tipo de imbróglio é estrutural,
pois está ligado à forma como organizamos as instituições — mais para performar
controle do que para resolver de fato.
Imbróglio
2: O grupo de WhatsApp da família
Outro
clássico: o grupo da família no WhatsApp. Uma piada mal interpretada, uma
figurinha fora de contexto, um silêncio prolongado. Pronto: começa o mal-estar.
Ninguém diz o que sente, mas todo mundo sente demais. É o imbróglio afetivo:
emoções atravessadas pela linguagem digital, onde a ausência de tom transforma
tudo em potencial conflito.
Imbróglio
3: A burocracia que paralisa
Há
também o imbróglio burocrático. Tentar resolver algo simples num sistema
público ou privado — como corrigir um dado cadastral — pode se tornar uma
epopeia. Os sistemas não se conversam, as regras se contradizem, e o usuário se
perde. Esse tipo de enrosco gera uma desmobilização do sujeito, que
passa a evitar a resolução porque o custo emocional é maior do que o benefício.
O
pensador filósofo: Zygmunt Bauman e a modernidade líquida
Zygmunt
Bauman, sociólogo polonês, nos ajuda a entender esses imbróglios. Para ele,
vivemos numa "modernidade líquida", onde tudo é fluido,
instável, passageiro. As relações, as instituições e os vínculos sociais
perderam a solidez. Em vez de certezas, temos fluxos. Em vez de estruturas
firmes, temos improvisos. Isso gera um mundo onde a insegurança e a
ambiguidade se tornam o pano de fundo da existência. Em outras palavras: os
imbróglios não são acidentes — são sintomas da nossa época.
Abraçar
o nó ou desatá-lo?
A
pergunta que fica é: devemos tentar resolver os imbróglios ou aprender a
viver com eles? Talvez ambos. Desatar o que puder ser desatado, mas também
entender que a vida é feita de nós — alguns apertados demais para soltar,
outros simbólicos, que nos conectam aos outros. O importante é não cair na
paralisia, nem no cinismo. Reconhecer o imbróglio como parte da vida já é um
começo. E, às vezes, conversar com calma (em vez de responder apressado) pode
ser o fio que desamarra tudo.
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