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quinta-feira, 24 de julho de 2025

Cidade de Deus

Entre a cidade dos homens e a cidade do coração: um passeio com Agostinho

Você já sentiu que está vivendo num mundo desordenado demais? Que as notícias parecem repetir o mesmo ciclo de violência, poder e vaidade, como se tudo estivesse de cabeça para baixo? Já pensou que talvez isso não seja apenas um problema político ou social, mas um problema do espírito?

Pois é. Lá no século V, enquanto o Império Romano caía, um pensador africano chamado Agostinho de Hipona escrevia uma obra gigantesca chamada Cidade de Deus. Não era apenas uma resposta à crise de seu tempo, mas um convite para ver o mundo por outro ângulo: o da eternidade.

E por mais distante que isso pareça — em tempo, linguagem e religião —, talvez seja mais atual do que nunca.

 

Duas cidades em tensão: o mundo interior e o mundo exterior

A tese principal de Agostinho é simples e revolucionária: existem duas cidades convivendo dentro da história:

  • A Cidade dos Homens, marcada pelo orgulho, pelo egoísmo, pela busca de glória e poder. É a cidade da política, do império, da vaidade, da corrupção — aquela que vemos nas manchetes.
  • E a Cidade de Deus, feita por aqueles que amam a verdade, a justiça e a humildade. Não é um lugar geográfico, mas um modo de existir — uma cidade invisível, habitada por corações voltados ao bem.

Agostinho diz que ambas estão misturadas no mundo, como o trigo e o joio. E o drama da história humana é justamente esse: viver entre elas, sentindo a tensão, mas mantendo os olhos voltados para o alto — não no sentido de fugir, mas de não se perder.

 

Inovando: a cidade digital e a cidade do silêncio

Agora, se Agostinho estivesse escrevendo hoje, talvez ele falasse da cidade digital — esse espaço onde todo mundo fala, mostra, reage, compete por atenção e "curtidas", como se estivesse num mercado de vaidades.

É a nova versão da Cidade dos Homens: um lugar onde o eu é inflado, onde a pressa substitui a paciência, e a exposição vale mais que a verdade. Mas, mesmo aí, Agostinho diria: a Cidade de Deus ainda pulsa, nos bastidores — no silêncio, na escuta, na compaixão desinteressada.

Ela vive naquele que resiste à lógica da performance. Que ajuda sem filmar. Que pensa antes de reagir. Que olha para o mundo com desejo de justiça, e não com fome de likes.

 

A bússola agostiniana

A Cidade de Deus não é uma utopia política, nem um projeto de governo celestial. Ela é, para Agostinho, um critério ético e espiritual. Um jeito de discernir o que vale e o que não vale, o que permanece e o que passa.

Enquanto a Cidade dos Homens constrói impérios que ruem, a Cidade de Deus forma almas que perduram. E isso vale para qualquer época: Roma caiu. O nosso mundo também cambaleia. Mas, no meio da instabilidade, sempre há quem viva com fé, justiça e amor — os verdadeiros cidadãos dessa cidade sem fronteiras.

 

Plantar a cidade dentro de si

No fim das contas, A Cidade de Deus é menos sobre o Céu e mais sobre como vivemos aqui e agora. Ela propõe que o sentido da história não está nos impérios, mas nas intenções. E que, embora sejamos habitantes do mundo, nossa verdadeira cidadania é moral e espiritual.

Hoje, entre ruídos digitais e crises existenciais, talvez o mais revolucionário seja isso: manter o coração voltado para a eternidade, mesmo enquanto caminha por entre as ruínas do presente.


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